Mas, para muitos, o futebol ainda é visto como a pátria de chuteiras, como definiu Nelson Rodrigues muito tempo atrás, em seus arroubos literários. Ou seja, como meio de afirmação nacionalista. E isso leva a distorções, exageros, extremos. Desemboca em batalhas, figuradas ou literais, entre torcidas opostas. Ou, pior, em choques entre povos.
Ou também provoca bobagens como esta que ocorreu na seleção da Sérvia. Sinisa Mihajlovic, que foi um bom jogador, recentemente assumiu o comando da equipe nacional do país dele. Uma das primeiras atitudes foi a de elaborar um código de conduta para os convocados. Dentre elas, a obrigação de que todos cantem o hino nacional antes das partidas.
No sábado, o meia Adam Ljajic, que joga na Fiorentina, se negou a cantar o hino, e ficou de bola fechada, enquanto estava perfilado para o amistoso com a Espanha. Questionado pelo treinador e por dirigentes, alegou que o gesto fora motivado por razões pessoais. Resultado disso? Foi cortado da equipe, com a ressalva de que terá nova oportunidade se "repensar".
A região da antiga Iugoslávia ainda sofre com os traumas de guerras, chacinas, "limpezas étnicas" ocorridas sobretudo nos anos 1990. Muita gente morreu por lá, por questões políticas, ideológicas, religiosas. Complicado, portanto, entender a cabeça de povos que ainda buscam sua identidade.
Mas, exigir que um atleta cante o hino nacional antes de jogo de futebol, não seria resquício de uma unidade mantida falsamente e à força durante décadas e que resultou em tanta tragédia? Pra que cutucar feridas ainda não totalmente fechadas? Melhor deixar os moços baterem a bolinha deles sossegados e mostrarem amor e respeito à pátria com dribles e gols.
Houve tanto sofrimento naquelas bandas. Pra que usar o futebol como instrumento político?