E assim foi contra o pobre Uruguai. Primeiro tempo humilhante, em que até os gandulas viram a bola mais de perto do que os nossos atônitos vizinhos. No segundo, os espanhóis relaxaram mas, mesmo assim, o Uruguai pouco fez. O gol de honra foi marcado no final, em lance fortuito e de pouca consequência para o resultado.
O interessante é que a Espanha já coloca um problema para a Copa das Confederações, ensaio geral para a Copa do Mundo: será possível pará-los? A apresentação contra o Uruguai foi um cartão de visitas até certo ponto assustador. Muita gente lembrou do baile que o Uruguai levou da Holanda na Copa de 1974. Poderiam lembrar também da contradança do próprio Brasil ao perder de 2 a 0 para a Laranja Mecânica, na mesma Copa. As comparações valem. Todo mundo sabe que o jogo espanhol mudou através do implante holandês no Barcelona. Em 1974 todos foram pegos de surpresa. Ninguém conhecia direito o gênio Rhinus Michels e a arte de Crujyff, Neeskens & Cia. O mundo veio abaixo.
Agora não. Tudo mudou, as comunicações explodiram e todos conhecem de cor como todos jogam. Não há novidades. O esquema espanhol é manjado. Mas o conhecimento não foi bastante para a equipe uruguaia encontrar antídoto mínimo contra o insidioso veneno. Haverá esse antídoto ou teremos de beber o veneno até a última gota do cálice? É a questão fundamental do futebol contemporâneo. Mas, afinal, o Bayern não quebrou o jogo do Barcelona? Será que os técnicos não viram esses jogos da Champions? Da maneira como atuou o Uruguai parecia que o estilo espanhol era novidade absoluta para Oscar Tabárez. Deixou-se aprisionar sem qualquer reação.
Outra dúvida: o jogo espanhol será chato também para a plateia? Digo isso por causa das vaias para a seleção de Vicente del Bosque ao longo de quase todo jogo no Recife. Bem, leve-se em conta que, em caso de neutralidade, a torcida pende para o mais fraco, daí a possível preferência pelo Uruguai. Mas, além disso, entendo que o jogo espanhol causa mesmo uma impressão de monotonia, de hipnose. É horizontal demais. Ataca, mas apenas em momentos precisos. Flutua, como beija-flor, e só avança para picar. Pode ser um primor de técnica e inteligência, mas leva ao desespero quem prefere um jogo mais vertical, como o dos alemães. Me identifico com os que acham chato o jogo espanhol. Eu até o admiro, sem amá-lo, como a grande maioria dos meus companheiros de crônica esportiva. Vejo, mas mal posso evitar a vontade de folhear uma revista ou um livro enquanto eles ficam trocando infinitos passes aparentemente (e só em aparência) sem objetivo. Não me lembro dessa impressão de tédio ao ver a seleção holandesa jogar em 1974. Precisaria rever essas partidas históricas.
De qualquer forma, a presença dos espanhóis já garante interesse a esta Copa das Confederações. Será muito bom vê-los testados contra outras tendências de jogo, em particular a italiana e a brasileira. O resto não conta tanto. Nem mesmo o Uruguai, em que pese a sua grande tradição. Uma bela final seria Brasil x Espanha. Jogo para tirar a teima. Ou para cair em depressão profunda.
* Coluna publicada no Esportes do Estadão