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Despedida?

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Por UGO GIORGETTI
Atualização:

A semana inteira foi de suspense. Havia quem jurasse que Rogério Ceni estava encerrando a carreira. Havia quem aconselhasse que fizesse isso mesmo. Dizia-se que poderia ter uma despedida triste, se não aproveitasse o momento de sair por cima, ainda ovacionado. A esse propósito queria lembrar de duas coisas: primeira: toda despedida é triste. Para um jogador de futebol, então, é tristíssima, quase uma primeira morte. Portanto, despedida alegre é uma contradição em termos, não há despedida alegre, mesmo com todas as homenagens programadas pelas máquinas de marketing montadas para a ocasião. Só nesta sociedade de "eventos" e festinhas de alegria programada é que um momento triste se transforma em alegre. A segunda coisa: ninguém sai por cima na vida. Sai-se sempre por baixo. Saída implica em retirada, em sair do campo. Quem sai sempre sai a contragosto, coagido, por baixo. Nesse sentido uma ocasião é tão boa quanto outra, não há porque escolher. Por enquanto o futebol está ganhando do "evento". Rogério Ceni renovou contrato até o meio de 2015. A camisa especial, que já estava confeccionada e preparada para a despedida, foi cuidadosamente dobrada de novo e colocada de volta no fundo da gaveta. O futebol ganhou. Ganhou primeiro porque Rogério Ceni ainda está jogando como alguém no auge da forma. Algum ser que chegasse subitamente de outro planeta, ao assistir a uma partida do São Paulo, jamais poderia imaginar que o goleiro se preparava para encerrar a carreira. Nada nas suas atitudes revela isso. Nem um sinal de conformismo com derrotas, nem um sinal de cansaço, de acomodação. Ao contrário. Luta pela posição como um principiante. Não deve ser brincadeira ser reserva de Rogério Ceni. Recentemente ainda marcou um gol de falta como nos seus melhores momentos. Por que parar então? Por que chegou a hora? Mas quem determina a hora? Só ele, Rogério, pode dizer quando basta. Será que não é possível desconsiderar a idade de um ser humano e julgá-lo apenas pelo que está produzindo? Sei que é difícil julgar um veterano com os mesmos olhos com os quais se julga um jovem. Ao jovem se observam as qualidades e quanto poderá aprimorá-las com o correr dos anos. Aos veteranos examinam-se os possíveis defeitos, os sintomas de decadências, as falhas prováveis decorrentes dos anos que se foram. E quando não há falhas visíveis, como no caso de Rogério, sempre é possível lembrar da idade e essas falhas então se tornam apenas hipóteses, conjecturas, palpites e previsões de quando vão acontecer, de quanto tempo ele ainda vai durar. No caso de Rogério já houve alguns momentos em que sua longevidade entrou em pauta. Em alguma falha, em algum lance absolutamente normal, que qualquer jogador faz, mas que quando o autor é alguém de mais de trinta e cinco anos fica imperdoável. Felizmente ele continuará jogando como sempre. Vou ignorar a data de agosto de 2015. Gostaria que ninguém mais tocasse em datas quando se trata desse jogador. Deve ser preservado. Tê-lo em atividade é uma grande dádiva para o futebol. Não é preciso mencionar o que significa Rogério para os torcedores do São Paulo, evidentemente. Mas mais do que isso é uma figura importante para qualquer torcedor, como uma referência e uma lembrança. A longuíssima carreira de Rogério faz com que ele seja um jogador contemporâneo, mas ao mesmo tempo antigo. De um outro futebol. Quando Rogério entra em campo, entra com ele todo um futebol de grande beleza e qualidade que perdemos. Rogério jogou com os realmente grandes e sua figura debaixo das traves nos lembra disso o tempo todo. Lá está ele a nos recordar de um passado ainda muito recente onde não havia 7 x 1 nem humilhações. É essa a grande utilidade de sua permanência no futebol. Enquanto estiver por aqui Rogério nos impede de esquecer o que já fomos.

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