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Diálogo intercontinental sobre futebol, com toques de política, economia e cultura.

Alemães e franceses também já sabem o que é sofrer

CLÁSSICO EUROPEU NO MARACANÃ PELAS QUARTAS DE FINAL

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Por Carles Martí (Espanha) e José Eduardo Carvalho (Brasil)
Atualização:

Carles: Feriado, jogo-treino para os grandes, pero no mucho...

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Edu: Nada, retiro quase tudo o que disse ontem (menos sobre as estatísticas inúteis). Esta Copa não está para feriados. Se bem que os alemães, por exemplo, jogaram meio tempo em ritmo de treino, até perceberem que o buraco era mais embaixo.

Carles: Foram aplicar o velho truque do minuto 80, como a França e outros, dosando a energia e deixando o pequeno correr, presa do entusiasmo, para poder matar o jogo no final, só que com os argelinos foi mais complicado. Será que os reis do planejamento esqueceram de considerar que as condições de umidade, pressão e temperatura num jogo no Beira-Rio são bem diferentes das do Arena Pernambuco?

Edu: A temperatura no Beira-Rio estava bem mais para Alemanha do que para Argélia, só que para esse time africano não tem tempo ruim. Foi menosprezo mesmo, não tenho dúvida, e os alemães escaparam por pouco no primeiro tempo. A França, ao contrário, mudou de postura em relação à primeira fase, quando estava em um grupo fácil. Deschamps voltou a seu modelo mesquinho dos tempos de Juventus de Turim e Benzema voltou a ser Benzema, com aquela força de vontade que dá sono. Só esqueceram de avisar para o pequeno gigante Valbuena e para o ótimo Pogba, que resolveram o jogo com a preciosa ajuda de Griezmann. Mesmo com algum drama, Carlão, ficou claro que alemães e franceses não contavam com tanta resistência do alto da soberba europeia quando enfrenta times africanos.

Carles: Agora mesmo, Porto Alegre, 15º de temperatura e 88% de umidade; Argel, 20º e 90%; e Munique 12º e 89%. Por isso os dois times pareciam estar jogando em casa. Bom, Zé, soberba europeia tem de vários tipos, cores e tamanhos, varia de país para país e de rincão para rincão. Alguns, inclusive, andamos esquecendo até de como isso se come. Mas não vou seguir por aí, inclusive porque em nada se parecem o sentido de pertencimento desse grupo realmente multicultural francês com o dos alemães, que também reúne gente de varias origens, mas muito mais dissimulado e menos assumido. Se a gente se concentrar só no aspecto esportivo, tem também que esse time argelino é muito mais sólido, melhor tecnica e estruturalmente que o nigeriano.

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Edu: Muito melhor, o que ressalta a estranha postura alemã, relaxada demais no início do jogo. Algumas seleções menos expressivas, além de tudo, têm dado um show de empenho coletivo e consciência tática neste Mundial, a ponto de servir de exemplo para algumas equipes cheias de medalhões. E não se trata de uma postura de humildade colonizada, mas de coragem, de enfrentamento, não importa o mito que tenham pela frente. No caso dos argelinos mais ainda, por razões sociopolíticas que permanecem muito vivas no Magreb, uma consequência evidente do passado recente de lutas. Quantas vezes já falamos que esse time põe a alma em campo?

Carles: Verdade, e por isso - mas muito também pelo jogo de hoje - dá muita pena ver como eles se despedem. Se tivéssemos a possibilidade de votar num dos time desclassificados até aqui para uma segunda chance, certamente essa seleção da Argélia seria dos muitos votados porque mostrou quase todas as qualidades para permanecer no grupo de elite. Além é claro de ter o último sobrevivente do time da minha cidade natal na Copa. Quiçá faltou só a contundência nos metros finais que diferencia os aspirantes dos graúdos, esse convicção de fuzilar o adversário sem medo de errar. Por falar em errar, imagina se fosse a Argélia que tivesse executado aquela bisonha cobrança de falta (mal) ensaiada que acabou com Müller engatinhando pelo gramado? Aliás, essa parte, das bolas paradas deve ter sido a única que a federação alemã não conseguiu microfilmar (isso ainda existe?) das gavetas de Pep Guardiola lá na alta Baviera. Porque o resto foi devidamente clonado.

Edu: Aquilo é cena para os anais de bizarrices de todas as Copas e para a eternidade como blockbuster no youtube. Foram três pupilos de Pep, não se esqueça, com um intruso, Özil, alguns dos jogadores mais reconhecidos do planeta. Fosse num jogo da Série C do Brasileirão viraria vinheta de programa humorístico. Alemães e franceses vão se ver no Maracanã, sexta-feira. Chegou a hora dos cachorros grandes?

Carles: Estava escrito nas estrelas e espero que só lá. É uma pena que logo quando o donostiarra de adoção, com sotaque franchute, Antoine Griezmann, começava a pegar o jeitinho dessa tal Copa, possa terminar a aventura dos galos. Tudo depende da poção que Didier 'Panoramix' Deschamps decida preparar para enfrentar o império. E não se esqueça de que quatro horas mais tarde, o favorito contra o azarão, no mesmo Castelão que assistiu à penúria contra os mexicanos. E com três zagueiros?... é isso mesmo? Tendência Prêt-à-porter para esse inverno?

Edu: Nunca pensei que sentiria tanta falta de Luís Gustavo. É uma hipótese, sim, colocar o zagueiro Henrique no lugar do volante suspenso é uma das cartadas de Felipão, que hoje recebeu um apoio público de ninguém menos do que Carlos Dunga, que elogiou as decisões do técnico e, não satisfeito, disse que o Brasil está no caminho do hexa. Estamos bem na fita? Agora a cena está completa. E 'favorito contra azarão' fica por sua conta.

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Carles: Unidos da Retranca pedem passagem, então? Mas, antes que eu me esqueça e para finalizar, têm ainda dois convites disponíveis para a grande festa que começa na sexta, os autossuficientes (esses sim) hermanos contra outro dos penetras, na Arena Corinthians e mais tarde na Fonte Nova o jogo que é para mim, o mais completo enigma. Arrisca algum palpite?

Edu: Os hermanos só não passam se cometerem um haraquiri coletivo - que pode ser um suicídio tático se for o caso. Mas o jogo de Salvador não será moleza para esse faceiro time belga que ainda não justificou a fama. Não digo nada se os ianques não fizerem um estrago e saírem comemorando com acarajé regado a Stella Artois rumo ao Pelourinho.

Carles: Não se depender da minha torcida.

 

 

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