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Amigos contemplam destino de Zé Roberto

Por Agencia Estado
Atualização:

Em 1996, a Portuguesa teve o seu último grande time. A equipe vinha do terceiro lugar no Paulista do ano anterior e conquistaria o País, com um futebol solidário e sem estrelas. Acabou sendo vice-campeã brasileira, perdendo o título para o Grêmio nos minutos finais. Na oportunidade, sua força estava no conjunto. Muitos jogadores se destacando - Rodrigo Fabri, Alex Alves, César, Emerson - e a grande revelação, o então lateral-esquerdo Zé Roberto, recém-promovido dos juniores. Tímido, teve nos companheiros Roque e Tico o alicerce para encantar com seus dribles rápidos e desconcertantes. Surgia, ali, um craque, rapidamente apelidado de Garrinchinha. Hoje, passados 7 anos, Zé Roberto vive o melhor momento da carreira. Atua na Europa, no Bayern de Munique, e é titular da seleção brasileira de Carlos Alberto Parreira. Atua no meio-campo. Seus amigos não tiveram a mesma sorte. Estão parados há 6 meses e nos últimos dois anos passaram por vários clubes sem expressão, na maioria deles sem receber salários. Sonham em disputar o Campeonato Paulista, ao qual definem como "grande vitrine para dar a volta por cima na carreira". Aprimoram a parte física e sempre disputam uma ?pelada?. O volante Roque, 30 anos, corre na Avenida Inajar de Souza ou no Horto Florestal (quando pega carona com um amigo pois não tem carro), faz academia, joga em time de society, o Palmares, do Imirim, com amigos e, às vezes, atua nos campos de várzea. Quando pode vai ao Pacaembu ou ao Morumbi. "Estou sempre ligado, atualizado." O atacante Tico, 32, conseguiu uma espécie de patrocínio da ADPM (Associação Desportiva da Polícia Militar). Usa as modernas salas de ginástica do local e defende o time aos sábados, normalmente em amistosos com outros clubes, ou em equipes de várzea. Ganha uma ajuda de custo que prefere não divulgar. Tico defendeu a Portuguesa de 1983 a 98 e Roque de 86 a 98. Além das belas campanhas de 95 e 96, ambos foram campeões do Paulista de Juniores de 1990 e da Taça São Paulo de 1991. Até hoje fazem juras de amor ao clube onde foram revelados e sonham, ainda, em vestir a camisa rubro-verde. "Nas festas juninas da Lusa, sempre me perguntam quando vou voltar. Seria uma honra", afirma Roque. E, como não tem empresário, acha que o acordo do time do Canindé com a Ability, poderia facilitar sua volta. "De repente, numa dessas... Se me ligarem, tô indo na hora." Tico, com passagens por São Paulo, Coritiba e Panionios, também está sem empresário. Fez um acordo verbal com Edinho, filho de Pelé, com promessa de receber ajuda na busca por novo clube. Lembranças - Quando o assunto é Portuguesa, Roque tem várias histórias para contar. E sempre com os amigos Tico e Zé Roberto envolvidos. No início da carreira do meia, Roque era seu verdadeiro assessor. Levava Zé Roberto para almoçar todos os dias em sua casa, sempre compravam roupas juntos e adoravam rap. Até o primeiro carro de Zé Roberto foi o volante quem buscou. "Um Fusca", lembra. Mas foi no amor pela música originária dos negros americanos, a maioria dos guetos dos Estados Unidos, onde encontraram identificação. Adoravam o rapper Tupac Shakur (assassinado em setembro de 1996 após uma luta de Mike Tyson). "Fomos um dia na Galeria (Rua 24 de Maio, centro de São Paulo) e escutamos aquele CD. Compramos na hora", recorda Roque. "Um dia, fomos de São Paulo até Serra Negra para a pré-temporada ouvindo a mesma música." Resolveram formar a Turma do Tupac. Roque, Tico, Zé Roberto, Carlos Alberto e Adriano juntaram-se e adotaram o visual do rapper. Rasparam a cabeça e deixaram cavanhaque e bigodinho. "O Candinho (treinador na época) ficou louco quando nos viu carecas. Mas o Zé (Roberto) disse que estávamos com piolho e ele acreditou", revela. Bons momentos... Dificuldades - Quem vê a situação de ambos hoje não imagina que já tiveram vida estável, dinheiro, carros importados, roupas de grife e curtiram muitas viagens. As casas nas quais moram foram compradas com dinheiro da época em que defendiam a Lusa. Hoje, cortaram muitos gastos e nada de luxo. Roque garante não estar passando necessidade. Afirma ter um pouco de dinheiro guardado do tempo em que se transferiu para o Panionios. Uma indicação de Tico. "Tinha um dinheiro guardado, estou segurando a onda, mas sinto falta de estar jogando." Na verdade, a situação é delicada. Embora desconverse sobre o assunto crise financeira, os problemas são expostos por dona Jacira, sua mãe. Revela a volta ao trabalho do marido, Francisco, de 62 anos e aposentado. Ajuda em um restaurante de um amigo. O filho teve de se desfazer do carro, os planos de saúde foram cancelados. "Tínhamos muitas regalias, muitas mesmo, acabaram todas, as viagens, as horas de distração", afirma Jacira. Evangélica, ela acredita que Deus irá abrir as portas para o filho. E espera que os dirigentes de futebol lembrem de Roque. "Um time onde, pelo menos, ele ganhe o suficiente para viver." Jacira não perde a esperança. Seu único temor é sobre uma possível depressão do filho. "Já peguei ele bem para baixo, chorando pelos cantos da casa." A rotina de Tico, padrinho de casamento de Zé Roberto, também mudou. Casado e pai de dois filhos, avalia somar mais gastos que o ex-companheiro. "Tenho outro ritmo de vida, controlado. Ir a shopping, restaurantes, comprar roupas de grife, não faço mais." Os dois jipes importados, um Cherokee e um Terios, da Daihatsu, fazem parte do passado. "Hoje, tenho um nacional e está bom de mais." Amizade - Apesar de viverem em ?mundos diferentes?, quando podem os amigos trocam bons e longos papos. "Após um jogo do Campeonato Alemão, o Zé não conseguia dormir, então me ligou. Ficamos quase uma hora trocando idéias", fala Tico, vizinho de Roque, na Freguesia do Ó, zona norte de São Paulo. Dão força para o agora "rico" da turma e cultivam o sonho de voltar ao palco onde sabem dar espetáculo.

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