Aos 39 anos e após um relativo atraso, Antônio Rodrigo Nogueira, o "Minotauro", anunciou nesta terça-feira sua aposentadoria do MMA, dando fim a uma das carreiras mais vitoriosas desse breve esporte. O baiano radicado no Rio de Janeiro pendura as luvas depois de já ter ostentado o título peso pesado do Pride e o cinturão interino da mesma categoria do UFC, e, apesar de seus tempos de glória estarem distantes, o saldo competitivo do agora ex-atleta é amplamente positivo.
O que fez um lutador apenas especialista no jiu-jitsu ir tão longe no MMA? Capacidade de absorver golpes, perseverança e senso de oportunidade. Basicamente, "Minotauro" em muitas lutas sabia que teria pouca oportunidade de utilizar seu jogo de chão e ele teria que aproveitar quando a chance aparecesse - mesmo que tivesse de aguentar uma surra antes disso, mas nada impossível para quem foi atropelado por um caminhão quando criança, sobreviveu e se tornou um atleta de alto nível.
Três combates foram emblemáticos na carreira de Nogueira; contra o gigante Bob Sapp, o letal Mirko "Cro Cop" e bruto Tim Sylvia, o brasileiro sofreu por falta de capacidade de levar oponentes para o solo. Porém, contra esses três adversários, o jiu-jitsu de alto nível de "Minotauro" apareceu.
É bom frisar que o brasileiro não foi um jiu-jiteiro de grandes resultados em competições com e sem quimono - talvez até porque lhe tenha faltado foco, "Minotauro" migrou muito cedo para o então chamado Vale-Tudo. No MMA, ele muitas vezes se utilizava de técnicas bem simples, por exemplo, depois de ter derrubado "Cro Cop", Nogueira fez o básico do básico para um faixa preta ao passar a guarda, montar e se aproveitar das costas expostas do rival para encaixar uma chave de braço.
Foi fácil conseguir aquilo? Com certeza não foi. Em 45 lutas de MMA, "Cro Cop" só foi finalizado uma vez mais. É claro que o corata melhorou muito a técnica de solo dele após aquele combate, mas o ponto é que era muito difícil derrubá-lo e que "Minotauro" levou uma surra no primeiro round - que no Pride tinha 10 minutos - inclusive suportando o lendário chute alto de esquerda na cabeça. Havia um enorme cansaço físico e absurda pressão mental para aproveitar aquela que seria a única chance de Nogueira - e ele aproveitou.
Ao contrário de "Cro Cop", Sapp deu muitas brechas ao brasileiro, o problema era tirar proveito contra um rival cerca de 40 Kg de músculos mais pesado. "Minotauro" cansou o norte-americano com todo seu repertório e o finalizou com uma chave de braço. Detalhe para as falhas tentativas de derrubar Sapp seguidas de uma raspagem característica de Nogueira que o fizeram ficar por cima em duas ocasiões, aos 55 segundos e aos 3,00 minutos deste vídeo. Por baixo do corpo do gigante, o então campeão do Pride pegava um braço do rival e passava a perna do outro lado pelo vão aberto, em seguida ele sentava e completava o movimento ao ficar por cima e passar a guarda. Lindo!
Outra marca registrada de "Minotauro" era sua raspagem de meia-guarda. Depois de dois rounds e meio de surra sofrida contra Sylvia, Nogueira travou o norte-americano nessa posição e abraçou a perna esquerda do rival, tirando-lhe o equilíbrio e invertendo a posição. Uma vez por cima, como contra "Cro Cop", o brasileiro aproveitou a única chance que teve: passou a guarda e finalizou com uma guilhotina (aos 14:20 minutos deste vídeo).
A carreira de "Minotauro" se estendeu por longos 16 anos e 46 lutas, mas infelizmente as últimas não foram nada prazerosas de se assistir - foi triste vê-lo não conseguir nem ser competitivo contra adversário do nível de Roy Nelson e Stefan Struve. Nogueira foi um lutador limitado, sem dúvida, suas tentativas de melhorar seu boxe demoraram para apresentar resultado e este foi pouco satisfatório. Muitas cirurgias limitaram seu jiu-jitsu e o obrigaram a buscar essa evolução na luta em pé para continuar sendo competitivo - em alguns de seus últimos combates, ele até apresentou alguma capacidade de enquadrar rivais contra a grade e travá-los com um braço por baixo de um dos sovacos para golpear com a outra mão, mas ainda assim era pouco.
Nessa revisitação, é importante dizer que "Minotauro" teve suas pedras no sapato, principalmente Fedor Emelianenko, que conseguiu anular completamente o jiu-jitsu do brasileiro, algo impensável em 2003, e Frank Mir, o primeiro homem a nocautear alguém que julgavam "inocauteável" e finalizar aquele que confiavam ser "infinalizável". Porém, independentemente dos tropeços, das desculpas para justificar derrotas e de supostamente tratar mal alguns fãs, Nogueira se aposenta com uma carreira invejável para ostentar e como exemplo de perseverança.