Livro sobre a carreira de Sócrates é um tributo ao 'doutor da bola'

Páginas da obra do jornalista Tom Cardoso contam gols, títulos, brigas, festas e romances de um craque que transcendeu o futebol

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Por Wilson Baldini Jr
Atualização:

"Se tivesse me dedicado mais, não seria uma pessoa tão completa como sou agora." A frase escolhida para fechar o livro Sócrates, escrito pelo jornalista Tom Cardoso, sintetiza muito bem o que foi a carreira de um dos jogadores de futebol mais talentosos de todos os tempos. As 264 páginas são praticamente divididas em cerveja, política, medicina e futebol. Com sua coerência inabalável e uma necessidade de contestar absolutamente tudo o que se apresentava à sua frente, Sócrates levava sua inteligência privilegiada para dentro dos gramados, o que deixou companheiros, técnicos, dirigentes e políticos enlouquecidos. "Se o Sócrates tivesse sido um atleta, ele seria lembrado como um Zidane", diz o escritor. A obra conta, com riqueza de detalhes obtidos com testemunhos de quem conviveu com o "Magrão", toda a sua vida. Desde a infância em Ribeirão Preto, passando pelas aulas de medicina que dividiam o tempo de Sócrates com as partidas que jogava pelo time do Botafogo nos anos 70. Mas ele não deixava de comparecer ao Bar Pinguim, badaladíssimo ponto de encontro da cidade, onde consumia 40 chopes por dia.

Sócrates em ação pela seleção brasileira na Copa de 1982 Foto: Bob Thomas/Getty Images

A ida para o Corinthians em 1978, as brigas com o presidente Vicente Matheus ao reivindicar aumento salarial, o quase linchamento no Pacaembu após uma derrota, a amizade com Wladimir e Casagrande que resultou na Democracia Corintiana – que não se mostrou tão democrática assim quando o goleiro Emerson Leão foi contratado em 1983 –, o vínculo com o Partido dos Trabalhadores e a luta pelas eleições diretas. Tudo sempre regado por cerveja bem gelada, conta Cardoso. Aliás, é sensacional a história de o técnico Jorge Vieira ir para as baladas no Gallery (casa noturna de sucesso nos anos 80) junto com Sócrates, para retirá-lo pelo braço à meia-noite. Em 1982, Magrão resolveu ser atleta por um curto período para a disputa da Copa do Mundo da Espanha. Sócrates não escondia sua admiração pelo técnico Telê Santana, a quem respeitava como um segundo pai. O preparo físico adquirido para o Mundial acabou ajudando o Corinthians, bicampeão paulista em 1982/1983.

Voltou ao Brasil. Queria jogar no Corinthians, mas acabou no Flamengo e foi recepcionado com bom humor pelos cariocas: "Entornar é viver/ Doutor, vou beber com você." Não teve o sucesso esperado ao lado de Zico. Aos 31 anos, conviveu com lesões e não suportou as cobranças. Disputou a Copa de 1986, sem o mesmo brilho da edição anterior, e fracassou juntamente com toda a equipe. Dessa vez, estava mais preocupado com política e até se meteu com a situação do México, o país anfitrião daquele Mundial. São registradas no livro suas passagens por Santos, Garforth Town – time da Oitava Divisão inglesa que defendeu aos 50 anos – e seus vários romances. Todos curtos, assim como foram suas participações na política. Ele pensou até em ser presidente da CBF para tirar Ricardo Teixeira do poder. Sócrates jamais deixou o gosto pela cerveja, e acabou morrendo por causa disso aos 57 anos. Se para ler Vidas Secas, de Graciliano Ramos, é bom deixar um litro de água gelada ao lado, para ler Sócrates, de Tom Cardoso, é aconselhável deixar uma caixa de cerveja na geladeira.

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