Campeonato Brasileiro vive crise técnica

Excesso de simulações e de reclamações ajuda a explicar fenômeno na comparação com os principais campeonatos do mundo

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Por Mateus Silva Alves e Raphael Ramos
3 min de leitura

No dia 13 de julho, o Maracanã recebeu o último jogo da Copa do Mundo do Brasil, a agônica vitória da Alemanha por 1 a 0 sobre a Argentina, placar que deu aos europeus o seu quarto título mundial. Três dias após a emocionante decisão, sem tempo para qualquer espécie de reflexão, 14 equipes entraram em campo para iniciar a décima rodada do Campeonato Brasileiro. E o contraste foi escandaloso. Parecia que um outro esporte estava sendo disputado nos gramados do País. Um esporte muito pior.

Se o Mundial agradou pela busca constante pelo gol e pelo jogo fluído e dinâmico – poucas partidas do torneio não se encaixaram nesse padrão, típico dos campeonatos europeus –, o Brasileirão assusta pela ausência do que foi visto nos 12 estádios que receberam jogos da Copa. Partidas truncadas, com muitas discussões e pouca bola rolando, são a regra na competição nacional. Na primeira metade do clássico entre Santos e Corinthians, há duas semanas, a bola rolou por menos de 40% do tempo, um escândalo. Se alguém foi à Vila Belmiro esperando ver uma partida bem jogada, teve motivos para pedir o dinheiro de volta.

No mesmo dia, Internacional e Grêmio se enfrentaram no Beira-Rio e não foram necessários mais do que 40 segundos para que o primeiro empurra-empurra surgisse, para desespero de quem desejava simplesmente assistir a um bom espetáculo. Não haveria maiores problemas se essas duas partidas pudessem ser chamadas de exceção, mas elas não podem. Os números, aqueles que não mentem, mostram que o Campeonato Brasileiro está muito atrás das principais competições do planeta. Ou melhor, está à frente, se o critério analisado for a média de faltas por jogo. Até a rodada do último fim de semana, a marca do Brasileirão era de 34,01, bem superior aos números dos campeonatos europeus, além da Copa do Mundo e da última edição da Copa Libertadores da América (confira os números na arte ao lado). Em compensação, quando se passa para o quesito tempo de bola rolando o torneio despenca da liderança para a lanterna como em um passe de mágica.

Quando se fala em crise no futebol brasileiro – e tem se falado muito nisso desde os famosos 7 a 1 que a seleção levou da Alemanha na Copa –, todos logo pensam nos péssimos cartolas, no calendário bagunçado, nos estádios vazios... Tudo isso tem machucado muito o futebol brasileiro, mas quem pisa nos gramados dos quatro cantos do País também faz parte do problema. Se os jogos no Brasil são quase sempre feios, é também porque os jogadores parecem mais preocupados em enganar o árbitro e intimidar o adversário do que em buscar o gol. É como se um mergulho na área valesse mais do que um belo passe, como se uma peitada em um oponente fosse mais bonita do que um drible.

“Muitas vezes vemos o jogador levar um tapa no braço e colocar a mão no rosto”, testemunhou Carlos Eugênio Simon, árbitro com atuação em três Copas e atualmente ocupando a função de comentarista de arbitragem. “É preciso uma mudança cultural para diminuir o número de faltas e simulações.”

A expressão “mudança cultural” não está no discurso de Simon por acaso. Para ele, os jogadores brasileiros deveriam assistir com atenção aos jogos dos torneios europeus para começar a reproduzir o padrão de comportamento exibido do outro lado do Atlântico. “Na Europa não tem só santinho, mas é característica do jogador brasileiro a todo momento buscar o contato e a simulação. Aqui, você entra em campo com 22 jogadores tentando te enganar.”

Agora que o problema foi devidamente apresentado, é conveniente dar atenção às explicações dos protagonistas dos “espetáculos”. Entretanto, a julgar pelo que dizem jogadores e treinadores das equipes brasileiras, simplesmente não há problema algum. Como se fosse mais conveniente manter as aparências, usa-se como um mantra o discurso de que tudo vai bem no Brasil e que temos um ou outro jogo ruim, como em qualquer lugar do mundo.

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“Acho que melhorou a marcação e isso fez com que os jogadores mais técnicos tivessem mais dificuldades. É normal ter uma queda, mas não acho que seja tanto assim”, disse o zagueiro palmeirense Lúcio. “A gente sempre procura fazer o melhor, mas o melhor não agrada a todo mundo. Se você acompanhar outras ligas, verá que há jogos bem piores do que os nossos”, afirmou o volante corintiano Elias.