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Com o basquete, José Vitor tenta superar chacina em Suzano

Ferido com uma machadada no massacre na escola Raul Brasil, aluno se apoia no esporte após tragédia

Foto do author Gonçalo Junior
Por Gonçalo Junior
Atualização:

O basquete tem sido um aliado para José Vitor Ramos Leme superar o trauma do massacre da Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano (SP). O adolescente de 18 anos foi um dos sobreviventes do ataque feito por dois ex-alunos que entraram armados no colégio. Foram dez mortos, incluindo os dois atiradores, e 11 feridos. José Vitor ganhou notoriedade ao escapar da chacina correndo para o hospital com uma machadinha cravada no ombro direito.

O ferimento, que deixou uma extensa cicatriz, não impede os arremessos e o controle de bola do menino que gosta de ser armador. Ele garante que não sente dores. Antes do massacre, ele era um dos mais assíduos do programa de treinamento do Centro Esportivo da Prefeitura de Suzano. Hoje, ele joga no parque Imperador, também em Suzano. O amor pelo basquete se mantém, mas a frequência de treinos diminuiu. A mãe, a dona de casa Sandra Regina Leme, revela que o menino vive uma crise de depressão. Só sai do quarto para tomar banho e fazer as refeições. Ele não quer participar das consultas com o psicólogo oferecidas por meio de um convênio do governo estadual com psicólogos da cidade. 

José Vitor Ramos Leme encontrou no basquete uma forma de superar os acontecimentos do massacre na Escola Estadual Raul Brasil Foto: Werher Santana/Estadão

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O Estado encontrou José Vitor em um dia de desânimo. O torcedor do Los Angeles Lakers não quis contar suas lembranças sobre o episódio da escola. Fez uma careta de desaprovação já na primeira pergunta deixando claro que as dores emocionais estão ali. À época, ele disse que correu da escola para o hospital para sobreviver. Também havia se lembrado de algumas lições de enfermagem para conter hemorragias. 

Nove meses depois, o único assunto que ele abordou foi basquete, seu esporte desde a infância. "Prefiro basquete ao futebol. Mil vezes. É melhor jogar do que torcer. Pensei em ser jogador de basquete profissional, mas é muito difícil se manter", diz o adolescente. "O basquete é uma coisa que eu gosto de fazer. O esporte significa educação e muito esforço". 

A história trágica e o amor pelo esporte fizeram com que fosse escolhido como um dos embaixadores da NBA para o evento NBA House, espaço de atividades para os fãs que funcionou no mês de maio. José Vitor foi uma espécie de convidado VIP, tirou fotos com ídolos e ajudou a divulgar a liga norte-americana. Ele pode ser convidado novamente, mas a programação para 2020 não foi definida. "Foi muito legal. Eu sempre vi jogos da NBA e sonhava em jogar lá. Ainda conheci o Oscar (Schmidt) e ganhei uma camisa e autógrafos dele", diz o rapaz, que conseguiu conhecer alguns ídolo do seu clube do coração no Brasil, o Mogi das Cruzes, como Shamell e Tyrone, ex-jogadores do time. "Já pude conhecer o Lucas Bebê, que disputava a NBA, o Shamell me visitou", relembra o adolescente com inúmeros uniformes guardados. 

José Vitor carrega no ombro a marca que o ataque em Suzano (SP) deixou no seu corpo Foto: Werther Santana/Estadão

Antes de começar o basquete, José Vitor foi modelo fotográfico. Ele estampou uma capa da revista IstoÉ, foi fotografado em ensaios para a marca de confecção Hering e para o Juventus, tradicional clube paulistano. Como ator, ele se destacou na minissérie "O Menino Grapiúna", da TV Record, de 2011. A experiência com as câmeras facilitou na hora das fotos. Ele se mostrou mais desinibido na frente da lente do que na hora da entrevista. José Vitor fala pouco e usa frases curtas. 

INDENIZAÇÃO

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Todas as famílias das vítimas do massacre fizeram acordos extrajudiciais de indenização com o Estado. Segundo a Defensoria Pública de São Paulo, os feridos passaram por avaliações física e psicológica. Os laudos embasaram a definição de valores e acordos indenizatórios. No caso da família de José Vitor, o valor oscilou em torno de R$ 100 mil. A indenização ajudou na compra de um novo imóvel, mais confortável que a antiga casa, que era localizada nas proximidades da escola Raul Brasil.

Mãe e filho estudam processar o hospital onde ficou internado pela divulgação de fotos quando ele estava sedado no centro cirúrgico para a retirada da machadinha do seu ombro. Aos 18 anos, José Vitor voltou a estudar na mesma escola e cursa o segundo ano do Ensino Médio. Ele aguarda a liberação de um investimento bancário para comprar seu primeiro carro. 

Para o futuro, está dividido entre o ensino superior – educação física e jornalismo são as principais opções – e a carreira política. Com incentivo da mãe, José Vitor pretende se candidatar a vereador em 2020 para defender projetos nas áreas de urbanização, saúde e esporte. 

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