'Se aumentar mais a velocidade, o tênis perderá o encanto'

Ex-tenista espanhol fala sobre o futuro do esporte

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Por Redação
Atualização:

O ex-tenista espanhol Albert Costa, campeão do Torneio de Roland Garros em 2002 e ex-capitão da Espanha na Copa Davis, está convencido de que se o tênis ganhar mais velocidade do que já tem, o “esporte perderá o encanto." 

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Em sua carreira, encerrada em 2006, ele enfrentou o ídolo do esporte brasileiro Gustavo Kuerten, o Guga, em oito oportunidades. Guga venceu seis e Costa conquistou dois triunfos - um deles, nas oitavas de final de Roland Garros em 2002, quando o título ficou com o espanhol. 

Para ele, esse é o grande perigo do tênis nos próximos anos, em uma época que já se chegou quase ao limite físico dos atletas. Nesta entrevista, ele afirma que sente falta dos jogos com mais táticas e estratégias e observa que as mudanças sugeridas pelas organizações que comandam o esporte devem ser estudadas para que os impactos sejam analisados. 

Albert Costa, ex-tenista espanhol e ex-capitão da Espanha na Copa Davis Foto: Divulgação

Ele ainda fala sobre o futuro do tênis na Espanha e afirma que vai ser muito difícil surgir na Espanha um tenista como Rafael Nadal, "que conquiste 14, 15 ou 16 Grand Slams."

Durante o Aberto da Austrália deste ano, surgiu mais um debate sobre o futuro do tênis, especialmente em relação à parte física dos atletas. Qual é sua opinião sobre o assunto.

O tênis tornou-se um esporte muito físico, e não apenas o tênis, quase todos os esportes. A grande mudança é que os jogadores são mais profissionais, mantêm uma boa dieta, tem mais médicos à disposição. Tudo tornou-se mais profissional, então a questão física agora é muito importante. No tênis a bola ganha tanta velocidade que a questão tática influencia menos. É certo que se bate mais forte na bola e se vê menos jogos táticos nas partidas.

O tênis atual aborrece os espectadores?

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Eu gosto do show que os jogadores atuais dão hoje em dia. Há algum tempo não se via nenhum ponto bem jogado, nenhuma troca de bolas mais demorada. Agora, voltamos a ver esses pontos bem jogados, mesmo com muita velocidade. O espetáculo atualmente é muito bom, porém se a velocidade do jogo seguir aumentando o encanto pelo esporte se perderá. É um tema de tática e estratégia.

Além disso, depende muito do gosto. Anos atrás se dizia que o tênis aborrecia, por exemplo, em finais de Wimbledon entre Pete Sampras e Goran Ivanisevic – só se falava que o jogo era saque e voleio, e não havia troca de bolas, jogadas mais longas. Eu gosto do tênis que é jogado hoje em dia, mas é certo que temos que chegar a um ponto em que a velocidade do jogo não aumente mais, por que ai vamos perder o charme do esporte. 

Pergunta: A Federação Internacional de Tênis propôs algumas alterações para manter o esporte interessante – sets de quatro games, apenas um saque de serviço. O que pensa a respeito?

Essas mudanças precisam ser bem estudadas, por que terão grande impacto. Encurtar os sets pode atrapalhar um jogador cujo adversário largou bem no jogo. Jogos importantes começam mesmo quando você está em 2 games a 2, 3 a 3, que é quando você começa a decidir o set. Os primeiros games são de trocas de bolas, de estudo do adversário. Se você reduzir o set, vai forçar o jogador a começar a decidir tudo desde o início, a ficar sempre concentrado.

Toni Nadal, treinador de Rafael Nadal, disse que reduzindo o tamanho das raquetes o jogo ficaria melhor. Concorda?

É claro que a bola teria velocidade menor e veríamos o típico tênis de antigamente, onde havia muito mais deixadas, um pouco mais de estratégia e muita técnica. Mas eu acho que hoje em dia, assistindo Nadal, Federer e Djokovic, eles têm um jogo espetacular. Se eles conseguirem aumentar a velocidade em 15% o jogo seria incontrolável. 

Neste jogo de tanta velocidade, qual é o tenista que você gosta de ver?

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Acima de tudo, gosto de ver o Rafael Nadal. Mas gosto também de Federer e Djokovic. Esses três estão um passo acima dos outros. Depois, vejo também David Ferrer, por que gosto de ver como ele luta em seus jogos. Também vejo Del Potro, com seu saque e sua força brutal. Esses são os meus favoritos.

Sem Rafael Nadal e David Ferrer daqui a alguns anos, como ficará o tênis espanhol?

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Eu acho que vai ser difícil. Os dois são ídolos, estrelas do esporte e sem Nadal isso causará grande impacto no esporte no país. Mas, também, somos todos muito mimados! Temos vários jogadores entre os top cem, e isso é incrível. Não termos mais um jogador que poderá ganhar 14, 15 ou 16 Grand Slams – isso será muito difícil de acontecer novamente. 

Você acredita que Nadal voltará a ser o número 1 do mundo?

Se ele estiver bem fisicamente, ele voltará ao topo. Ele lutará com outros três tenistas com as mesmas chances. Mas hoje Djokovic tem muita vantagem, conquistou o Aberto da Austrália. Vai ser difícil.

Em julho, após o Torneio de Wimbledon, a Espanha jogará contra a Rússia pela repescagem da Copa Davis. A relação entre os jogadores e o capitão do time não é das melhores. O que fazer?

Eu não sei o que vai acontecer. Sei é que vamos jogar contra a Rússia e poderemos ter de jogar na Sibéria, como estão dizendo. É imprevisível. Sobre o time, precisa-se falar, sentar, ouvir, conversar. Cada um tem sua opinião. Mas, se a comunicação é cortada, o pior pode acontecer. Precisa-se rapidamente corrigir isso.

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Você é campeão de Roland Garros e já foi capitão da Espanha na Copa Davis. Acredita que uma mulher poder ser a capitã do time nesse campeonato? (Nota da redação: Gala León é a capitã, muito criticada pelos próprios jogadores da equipe, que perdeu para o Brasil na primeira fase do torneio)

A questão não é ser um senhor ou uma senhora, mas sim ser o capitão que você pediu. A sistemática do mundo do tênis nos últimos 20 anos era essa: o presidente tinha uma ideia, comentava com os jogadores e se eles gostavam da ideia, ela era levada à frente. Isso sempre funcionou bem. Agora, mudar isso e impor mudanças eu acho arriscado demais.

Qual é, então, o capitão ideal para a Espanha na Copa Davis?

Na minha humilde opinião, essa pessoa deve ter um conhecimento profundo do circuito masculino de tênis. Deve conhecer os jogador, saber com quem ele compartilha o quarto nos torneios, etc. Você deve conhecer muito bem o ambiente e vivenciar o dia a dia com os jogadores. Isso é o básico para que exista uma simbiose mútua, um ideal comum. Se para quem tem tudo isso as coisas já são bem complicadas, imagina para quem não tem essa confiança do grupo, não consegue se comunicar com atletas? Tudo vai ficar ainda mais complicado.

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