Devemos - e podemos - ver nessa primeira convocação uma tendência, e talvez não muito mais do que isso. Muita água vai rolar até 2014 e o primeiro a saber disso é o próprio Mano. Livre das Eliminatórias, terá de enfrentar a Copa América, um pré-olímpico e a Copa das Confederações, além de amistosos. Nada que indique chapa quente em sua trajetória, a não ser que monte seleções que joguem muito mal e comprometam a sua chegada à Copa. Não deve acontecer isso. Em condições normais de temperatura e pressão, Mano deve mesmo ser o treinador na segunda Copa a ser realizada no Brasil. E com a missão explícita de que a experiência traumática da primeira, a de 1950, não seja repetida. Até lá há um longo caminho.
Como dizia certo líder chinês, toda longa marcha começa por um primeiro passo. E, se esse foi mesmo o passo inicial, o companheiro Mano o deu com o pé direito. Dá para formar com o pé nas costas um bom time com essa base renovada. Sem pensar muito: Vítor, Thiago Silva e Henrique; Daniel Alves e Marcelo; Lucas, Hernanes, Ganso e Carlos Eduardo, Neymar e Pato. É time de respeito, jovem, talentoso e pode jogar de maneira interessante.
Existem variantes e possibilidades diferentes de montar esse time-base com os 24 convocados. Isso não quer dizer que esses jogadores sejam as únicas opções. É bem possível que outros náufragos da campanha de 2010 sejam ainda resgatados. Por exemplo, não é justo que Julio Cesar seja descartado apenas pela falha no gol da Holanda. Parece também pouco provável que Kaká, se voltar à forma ideal, fique de fora do time. Isso para citar apenas dois. Algum continuísmo não faz mal nenhum à renovação. Pelo contrário. Até revoluções preservam alguns quadros do regime deposto porque são eles que conhecem o funcionamento da máquina administrativa. Veteranos podem dar segurança aos novatos, pelo menos nos primeiros tempos. Mas, se a ordem era renovar, Mano a cumpriu à risca.
Definidos esses primeiros nomes, o principal será ver se a seleção voltar a jogar um futebol digno da tradição brasileira. Esse, para mim, é o ponto principal. O estilo de jogo. A Copa da África e o bom senso já deviam ter nos levado a engavetar essa discussão tola entre futebol-arte e futebol de resultados. O que existe é futebol bem jogado, e ponto. Quando um time joga bem, tem tudo para vencer e encantar, ressalvada a imprevisibilidade característica desse esporte. Vários times históricos (o Santos de Pelé, o Palmeiras de Ademir da Guia, o Cruzeiro de Tostão, o Flamengo de Zico, etc.) jogaram muito bem, e venceram. Para não ficar no passado: o Santos do primeiro semestre resgatou a arte de jogar bola com alegria, e com isso conseguiu resultados.
Tomara Mano consiga devolver à seleção esse prazer juvenil de brincar com a bola. E brincando, ser séria e eficaz. Estamos na torcida.
(Coluna Boleiros, 27/7/10)