Em palavras simples, o encontro entre os times espanhol e inglês foi um bate-rebate incessante. De um lado, o Atlético - que alguns aqui agora chamam de "Atleti", intimidade que desconhecia - a martelar com uma infinidade de chuveirinhos. De outro, o Chelsea a defender-se no sistema que, na várzea do Bom Retiro, seria definido como 9-0-1. Ou seja, retranca brava, ferrolho danado, e uma descida ao ataque só se fosse extremamente necessária, e olhe lá. Fim do resumo.
Há quem pesque argúcia, perspicácia, autocontrole, requinte estratégico nessa postura definida por José Mourinho, sujeito sempre de cara feia, de quem vê o mundo por cima, com tédio. Não é por acaso que se autointitula "The Special One". Na ótica pragmática, o treinador português exibiu repertório genial ao criar dois paredões inexpugnáveis na retaguarda. Era o que desejava e agora vai decidir em casa.
Defender-se faz parte do futebol, empate está previsto no regulamento, o confronto tem 180 minutos, pra ficar numa fileira de lugares-comuns. Fechar-se é recurso tão velho e válido quanto o esporte. O próprio Mourinho se deu bem na Internazionale campeã europeia de 2010, e o Chelsea conquistou a Champions de 2012 com a mesma alternativa, contra o Bayern.
Muito bem, acontece, e daí?
Daí que não ameniza o jogo maçante do clube londrino. Futebol não é xadrez - belíssimo e cerebral -, mas explosão, toque de bola, lançamentos, troca de passes. Gol. E, quanto mais qualificado o conjunto, tanto maior a obrigação de atuar bem, de justificar a fama, de ter coragem. Com diversos nomes de peso, jogadores caros e de variadas seleções, quantos dribles deu o Chelsea? Quantos lances emocionantes criou? Que suspiros arrancou da plateia? Raros, perto de zero. O mesmo vale para o Atlético, incensado nos últimos tempos pela ousadia, porém que se mostrou acanhado e sem criatividade diante de rival fechadinho.
Certamente há quem discorde do que escrevo, e ainda bem que seja assim. A divergência de opiniões anima a vida e a unanimidade seria tediosa. Mas não tem como suavizar: jogo feio é jogo feio, aqui, na Espanha, na China. Retranca, igualmente. Pode ser definida com algum termo em inglês, pra ficar chique, nem assim se torna bela. Cresci com a certeza de que o gol é tudo no futebol, não penduricalho acessório. Não será nesta fase da vida que mudarei, só para mostrar-me sofisticado e moderninho.
Sem pegar no pé do Mourinho, e sem perder a oportunidade da cutucada: o que ele fez em Madri foi muito diferente do que criticamos em técnicos patrícios, como Joel Santana, Celso Roth, Mano, Tite, Muricy, Felipão e tantos outros? Digo que não. A diferença está no fato de ele ser europeu, de comandar um elenco milionário, de participar de uma competição atraente. A sovinice criativa de ontem foi a mesma que corneteamos quando são preferidas pelos professores de cá.
Minha esperança foi transferida para hoje, para Real Madrid x Bayern. Tomara não decepcionem.
Vai ou fica? Inacreditável como o Palmeiras não tem sossego. Alan Kardec é artilheiro da equipe, das escassas esperanças de gol, e há ameaça de pular o muro (São Paulo) ou ir para outro Parque (o São Jorge) por diferença salarial. Só falta virar um novo caso Barcos. Vixe!
*(Minha crônica publicada no Estado de hoje, quarta-feira, dia 23/4/2014.)