Nada como bater papo com um taxista para entender como funciona um país. Desta vez, porém, a conversa não foi nem com Victor nem com Jealous. O motorista que me levou para um passeio em Newtown, centro de Joburgo, atende pelo singelo nome de Lovemore. Quando ele falou a primeira vez, achei que ele estava se declarando para mim. Pensei que o cara tinha se apaixonado por mim à primeira vista, já que ele se apresentou no momento em que entrei no carro. Só fui entender que era o nome dele um tempinho depois, quando vi que ele estava começando a me olhar feio.
Lovemore é da etnia Zulu, portanto, pode ter mais de uma esposa. Pode, mas não tem. Acha que é muita despesa. Prefere ter três namoradas, sem a mulher saber. Começamos a conversar sobre o assunto e ele me explicou como as coisas funcionam por aqui. Um casal namora, etc, tudo como no Brasil ou em qualquer outro país. Na hora de casar, o noivo tem que oferecer um dote à família da noiva. Geralmente esse dote é medido em vacas, às vezes como valor estimado, às vezes literalmente pago em vacas, mesmo. Uma noiva vale dez vacas; quinze, se pertencer à família real dos Zulus.
Se imaginarmos que uma vaca, segundo Lovemore, custa cinco mil rands, isso significa que uma esposa custa 50 mil rands, ou cerca de R$ 11 mil. Lovemore diz que esse valor pode cair pela metade, dependendo da negociação entre o noivo e a família da noiva. E as vacas não precisam ser pagas no dia do casamento, o noivo pode parcelá-las ao longo do relacionamento. Se o casal se separar, inclusive, o noivo tem a opção de não pagar o que falta. Mas aí ele pode ficar queimado no mercado, se é que você me entende.
À tarde, ligo para Juanjo, um mexicano que trabablhou com Manoel Baião, meu amigo no Brasil. Estou para tomar uma cerveza (ou tequila, se estiver frio) com Juanjo desde que cheguei a Joburgo, mas as agendas ainda não haviam permitido o encontro. Como México e Argentina decidem uma vaga nas quartas de final, ligo para tentar combinar de ver o jogo juntos. Juanjo me diz que tem um ingresso sobrando. Arriba!
O caminho até o Soccer City é divertido, apesar de Juanjo insistir em ouvir música típica mexicana durante uma hora e meia. Não posso reclamar, o cara é muito gente fina. Pensei em disfarçar e colocar os tampões de ouvido que trouxe para me proteger das vuvuzelas, mas desisti porque isso me impediria de ouvi-lo, e isso poderia soar meio antipático.
México e Argentina. Juanjo me pede para torcer para o México, como se fosse necessário pedir a um brasileiro para torcer contra a Argentina. Minha torcida, no entanto, não adianta muito: o time de Maradona faz um gol, faz outro, e outro. O México ainda desconta no final, mas o jogo termina 3 a 1 para a Argentina. Com isso, o convite para comemorarmos a eventual vitória do México com tequila e cerveza é cancelado. Maldito Maradona.
Desanimado, Juanjo diz que tem que voltar para casa porque sua esposa está lhe esperando. Coitado, a Copa do Mundo acabou cedo para ele. Até cogitei fazer uma piadinha para animá-lo: pensei em perguntar quantas vacas ele tinha pago pelo casamento. Mas desisto, em primeiro lugar, porque ele não é zulu. Em segundo, porque não se brinca com os sentimentos de um fanático por futebol cuja seleção acaba de ser eliminada. Hasta la vista, México.