Categorias de base temem que pandemia prejudique a formação de jovens jogadores

Interrupção de treinos causada pelo coronavírus atrapalha evolução tática e técnica das revelações

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Por Ciro Campos
5 min de leitura

O atacante Giovani Felippi, de 19 anos, está preocupado com o quanto a paralisação do futebol pela pandemia do novo coronavírus pode prejudicar o desenvolvimento dele como jogador profissional. Atleta da base do Atlético-MG e às vésperas de terminar o ciclo de formação, ele teme que a interrupção do calendário o faça perder tempo de aprendizado e até desperdice oportunidades para ser promovido ao elenco principal.

A insegurança enfrentada por Giovani se repete em outras centenas de garotos brasileiros com menos de 20 anos, idade limite dos atletas antes de virarem profissionais. O coronavírus forçou os clubes a interromperem todos os trabalhos e levou os futuros profissionais a perderem tempo de formação. "A parte física e tática ainda conseguimos amenizar devido às atividades aplicadas pelo clube, mas a parte técnica com certeza será mais prejudicada", disse o atacante do Atlético-MG.

Seleção brasileira sub-15: com a pandemia, garotos em formação perdem tempo para evoluir Foto: Lucas Figueiredo/CBF

O Estado conversou com treinadores e gestores especializados em categorias de base para entender o quanto a paralisação do futebol prejudica inclusive muito mais os garotos do que os profissionais. "As (categorias) menores ainda estão em um processo inicial. As ideias coordenativas, técnicas e táticas ainda não estão consolidadas. Eles ainda vão perder muito, vão se atrasar neste aspecto", disse o treinador do sub-20 do Bahia Carlos Amadeu, ex-técnico da base da seleção brasileira. "Teremos uma perda sem precedentes", completa.

Os clubes demonstram preocupação com o impacto psicológico da paralisação, em especial para quem está no processo final das categorias de base. "O relógio vai correndo agora. O menino de 20 anos está com um tempo menor de exposição porque ele está parado há seis semanas", explicou o técnico do sub-20 do Fluminense, Eduardo Oliveira. Quem atua no sub-20 perde a chance de disputar um calendário anual que passa até de 60 jogos por ano. Boa parte dos compromissos têm transmissão TV e representam uma vitrine.

Giovani Felippi, do Atlético-MG, faz trabalhos em casa para compensar a falta de calendário Foto: Divulgação/Atlético-MG

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Já para os meninos mais jovens, a paralisação tem gerado a preocupação dos times até sobre o acompanhamento do processo de crescimento. Em geral, as equipes costumam monitorar esse aspecto principalmente em meninos de 14 a 17 anos, pois em poucos meses o atleta dessa faixa etária ganha estatura e precisa ser submetido frequentemente a avaliações que servem para nortear o cronograma de treinos físicos.

"Os meninos crescem muito rápido entre 14 e 17 anos. Se não tiver um treinamento adequado e um bom aproveitamento, pode comprometer. É preciso ter um trabalho individualizado e um acompanhamento fisiológico e na parte de fisioterapia", afirmou o consultor das categorias de base do Fortaleza, José Carlos Brunoro.

SOLUÇÕES

Os clubes brasileiros têm procurado minimizar os problemas causados pela paralisação com orientações por vídeo. O Atlético-MG passa treinos e cartilhas de leitura aos garotos. A diretoria fez um grande esquema logístico para tirar mais de 91 meninos do alojamento em Vespasiano (MG) e mandá-los de volta para casa logo no começo da quarentena. Giovani Felippi, por exemplo, está em Batayporã (MS) e precisa enviar ao treinador o relatório do cumprimento das atividades.

Elenco sub-20 do Botafogo: última etapa da categoria de base é a que mais sofre com a paralisação Foto: Vitor Silva/Botafogo

"Os garotos estão amadurecendo à força, porque voltam para casa e muitas vezes para uma outra realidade. Muitos deles têm famílias em condição socioeconômica complicada e agora enfrentam condições de vida e de alimentação inferiores às que encontram quando estão morando na Cidade do Galo", disse o coordenador da base do Atlético-MG, Júnior Chávare.

Na opinião de Chávare, quando for possível o retorno da base ao trabalho, será preciso analisar a modificação do calendário para poder conciliar inclusive o futebol com a possível reacomodação de aulas para quem está em idade escolar. "Alguns campeonatos terão de ser sacrificados para ter uma outra organização. É importante não prejudicar quem está estudando", afirmou.

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Eduardo Oliveira, do Fluminense, já dirigiu o sub-17 e agora comanda o sub-20 do clube Foto: Mailton Santana/Fluminense

TRÊS PERGUNTAS PARA...Eduardo Oliveira, técnico do sub-20 do Fluminense

1. A paralisação afeta mais a parte tática ou técnica de um garoto?

Não dá para se dividir em dimensões. O que falta para eles é a vivência, seja de jogos ou de treinos. Independentemente de qual dimensão estamos estimulando. O futebol engloba todos esses atributos. Temos de entender a gravidade do momento.

2. Quando houver o retorno, será que o desenvolvimento dos jogadores terá regredido?

Vamos precisar ter uma avaliação pessoal e em grupo, assim como ver o nosso calendário e fazer um planejamento. Certamente não estaremos no mesmo estágio quando a gente parou. Vamos ter de dar um passo atrás em toda a preparação.

3. O quanto você acha que seu time ficará enfraquecido?

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Estamos há seis semanas parados. Com certeza teremos de entender qual será o efeito disso para cada de jogador por causa das diferentes bagagens que cada um tem. Tenho jogadores que chegaram agora para mim, que jogaram a Copa São Paulo e estavam no início do processo, se acostumando à nossa filosofia.