EXCLUSIVO PARA ASSINANTES

Seguro de vida

PUBLICIDADE

Por UGO GIORGETTI
Atualização:

Esse assunto da Portuguesa dá o que pensar. Não propriamente os aspectos policiais do caso. Sobre isso o Antero Greco já se manifestou de forma exemplar durante a semana. Mas há um outro lado da questão que é o seguinte: o que será da Portuguesa? Qual o futuro do clube? Ou ainda: o que resta dele? É, aliás, uma pergunta que todos os clubes brasileiros deveriam se fazer. O que cada um tem a oferecer para enfrentar um futuro cada vez mais incerto? O futebol tal como ele se dá no Brasil, e que sustentou o prestígio e o poder dos clubes, está em franca mutação - para não dizer desaparecimento. Quando todos estão endividados, quando todos trabalham na corda bamba, o futuro é ameaçador.A Portuguesa, principalmente, tem de recomeçar do zero. A única coisa que tem para oferecer é a marca. Uma marca forte, tradicional, muito conhecida e consolidada em todo o Brasil. Será suficiente? Será que um percurso na história do futebol, por mais glorioso que seja, é suficiente para assegurar a vida de um clube? Não acredito.Outros clubes também não estão acreditando, e se movimentam em direção ao futuro. O exemplo mais à mão é o caso do Palmeiras. A inauguração do Allianz Parque mostra não uma descrença no futebol, mas a constatação de que só o futebol é muito pouco para os dias que correm e, principalmente, para os que virão.Percebendo a importância de sua localização extraordinariamente privilegiada, no coração da cidade mais rica e poderosa da América do Sul, o Palmeiras construiu uma "arena multiuso", o que significa que abrigará instalações de excelência para todos os esportes, shows musicais para públicos de massa, teatro, restaurantes, etc. Mais do que isso, o lugar, pelo luxo das instalações, muitas vezes de gosto duvidoso, vai mostrar para quem quiser ver que poder é poder. Que o espírito dos velhos imigrantes que destruíram uma antiga cidade para sobre ela construir outra está presente, intacto apesar dos anos.De fácil acesso por qualquer lugar da cidade, rodeado por bairros bem providos financeiramente, o Palmeiras passa a ter, mais do que um campo de futebol, um dos grandes centros de serviços da cidade, um local de escolhidas e especiais atrações públicas. Tudo envolvido, é claro, pela mística da marca que o clube carrega no esporte que o tornou conhecido, o que, certamente, acrescenta uma dose de charme e fantasia que outros locais jamais terão. Sintomaticamente, o momento da inauguração mais falado e aguardado não é o jogo contra o Sport, mas o show de Paul McCartney, notícia no Brasil inteiro. Isso já determina de cara o destino do novo endereço. Essa nova arena representa uma espécie de seguro de vida para o velho time do Parque Antártica. Pode não ser inteiramente sua neste momento, pode durar anos até que o Palmeiras se torne o único dono do Allianz Parque, mas esse dia vai chegar. Pode nos ter privado, nós que amávamos tanto o futebol, de um campo mais do que lendário e do qual sentiremos a falta e a ausência. Pode ter substituído a delicadeza de um antigo e pacato bairro pela truculência dos tempos do dinheiro na mão. Mas a realidade, o mundo como ele é, não pode ser ignorado. Lutar para mudar o mundo é uma coisa. Não vê-lo como é, como se apresenta diante de nós, é outra.Alguns no Palmeiras enxergaram isso. Pior para nós, de outra geração, de um passado que se foi e que é o nosso. Mas essa era a única coisa que o clube poderia fazer para assegurar sua vida entre os grandes do Brasil. Porque o futebol também vai viver dessa arena. E contratações e despesas com o time só serão possíveis com rendas paralelas. À Portuguesa resta seguir o mesmo caminho, se puder. Reunir o que tem, o Canindé por exemplo, avaliar o que isso significa como passagem para o futuro e utilizá-lo da maneira mais proveitosa possível. Ou morrer.

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.