No longo prazo, ganho para uma cidade é vago

Infra-estruturas deixadas são pouco utilizadas nos locais

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Por Jamil Chade - Correspondente em Genebra
Atualização:

Se os ganhos imediatos para uma cidade-sede dos Jogos Olímpicos não existem, o levantamento aponta que, nolongo prazo, os benefícios também são " elusivos". 

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No que se refere ao uso das instalações esportivas criadas, os estudos são "quase unânimes" em apontar para as perdas. "As cidades são frequentemente deixadas com infra-estruturas de esportes especializados que tem pouco uso além dos Jogos", apontam os economistas. "Portanto, além dos custos com construção, cidades podem ter de lidar com custos de longo termo para manter os elefantes brancos", dizem. 

Os exemplos são inúmeros. "Muitas das instalações esportivas de Atenas 2004 estão abandonadas", dizem. O icônico "Ninho do Pássaro" de Pequim foi raramente usado desde 2008 e, em parte, foi transformado em apartamentos. 

O estádio Olímpico de Londres é outro exemplo. Antes dos Jogos, seu preço previsto era de 280 milhões de libras. Mas acabou custando 429 milhões. Para transformar o local em um estádio de futebol para o West Ham United, outros 280 milhões de libras foram investidos. Já o clube pagará um aluguel anual de 15 milhões de libras para usar o estádio. 

No que se refere à infra-estrutura, os organizadores do evento insistem que esses são os verdadeiros legados para a população. Transporte e serviços públicos renovados são usados com frequência para justificar os gastos. Baade e Matheson admitem que esses elementos podem trazer aspectos positivos para a população. Mas não existem garantias de que as obras para um evento de 15 dias seja de fato o que a cidade mais precisa. 

"Além disso, prazos dados pela Olimpíada ainda podem limitar cidades a concluir as obras dentro de um tempo determinado, elevando os custos por conta de pressões e limites em termos de mão de obra", afirmam. 

Outro mito é o da explosão do turismo na cidade que recebe os Jogos. Diversos prefeitos, inclusive o do Rio de Janeiro, insistem que o que ocorreu com Barcelona depois dos Jogos de 1992 é a prova de que o evento dá resultados. A cidade catalã era apenas o 13º maior destino de turistas na Europa até aquele ano. Hoje, ela é a quinta. Mas, segundo o estudo, esse é um exemplo que raramente conseguiu ser repetido. Uma das explicações é de que Barcelona já teria esse destino como cidade turística e que os Jogos apenas aceleraram o processo. O mesmo não ocorreu com locais como Lillehammer, Calgary, Nagano, Torino e várias outras. 

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Em termos de ganhos para a economia, o estudo cita um levantamento feito com todos os países entre 1950 e 2006, concluindo que aqueles que sediaram os Jogos registraram uma expansão de suas exportações de 20% no período pós-olímpico, além de altas em investimentos e produção nos cinco anos de preparação. 

"Na superfície, esses resultados parecem confirmar os gastos que são feitos com rotina nos Jogos", indicaram os economistas. "Mas os mesmos estudos também mostram que campanhas que foram derrotadas de cidades que queriam sediar os Jogos tiveram o mesmo impacto", ponderam. 

A tese, portanto, é de que não são os eventos em si que geram os ganhos. Mas o ato de "se candidatar" que cria um choque positivo de credibilidade para uma economia disposta a se abrir ao mundo. Para investidores, o fato de uma cidade se lançar na corrida é o que atrai a atenção internacional para o comportamento de um governo disposto a apostar no futuro, e não o evento em si. 

Para completar, quando esses países são comparados a economias que estão em níveis similares, mas que jamais entraram numa corrida pelos Jogos, a vantagem da Olimpíada sobre comércio, consumo, investimentos e renda desaparecem. Para Baade e Matheson, portanto, "os benefício no longo prazo de sediar a Olímpiada são elusivos". 

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Motivação Mas se os resultados econômicos são mínimos, tanto no curto quanto no longo prazo, por qual motivos cidades ainda concorrem? Os autores do estudo trazem três explicações.

A primeira é setorial. Se segmentos inteiros da economia perdem, alguns são os grandes vencedores do projeto, principalmente as empresas de construção, em inúmeros casos envolvidos com grupos políticos e até campanhas eleitorais. 

O segundo aspecto é político. "O desejo de sediar os Jogos podem ser levados por egos de líderes de países ou como demonstração do poder econômico e político de um país", apontam. Caso contrário, seria difícil justificar US$ 45 bilhões gastos em Pequim em 2008 ou US$ 51 bilhões em Sochi em 2014. "Em países onde governos não prestam contas a eleitores ou contribuintes, é possível que governos façam gastos que enriquecem um pequeno grupo de industrialistas privados ou líderes governamentais sem repercussão", indicam. 

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Mas os economistas alertam que mesmo esse espaço tem sido reduzido. Para os Jogos de 2022, Oslo, Estocolmo, Cracóvia e Munique desistiram da concorrência com Pequim. Para 2024, Toronto, Boston e Hamburgo também abandonaram o processo. Roma, sob um novo governo desde o mês passado, também pode abrir mão da candidatura. 

Exemplos O terceiro motivo que ainda leva cidades a apostar no evento é o exemplo que Los Angeles em 1984 e Barcelona em 1992 deram ao mundo. Segundo os economistas, isso abriu espaço para que organizadores argumentassem para o "elemento transformador" que o evento representa. 

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Mas, na avaliação dos dois especialistas, essas duas cidades viveram situações únicas que explicam os ganhos. Barcelona vivia sua abertura ao mundo, depois de 40 anos da ditadura de Franco e da entrada da Espanha anos antes na UE. O projeto de transformação da cidade ocorreria mesmo sem os Jogos.

Em 1984, Los Angeles foi a única cidade a se candidatar para o evento. Portanto, conseguiu impôr ao COI suas próprias condições. Usou um estádio de 60 anos de idade para a abertura e todas as provas de atletismo e exigiu que o setor privado fizesse parte do evento. O resultado foi que o evento nos EUA foi um dos poucos em mais de cem anos com lucros, de cerca de US$ 232 milhões.

Mas, como uma regra geral dos últimos 30 anos, sediar um evento é "uma aposta cada vez mais cara" e, em sua atual estrutura, "é mais fácil para os atletas atngirwn a medalha de ouro do que para as cidades-sede".