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'A seleção brasileira tem que se impor', afirma Zagallo

'Velho Lobo' aprova reinício de Dunga à beira do gramado

Foto do author Marcio Dolzan
Por Marcio Dolzan
Atualização:

Mario Jorge Lobo Zagallo não esquece a seleção brasileira. Tetracampeão mundial como jogador, técnico e auxiliar, ele continua como fiel torcedor da "amarelinha", termo que usou mais de uma vez há duas semanas, quando recebeu o Estado para uma conversa no condomínio onde mora, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio. Por quase uma hora, Zagallo falou sobre "o erro, a infelicidade do Felipão" nos 7 a 1 e se disse surpreso pela escolha de Dunga como sucessor. Mas demonstrou confiança no atual treinador, que "está fazendo um trabalho muito bom e uma mudança tática em relação ao que foi apresentando na última Copa". Para Zagallo, a Copa América do Chile "será um bom teste". Ele destacou a importância de Neymar e disse ter convicção de que o Brasil estará no Mundial da Rússia. O ex-treinador também comentou duas de suas decepções: o bronze olímpico e a derrota na final da Copa da França. E o "Velho Lobo" não deu por encerrado seu ciclo na seleção. "Falou em 'amarelinha', eu estou sempre junto para colaborar." Confira os principais trechos da entrevista:

Zagallo gostaria de ser chamado para assistente pontual da seleção Foto: Marcos Arcoverde/Estadão

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Como o senhor vê o momento da seleção?

Está numa fase de transição. Infelizmente perdemos a Copa em casa, e é óbvio que você não pode mudar da noite para o dia. Eu, a princípio, até pensei que fosse escolhido outro treinador - ninguém poderia pensar no Dunga porque ele não estava trabalhando em clube. Acho que ele aproveitou bem e está fazendo um trabalho muito bom: invicto em oito jogos e fazendo uma mudança tática em relação ao que foi apresentando na última Copa. Ele está querendo resgatar e colocar em prática o próprio futebol brasileiro. Todos sabem que o nosso futebol é de toque. A seleção tem que se impor tanto na parte defensiva quanto na parte ofensiva.

Na avaliação do senhor, essa série de oito vitórias já devolveu o respeito e orgulho que a seleção sempre teve?

Os resultados contra equipes grandes são fundamentais para que o futebol brasileiro tenha o mesmo prestígio de antes. Não é por um 7 a 1, uma coisa desastrosa, que nós não vamos dar a volta por cima. Houve um erro, uma infelicidade do Felipão, de ter adotado naquele momento uma marcação sob pressão, quando a seleção brasileira não vinha bem. É só você olhar para a Argentina, como ela jogou contra a Alemanha. Teve tudo para fazer 1 a 0, e hoje nós não estaríamos falando na Alemanha, estaríamos falando da Argentina. Mas o futebol é resultado. A Alemanha jogou bom futebol? Jogou, não tenha dúvida, mas o futebol brasileiro pode se erguer, tenho certeza absoluta.

Se o Brasil tivesse jogado de uma maneira diferente, poderia ter vencido?

Não tenha dúvida. Nós não vínhamos jogando bem, quase fomos eliminados pelo Chile. Até aí o futebol brasileiro não explodiu, então como você vai jogar contra uma Alemanha fazendo marcação em cima?

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Pode-se tirar um aspecto positivo ou alguma lição daqueles 7 a 1?

Aquilo foi um desastre, não se pode analisar "ah, o futebol brasileiro acabou". Foi um momento, uma decisão em que se tivesse adotado um esquema defensivo, aí sim, para contra-atacar... Estava em casa vendo o jogo, e quando a seleção saiu em cima, eu disse que estava errado. Isso no meu ponto de vista, não sou dono da verdade. Foi uma infelicidade do Felipão.

Pelo bom nível atual das demais seleções, o senhor acha que esta Copa América vai ser uma das mais difíceis?

Acho que sim, porque o Brasil ainda não está pronto. Vai ser um bom teste, e as ideias do Dunga estão mostrando que a gente está no caminho certo. A concretização vai ser na Eliminatória, e digo isso porque o Brasil nunca deixou de se classificar para a Copa do Mundo. Mas, pela evolução dos outros países e com o Brasil chegando de uma reformulação, será um teste para ver quanto progredimos.

Um eventual fracasso na Copa América pode trazer alguma consequência para essa evolução?

Não creio. Estamos num período de testes até o Dunga chegar (e mostrar) "esta é a seleção brasileira". Uma base ele já montou, e vai chegar o momento em que vamos ter um time em que todos vão saber de cor.

O senhor lembrou que o Brasil nunca ficou de fora de uma Copa do Mundo. Tem receio que isso mude agora?

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Não, eu tenho confiança no futebol brasileiro, como tenho confiança nos treinadores brasileiros. Fala-se muito que na Europa estão os melhores treinadores. Evidente: se você tem em mãos jogadores de alto nível, vai trabalhar dentro dos clubes que são verdadeiras seleções. É bem diferente do futebol que está sendo jogado aqui. Os treinadores (europeus) têm na mão o que querem. Queria que o Guardiola, o Mourinho, o Ancelotti, viessem trabalhar aqui e pedissem "traz o Fulano". Não tem. "Traz o Cicrano". Não pode. Aí eu queria ver essa diferença que tanto falam.

E dentro de campo, o Brasil está carente de jogadores diferenciados?

Se você for fazer uma comparação de antes para agora, há uma diferença grande. Por exemplo, quando eu cheguei para ser treinador eu tinha o que escolher, nós tínhamos todo um material humano. Mas é evidente que um treinador é de grande importância na mudança tática, na escolha dos jogadores. Eu mesmo peguei uma seleção que estava jogando num 4-2-4, totalmente superada, e mudei a maneira de jogar, jogando em bloco, a princípio num 4-3-3, mas sabendo se defender e sabendo atacar.

O Neymar já está no auge ou ainda tem a crescer?

É um excelente jogador, e tem pouca idade ainda. Ele tem muita coisa pela frente! A experiência ainda vai bater nele, que atualmente é o melhor jogador do futebol brasileiro e um dos melhores do mundo. Mas ele está só, e precisa de coadjuvantes para explodir e o Brasil mostrar que nosso futebol continua de pé.

Nesse sentido, o senhor acha que o fato de jogar no Barcelona, ao lado de Messi, Suárez e Iniesta, é bom para ele?

Sim, é de grande importância. Eles sabem a maneira de jogar e o Neymar se encaixa neste molde de jogadores de alto nível técnico. É melhor do que vir para cá e jogar em qualquer time; ele não vai ter a mesma produção que está tendo no Barcelona. Ele vai cair porque o futebol que está sendo jogado aqui dentro não se pode comparar com o nível de um que tem o Messi, o Suárez. Acho que o Neymar ainda vai ser um fora de série; se ele já é, vai produzir ainda mais.

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Neymar será eleito o melhor jogador do mundo?

Neste momento, Messi e Cristiano Ronaldo estão à frente. Mas, mais adiante, não tenho dúvida. Ele tem futebol para isso.

O ouro olímpico é uma obsessão. O senhor acha que isso atrapalha?

A gente tem de correr atrás. Uma coisa que ficou engasgada na minha vida foi o ouro olímpico. Nós ganhamos um bronze quando devíamos ter trazido o ouro (nos Jogos de Atlanta, em 96).

É uma de suas maiores decepções?

Tenho certeza, apesar de ter ganhado o bronze. O objetivo era o ouro, e o futebol brasileiro tem de pensar sempre assim, no ouro. Não deu, tivemos uma infelicidade. Já tínhamos ganhado deles (Nigéria) de 1 a 0 na fase inicial e ganhando de 3 a 1 (na semi) você não pode perder o jogo.

Foi mais dolorido do que perder a final da Copa de 1998?

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São duas coisas diferentes. Houve o problema com o Ronaldo, que não teve culpa absolutamente de nada. Ele teve um problema físico no dia do jogo, com a convulsão. Podia ter dado cinco dias antes ou cinco dias depois... Fomos vice, mas se estivesse tudo normalizado seria outro resultado. Não quero menosprezar em nada a França, que ganhou e ganhou bem, mas o problema do Ronaldo teve uma influência muito grande. É passado. Gosto demais do Ronaldo, para mim foi o melhor atacante que vi fazendo gols, sofreu da parte física do joelho duas vezes e se superou. Tenho de bater palmas pro Ronaldo por tudo o que ele representou.

Sente falta do convívio com a seleção brasileira?

Ah, é bom demais. A gente fica com saudade, torcendo como eu torci (na Copa do ano passado).

A seleção agora tem o assistente técnico pontual. Se surgisse o convite, o senhor aceitaria?

É uma satisfação, mas depende do meu estado, se estou em condição de fazer uma viagem grande. Mas, falou em "amarelinha", eu estou sempre junto para colaborar.

O que podemos esperar do Campeonato Brasileiro?

Acho que o Palmeiras tem uma equipe pronta. O Palmeiras tem não só um time, mas um banco grande para fazer as mexidas e isso vai ser fundamental. Claro que temos o Corinthians, o Cruzeiro, o Atlético, o Inter, o São Paulo... Gosto muito do São Paulo, e acho que vai engrenar. Não posso deixar de citar o Santos, mas tem um grupo muito pequeno para uma extensão muito grande de jogos.

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O que o senhor achou da punição de quatro anos imposta ao Jobson?

Um absurdo. Acaba com a vida de um jogador. Ele está com 27 anos e vai ficar quatro anos parado? Se for pra punir, quatro anos é muita coisa. Que sejam seis meses, então. Ele nem foi pego em nada, apenas não fez o exame. Não pode tirar o ganha-pão do cara da noite para o dia.

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