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Sobre insultos e xingamentos

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Por Ugo Giorgetti
Atualização:

Pedro Nava dizia que a única posição política decente é a oposição. Concordo que a afirmação é um pouco radical, mas confesso que, cada vez mais, me inclino em direção a ela. Sou, portanto, dos que apoiam vaias e mesmo xingamentos e insultos dirigidos a autoridades em geral. Só preciso entender a razão, a causa do protesto. Por isso, queria examinar melhor o episódio dos insultos dirigidos à presidente da República por torcedores na abertura da Copa. É difícil entender os insultos como um brado contra as dificuldades da vida de boa parte dos que estavam lá. De fato, brancos, sorridentes, dentaduras impecáveis, vestidos no rigor da moda esportiva, felizes, pagando tranquilamente os ingressos de valor exorbitante, não havia entre eles, para parodiar o grande Nelson Rodrigues, quando se referia às famosas passeatas dos anos 60, "um vago, um mísero preto". Receio, portanto, não ser em causa própria que insultavam. Talvez falassem em nome dos professores, por exemplo. Talvez condoídos pela situação do magistério decidissem tomar para si uma causa tão nobre. Ocorre que provavelmente os rapazes bem nutridos e alegres que xingavam estudam em escolas particulares ou mesmo fora do Brasil, ao abrigo, portanto, das mazelas que atingem a maioria dos nossos professores. Será, então, uma tomada de posição em favor dos sem-teto? Mas o MSTS faz seus próprios protestos, altamente organizados e com resultados muito vantajosos para o movimento. Se há uma organização que dispensa esse tipo de auxílio e solidariedade é a dos sem-teto. Não vou aqui me alongar elencando organizações, associações e parcelas da sociedade que reivindicam nas ruas do País. São do conhecimento de todos. Aliás, todos sabem e conseguem entender perfeitamente nossas desgraças e precariedades. E no calo de quem elas doem. Não é preciso ficar repetindo nossas carências, algumas velhas de séculos. Mas pouco ou nada têm a ver com as pessoas que estavam na Arena Corinthians insultando a presidente. As reivindicações dessas pessoas são pouco claras, se é que existe alguma. Isso me leva de volta à pergunta obsessiva: quem elas representam? Quebro minha cabeça tentando encontrar uma resposta e lembro finalmente dos black blocs. É em solidariedade a eles, irmanando-se a eles que a torcida gritava insultos para a presidente? Os black blocs também têm reivindicações obscuras, que não se dão ao trabalho de explicitar. A impressão é de que destroem por destruir, por algum comando interior da alma, por alguma força irracional que de repente os move. Mas os black blocs ao menos correm riscos. Enfrentam duramente a polícia, pagam caro muitas vezes por suas ações. Há black blocs presos e na iminência de serem julgados. Constato que também esses não têm qualquer coisa a ver com as pessoas que, das belas cadeiras, gritavam insultos e palavrões. Isto é, a menos que, pensando bem, se possa classificar essas pessoas como black blocs de grife, black blocs de longe, white blocs, na verdade.

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