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BRASIL EXPORTA MUITO E GANHA POUCO COM A VENDA DE ATLETAS

Em crise, clubes brasileiros se limitam a fornecer matéria-prima. Renda obtida com negociação de jogadores ainda é muito baixa no contexto internacional

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Por Jamil Chade - correspondente
Atualização:

Com clubes atolados em dívidas, o Brasil afunda na condição de mero fornecedor de matéria-prima para o futebol mundial e a diferença entre a situação financeira do futebol europeu e brasileiro se aprofunda. 

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Dados colhidos pela Fifa e obtidos com exclusividade pelo Estado revelam que, em 2014, os jogadores brasileiros foram os mais comercializados no mundo. Mas a renda obtida pelos clubes com suas vendas está cada vez mais distante das potências europeias. 

Se por décadas o preço do atleta brasileiro era um atrativo extra aos clubes europeus, a esperança era de que, aos poucos, os clubes nacionais poderiam competir financeiramente de igual para igual com os grandes da Europa, o que faria com que o preço dos jogadores nacionais tomassem uma proporção mais parecida ao da Europa. 

O que ocorreu, porém, foi justamente o contrário, com uma concentração de renda inédita no futebol mundial nas mãos de apenas 20 clubes europeus. Assim, casos como o de Neymar, que em 2013 foi vendido por mais de80 milhões, ainda são situações isoladas no futebol nacional. 

Segundo os dados da Fifa, o Brasil “exportou” em 2014 cerca de 689 jogadores, o que coloca o País na liderança como maior fornecedor de craques ao mundo. Mas isso não significa o maior lucro. Essas vendas geraram aos clubes, jogadores e agentes um volume de US$ 221 milhões. 

A Espanha, que vendeu quase cem jogadores a menos que o Brasil no mesmo período, obteve US$ 667 milhões com suas exportações. O Brasil também é ainda superado por Inglaterra, Portugal, França e Itália. 

O preço relativamente baixo obtido pelo Brasil não significa falta de dinheiro no mundo do futebol. Em 2014, as transferências internacionais de jogadores superaram a marca de US$ 4 bilhões (cerca de R$ 10 bilhões), um recorde. No total, foram 13 mil transferências no mundo, 2,9% a mais que em 2013. Em termos de valores, a alta foi de 2,1%.

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Mas a constatação é de que esse dinheiro está cada vez mais concentrado na Europa. Um estudo da consultoria PriceWaterHouse Coopers indicou que, em 2012, os clubes europeus gastaram US$ 4 bilhões em reforços. Mas apenas 20% desse dinheiro foi para a América do Sul, o maior fornecedor de craques. De fato, a realidade não afeta apenas o Brasil, mas toda a América do Sul. A região, em 2013, já vendeu ao mundo quase dois mil atletas. 

Negociações muito lucrativas, como a de Neymar junto ao Barcelona, são exceção Foto: Josep Lago/AFP

Para economias relativamente pequenas da região, mesmo esses valores são significativos. Em 2013, os argentinos exportaram US$ 228 milhões em jogadores, um quarto do valor de sua venda de carnes ao mundo. 

O Uruguai obteve uma renda com jogadores que foi superior às suas exportações de peixe. No Equador, a venda de craques gerou o mesmo valor que as exportações de café. 

Valorização. Mas é mesmo nas transferências entre clubes europeus que esses jogadores ganham um outro valor de mercado. Um estudo realizado pelo professor da Universidade de Limoges, Jean François Bourg, sobre a economia política do esporte profissional revela que, uma vez na Europa, um jogador africano é vendido a outro clube europeu em média por 20 vezes o preço que lhe foi pago para sair de seu país de origem e viajar até o continente europeu. 

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O zagueiro Thiago Silva foi comprado pelo Milan que pagou ao Fluminense cerca de 10 milhões de euros. Quando o clube italiano vendeu o defensor ao PSG, ele já valia 41 milhões de euros. 

O Porto, nesse sentido, se transformou em um paradigma de como valorizar um craque comprado por um preço baixo. Quando o time vendeu Ricardo Carvalho para o Chelsea em 2004, o zagueiro Pepe, brasileiro naturalizado português, foi trazido do Marítimo por 2 milhões de euros. Quando foi vendido ao Real Madrid, seu valor chegou a 30 milhões de euros. Com o atacante Hulk, a história não foi diferente. O Porto o comprou por 5,5 milhões de euros. Mas o vendeu por 60 milhões ao Zenit, da Rússia. A multiplicação de euros engorda os cofres dos clubes da Europa e deixa à míngua os brasileiros.

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