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Intolerância

Por Antero Greco
Atualização:

O futebol é conservador, machista e abundante em exemplos de intolerância. Junta-se a ele o justicialismo das redes sociais e está pronta a fórmula para condenações de rito sumário. A vítima mais recente dessa combinação impiedosa é Getterson.

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Conhece o Getterson? Não? Não se preocupe, até o meio da semana, era quase um desconhecido jogador, como milhares espalhados pelo País. Ganhava uns trocados para manter a família com a camisa do J. Malucelli, espécie de time-empresa do Paraná. No Estadual, marcou 5 gols, deu 4 assistências e assim entrou na mira do São Paulo.

Olha daqui, observa e analisa dali, o clube paulista optou por tomá-lo por empréstimo por uma temporada. Negócio fechado sem embromação. Aos 25 anos, viu surgir a grande oportunidade da carreira. Chegou, apresentou-se, assinou, vestiu a camisa tricolor, posou para fotos ao lado do peruano Cueva e não via a hora de ficar à disposição do técnico Edgardo Bauza, um dos que haviam dado o aval para trazê-lo.

Até que uma bomba virtual o atingiu. O crime? Algum rato de internet descobriu que, anos atrás, mal saído da adolescência, Getterson zombou do São Paulo no Twitter ou coisa que o valha. Num comentário usou o termo "bambi" para referir-se ao clube, e ali assinou a futura sentença de morte ao sonho de brilhar no Morumbi. A brincadeira antiga, de mau gosto e inócua (como "porco" e "gambá") foi resgatada e desabou sobre sua cabeça. Sem apelo.

Como há ódio demais acumulado por trás de telas de computadores, a tuitada infeliz alastrou-se e veio a enxurrada de protestos. A diretoria são-paulina assustou-se, chamou o moço e avisou que voltava atrás no acerto, ficaria o dito pelo não dito e viva são Benedito! Desculpe o mau jeito, até logo, passar bem e não nos queira mal.

Os cartolas apavoraram-se diante da perspectiva de toparem com a fúria da torcida, ou da parte exacerbada e furiosa dela, e não terem jogo de cintura para driblá-la. Resolveram lavar as mãos (Pôncio Pilatos nunca sai de moda), em vez de encararem o desafio de mostrar que a zoeira de juventude deveria ser encarada com o devido peso, ou seja, nenhum. Tivessem convicção da própria capacidade de persuasão, ignorariam o clamor dos mais sonsos. Não seria tarefa fácil; nunca impossível.

Um bem elaborado plano de recuperação e de marketing acalmaria a turba, Getterson mostraria valor no ataque e, sobretudo, o São Paulo daria prova de altivez, desprendimento, magnanimidade. Enfim, seria generoso, moderno, livre de preconceitos. Perdeu uma excelente ocasião. Numa das explicações, o presidente alegou que o moço saía ganhando, pois teve projeção com esse episódio no clube...

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As redes sociais ganham força, são instrumento poderoso para difusão de ideias, para o bem ou para o mal. Campo propício para distorções: ao mesmo tempo em que se mostra desalmado com besteiras de mocidade, pode incensar apologistas da tortura. Que Getterson encontre espaço onde não haja linchadores de plantão.

LOTAÇÃOJogadores de Santos e São Paulo chegarão ao Pacaembu no mesmo ônibus, para o clássico deste domingo. Iniciativa bacana, tentativa de expor ao público que a "batalha" entre as duas legiões se restringe aos 90 e tantos minutos de bola a rolar. Circunscreve-se ao gramado. Antes e depois do apito, são profissionais que se respeitam, colegas, amigos, alguns até compadres.

O contraponto fica para as arquibancadas, reservadas apenas aos santistas. Prevalece por aqui a decisão manca da torcida única, forma que o Estado encontrou para suprir a incapacidade de controlar os violentos. Punem-se os bons por causa de uma minoria fundamentalista.

No campo, as forças se equilibram. O Santos está ligeiramente melhor, pode embalar de vez com vitória. O São Paulo precisa encorpar para as semifinais da Libertadores, sem perder de vista o bloco principal do Brasileiro. Dupla missão.

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