Treinadores chineses aprimoram sua técnica nos EUA

País asiático faz parceria para desenvolvimento de seus profissionais diversas modalidades esportivas

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Por Redação
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Aproximadamente 15 treinadores se aglomeraram na varanda que mais se parecia com um mezanino e dava para uma quadra de basquete. Todos estavam de tênis e roupas esportivas. Quando o time masculino de Utah começou o treino, alguns deles tomaram notas em pequenos Moleskines; outros, consultavam esquemas táticos. Era final de setembro, época em que vários técnicos assistentes estavam fora, recrutando jogadores, e o treino em si visava deixar os atletas em forma e integrar os novatos, e não a prática de táticas contra adversários. De qualquer forma, era um bom treino de basquete universitário, por isso a coisa às vezes esquentava - mas o treinador de Utah, Larry Krystkowiak, parou a jogada e, em um tom tranquilo, mas decepcionado, disse para sua equipe: "Vocês não estão nada bem hoje; todo mundo tem algo a dizer". Os técnicos que observavam não sabiam exatamente o que Krystkowiak disse, mas compreenderam a frustração e a determinação do treinador. E tomaram nota. Eles estavam entre os melhores treinadores de basquete escolar da China, trazidos para o belo campus de Utah em uma parceria entre o governo chinês, a Conferência dos 12 do Pacífico (a Pac-12) e a Universidade de Utah. Essa não é mais a diplomacia pingue-pongue. "Os treinadores são muito dedicados com seus jogadores; ele é muito bom com os jogadores, os treina bem", disse Sun Fengleng, que treina em Jilin, uma província no nordeste da China. E acrescentou: "Eu quero aprender essa atitude e aplicá-la em casa". Krystkowiak, que já foi jogador da NBA e levou os Utes ao Torneio da NCAA nas duas últimas temporadas, parecia endossar o princípio de aprendizado de Sun."Se eles querem melhorar no basquete, esse não é o lugar para ser gentil", disse. O governo chinês espera que muitos mais treinadores aprendam essa lição. Quase 100 técnicos chineses de basquete masculino e feminino, atletismo, natação e animação de torcidas escolares foram enviados a Utah, e aproximadamente o mesmo número de treinadores universitários foi para a Universidade do Arizona, que também está na Pac-12. Os técnicos observaram treinos e sessões de musculação. Eles mesmos passaram um tempo na quadra com os treinadores de Utah, participaram de palestras sobre reabilitação de lesões e de sessões de filmes e chegaram até a assistir ao final do jogo de futebol americano universitário deste ano contra a Brigham Young, conhecido localmente como a Guerra Santa. "Na verdade, eles vieram em parte para aprender o modelo incomum da competitividade esportiva americana consagrada nas instituições de ensino", disse Kyle Brennan, diretor de esportes adjunto do Utah. "Treinadores são treinadores. Quando lhes ensinamos como as coisas funcionam, eles querem ir além. 'Por que não podemos recrutar um garoto de outra escola?'. Bem, essas são as regras que temos", disse ele rindo. O programa é financiado pelo Conselho Chinês de Bolsa de Estudos e organizado pela Federação de Esportes Universitários da China - uma espécie de NCAA patrocinada pelo estado chinês que vê as viagens dos treinadores como mais do que simples excursões relaxantes. "A China quer se certificar de que eles voltarão e de que esse não é só um passeio turístico. O governo quer que eles aprendam alguma coisa", disse Brennan. Os três meses que passam em Utah, perto de montanhas, cujos picos já estavam cobertos de neve, foi um dos vários sinais do interesse da Pac-12 em dominar o Pacífico. Quase 40 por cento dos estudantes estrangeiros da Universidade de Utah são chineses, e o ex-governador do estado, Jon Huntsman - cujo pai dá nome à arena de basquete dos Utes -, foi embaixador dos Estados Unidos na China. Em uma cerimônia de boas-vindas aos treinadores a Salt Lake City, Huntsman falou com eles em mandarim fluente. "Estamos interessados em recrutar os melhores estudantes chineses", disse Michael L. Hardman, que administra o Escritório de Envolvimento Global da universidade. Chris Hill, diretor esportivo de Utah, disse que, quando surgiu a ideia de residência para treinadores chineses entre os membros da Pac-12, apenas uns quatro levantaram a mão. "Acho que muita gente estava com medo do desafio, e seus treinadores precisam ser cooperativos. Acho que alguns se sentiram meio que 'Precisamos ser os primeiros?'", disse Hill. Para isso, membros da equipe de atletismo receberam formação cultural e, por sua vez, insistiram que os treinadores visitantes respeitassem certas regras para não atrapalhar o principal trabalho dos treinadores do Utah: treinar suas equipes. "Tivemos que trabalhar duro na parte educativa para que entendessem que há certas coisas que não se pode fazer porque vão atrapalhar nosso sucesso. Se você ficar falando enquanto o técnico está tentando treinar, aí é problema. Tivemos algumas conversas iniciais", disse Brennan. Durante um treino, os técnicos estavam todos em silêncio. "Eles são muito eficientes. Não treinam por muito tempo, mas são muito eficientes", disse através de um intérprete Gu Hong Xia, treinadora de um time de juniores em Nanjing, referindo-se aos treinadores e jogadores do Utah. Wang Hui, que é técnico em Shanxi, disse através de um intérprete que seu tempo ali fez com que se sentisse bem em relação às suas próprias técnicas de reabilitação pós-treino, que aparentemente são semelhantes às do Utah. Segundo ele, mais do que qualquer conhecimento técnico, a lição mais valiosa que aprendeu foi a "atitude". "Aqui os jogadores estão muito motivados e querem jogar bem", disse ele. Os treinadores receberam sua própria formação cultural, sob a forma de um seminário na China sobre como se adaptar aos costumes dos Estados Unidos. "Durante quatro dias, eles nos ensinaram cultura, costumes, coisas americanas diferentes - como, por exemplo, não fumar em lugares fechados - e nos disseram para aprender o máximo que pudéssemos e levar tudo para a China, para nossos jogadores", disse Sun. Felizmente, acrescentou Sun, ele não fuma.

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