EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

(Viramundo) Esportes daqui e dali

Todos por um*

Em circunstâncias normais, estádio vazio é deprimente. A sensação de opressão aumenta, se o esvaziamento ocorre como consequência de punição para uma das equipes. Pior se a restrição se deve a atos de violência - ou do clube ou de seus seguidores. Mas nada disso se compara à gravidade, à dor de uma vida que se perdeu por ato de ignorância, mesmo sob alegação de que foi sem intenção e provocado só por uma pessoa.

PUBLICIDADE

Por Antero Greco
Atualização:

Essa conta amarga em parte será paga pelo Corinthians, na noite de hoje, ao apresentar-se contra o Millonarios, no Pacaembu, sem o calor do público. A medida da Conmebol desencadeou reações variadas, de apoio a repúdio, de compreensão a revolta. A atitude dura e rara chocou, porque a instituição que comanda o futebol na América do Sul está longe de ser modelo de rigor e retidão.

PUBLICIDADE

Há motivos de sobra para criticar a Conmebol, entidade estranha, permissiva, conivente, pouco transparente e lerda para tomar decisões importantes e de impacto. São incontáveis os episódios em que ela pôs panos quentes e evitou atritos com peixes graúdos. Desta vez, não teve como omitir-se. A repercussão da morte do jovem Kevin Beltrán Espada fugiu ao controle de toda espécie de bombeiro de ocasião. A turma instalada na suntuosa sede em Assunção teve de mexer-se, aplicou o regulamento da Libertadores e tomou o Corinthians como alvo. Nem que seja por um jogo apenas, mas não dava para manter o tradicional ar de paisagem.

O time brasileiro fez de tudo para anular a sentença preventiva - começou com lágrimas e nota de pesar, luto oficial, bandeira a meio pau, braçadeira preta para os jogadores. Não houve comoção geral. Daí, subiu o tom, lamentou que a nação alvinegra seria prejudicada por causa de um, acenou com prejuízos financeiros, entrou com recurso. Também não adiantou. Até que ontem admitiu vetar a presença dos meios de comunicação no estádio, e alguns de seus dirigentes desceram a lenha na Conmebol. Pairou teoria da conspiração no ar.

O Corinthians é infinitamente maior do que os eventuais milhões que deixará de arrecadar por uma ou mais partidas na Libertadores com portões fechados. O presidente Mario Gobbi mesmo afirmou, no ano passado, que o clube estava acima da competição, ao sugerir que vencê-la ou não pouco mudaria o prestígio de uma lenda centenária. O gesto supremo de grandeza, neste momento, seria aceitar a punição, até assumir o papel de bode expiatório e em solidariedade ao rapaz morto. Ao mesmo tempo, assim transferia a atenção para a origem do problema - e ela está nas arquibancadas, em gente conhecida, que em nome de uma suposta paixão já levou alegria e muito horror por aí.

Clubes são punidos, como responsáveis pelo comportamento da torcida. Nos anos 1980, os ingleses ficaram suspensos de torneios europeus por várias temporadas, após a chacina provocada por adeptos do Liverpool numa final de Copa dos Campeões. Naquela oportunidade se alegou que foi apenas uma torcida violenta. Pagaram todos. Com uma diferença fundamental: a partir de então, os hooligans passaram a ser seguidos, vigiados e fichados. Aos poucos, foram identificados e banidos dos estádios. Os incidentes diminuíram demais.

Publicidade

Eis excelente chance para que as autoridades responsáveis pelo esporte e pela segurança sigam o exemplo, com quase 30 anos de atraso. Ok, que as equipes respondam pelos fãs. Mas acima de tudo que os fomentadores de terror nos estádios sintam sobre si o peso da lei e paguem a parte deles.

*(Minha crônica no Estado de hoje, quarta-feira, dia 27/2/2013.)

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.