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Um blog de futebol-arte

A bola e o bruto

O Corinthians prossegue caminhada tranqüila rumo ao título, seguido meio de longe pelo Inter. Em condições normais de temperatura e pressão, ambos vencem os compromissos de amanhã (São Caetano x Corinthians, no Anacleto, e Inter x Brasiliense, em Porto Alegre) e se encontram domingo, no Pacaembu. Pode ser o final do campeonato. Ou o Inter pode botar peso nas costas do líder para as duas rodadas seguintes, que fecham o Brasileirão. Veremos. Enquanto isso, o Santos de Nelsinho Baptista continua fazendo história. Depois dos vergonhosos 7 a 1 para o Corinthians, novo vexame na goleada diante do Internacional. Perdeu a quarta partida consecutiva, feito inédito do clube em campeonatos nacionais. Nelsinho não se fez de rogado. Questionado sobre sua pífia atuação em 11 jogos à testa do clube, deu um bico na ética e tirou o seu da reta: "Quem passou por aqui deixou um trabalho horrível", disse, despejando a responsabilidade nas costas largas do Gallo. Bem, horrível e pavoroso é o trabalho dele, Nelsinho, "dirigindo" um time que tomou 11 gols e fez um nos dois últimos jogos. Fica a pergunta: até quando a diretoria vai permitir que esse técnico e esses jogadores continuem a enlamear a camisa do Santos, de tanta tradição? ENSAIOS DA COPA A Inglaterra fez um jogaço contra a Argentina, briga de cachorro grande, tenso do começo ao fim e sem vencedor fechado até o final. Jogo eletrizante, dois estilos diferentes em campo (o que no futebol globalizado é raro), e que deve ter ensinado muito às equipes e respectivos técnicos. Também legal a vitória da Itália sobre a Holanda por 3 a 1, com a Azzurra de Marcello Lippi deixando de lado o defensivismo e jogando com maior disposição ofensiva. Enquanto isso, a seleção participava daquele baba (que é como os baianos chamam as peladas) lá nos Emirados Árabes. Ah, essa devoção à grana ainda vai acabar com o futebol brasileiro. MEMÓRIA DE MANÉ Simpática essa visita do Ulf, o filhote sueco que Garrincha fez numa das excursões do Botafogo. E não deixa de ter razão a bronca do filho gringo ao ver o estado de abandono em que se encontra o túmulo do pai, em Magé. Em pior estado está a memória de Mané, sempre relegado a posição secundária quando se fazem listas dos maiores jogadores de todos os tempos. Cristalizou-se a idéia de que Pelé é o rei inconteste e, em segundo lugar, viria Maradona, sem a menor sombra de dúvida. Acontece que a maioria dos votantes não viu Mané jogar e não têm idéia do tamanho do seu futebol. Tivessem visto, e não votariam em Maradona com tanta convicção. Garrincha foi o máximo em campo, algo quase sobrenatural. Como não deu muito certo na vida privada, costuma ser descartado numa época em que o sucesso (material) é cultuado acima de tudo. TAPAS E BEIJOS Os amigos boleiros me perdoem, mas vou surrupiar algumas linhas do futebol e dedicá-las ao boxe. Sei que Mike Tyson é desordeiro. Assim, quem se sentiu prejudicado e agredido por ele que vá à justiça. Quanto a mim, sinto por ele o respeito que merecem os que já foram grandes e caíram. Depois da sua tumultuada passagem por São Paulo, resolvi dar uma relida num magnífico texto de Norman Mailer, escrito quando Tyson estava no auge, nos anos 80. Não havia então quem sonhasse derrotá-lo num ringue. Seus nocautes eram quase todos no primeiro round e Tyson tinha o mundo a seus pés. Depois foi decaindo, parou na cadeia, tentou voltar e viu-se nocauteado, uma e mais vezes. Terminou, como sabemos, em São Paulo, freqüentador da boate Love Story e do Café Photo, assediado por mulheres e fotógrafos. No texto, Mailer fala dessa força bruta e incontrolada, que encontrava rumo apenas nos conselhos do seu mentor, o ítalo-americano Cus D'Amato, que tirou Tyson do gueto e o levou à fama. D'Amato morreu e hoje Tyson é um homem que não confia em ninguém. Não o deixam em paz e onde está vira notícia. Em especial se cometer ato de truculência, o que todos parecem esperar e não é difícil de acontecer. Nessas condições, tornou-se presa fácil em São Paulo, cidade selvagem (como dizia Lévi-Strauss), de que gostou e para onde promete voltar. Ah, sim, entre sopapos e idas à delegacia, ocupado com garotas de programa e paparazzi, o brutamontes Mike Tyson ainda teve tempo para notar uma coisa interessante. Estranhou que em país tão belo crianças andassem descalças pela noite, pedindo esmolas. Nós, os civilizados, já não estranhamos mais.

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

15/11/2005

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