A zebra laranja do Kruger Park

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Por Redação
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 Foto: Estadão

Acordamos em Skukuza antes mesmo do sol: às 5h30 já estávamos no carro que levaria para o 'Safári Matutino'. Estava tão escuro que eu achava que o sáfari devia ser chamado de safári noturno, mas tudo bem. O guia é meio mal-humorado e o clima está meio chuvoso, então a chance de ver algum leão caçando é realmente bastante remota.

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E é o que acontece: vemos apenas os animais de sempre: girafas, zebras e búfalos, elefantes, antílopes, javalis. Nada de leão ou leopardo, felinos que se escondem em cavernas quando o tempo esfria. Vou ter que ficar com a memória dos leões fazendo amor no Rhino & Lion Park; não deixa de ser uma imagem simbólica para um urbanóide como eu, que aprendeu aqui a amar ainda mais a natureza.

Voltamos do safári e tomamos o café de frente para o rio Sabie, assistindo a uma família de hipopótamos tomando sol como se estivessem em Copacabana. Entramos no carro para continuar a explorar o Kruger Park por conta própria, principalmente agora que o dia já está claro. Pegamos o mapa e escolhemos subir até Satara, um acampamento mais vazio e localizado no coração do Kruger Park. No caminho vemos os animais de sempre, além de rinocerontes, hienas e pássaros cada vez mais coloridos.

Desta vez eu é que estou ao volante, e só agora percebo como é confuso para um brasileiro dirigir do lado errado da estrada. E não é só isso: a marcha e os controles do volante também ficam em lados inversos, por isso toda vez que vou fazer uma curva aciono o limpador do para-brisa, assim como toda vez que vou limpar o vidro, o carro atrás de mim acha que vou virar à direita. Aos poucos, acostumo.

Olha ali, à direita, uma família de girafas! Uma coisa que é legal no Kruger Park é que você não vê apenas uma girafa ou uma zebra sozinhas, mas ao lado de dezenas de outras girafas e zebras. É o que acontece aqui: há várias girafas juntas, algo que nunca veríamos em outro lugar do mundo.

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Estou observando calmamente as girafas do lado direito da pista quando uma outra girafa aparece do nada do meu lado esquerdo. Cuidado! Desvio rapidamente e o carro quase capota, mas estamos de volta à pista e não há nenhuma girafa atropelada no meu retrovisor. Imagina se eu atropelo uma girafa? Minha filha nunca ia me perdoar. E nem o governo da África do Sul. Já visualizo as manchetes: 'jornalista brasileiro pega prisão perpétua por atropelar girafa', ou 'família de girafas processa jornalista brasileiro', etc. Felizmente, está tudo bem. Talvez seja melhor o Lourival Sant'Anna voltar ao volante.

Chegamos em Satara e, após um lanche rápido, cruzamos outra parte do Kruger até Orpen, portão de saída onde pegaremos a estrada de volta para Joburgo. Antes de pegar a estrada, no entanto, é hora de ver o jogo do Brasil contra a Holanda. Descobrimos uma lanchonete com uma boa TV, e é nossa salvação (ou nossa maldição, como veremos a seguir).

Quando o jogo começa, estamos sozinhos. Aos poucos, vão chegando outros turistas, curiosamente vestidos com camisetas laranja. O jogo está 1 a 1, e eles estão quietinhos. Quando sai o segundo gol da Holanda, descobrimos qual é nacionalidade deles: temos que aguentar uma turma de torcedores holandeses fazendo piadinhas (imagino que eram piadinhas, já que não falo dutch) e falando mal do Brasil. O jogo acaba 2 a 1 para a Holanda, o Brasil está fora da Copa do Mundo. É decepcionante, triste, até. Os funcionários da lanchonete estavam torcendo para o Brasil; percebo que ficam chateados também. O Brasil era o segundo time de muitos africanos, por isso eles também se sentem mal.

O Brasil está eliminado, mas a vida continua.

É hora de entrar no carro e pegar a estrada para Joburgo. Como entramos no coração do Kruger, estamos ainda mais longe de casa. O jeito é parar para dormir no meio do caminho, e é o que fazemos: entramos em Mbombela, cidade também conhecida como Nelspruit, e procuramos um hotel. Estamos tão cansados que até a tristeza dá uma trégua. Amanhã a Copa do Mundo da África continua, mas nós não estaremos mais nela. Eu não imaginava que existia uma zebra laranja no Kruger Park.

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