
28 de maio de 2016 | 17h00
Os Estados Unidos têm um objetivo bem maior do que celebrar o centenário da Conmebol na Copa América que começa na próxima sexta-feira. Mesmo porque nem filiados à entidade eles são. Ao decidirem hospedar o torneio, os americanos olham dez anos para a frente. O real alvo é a Copa do Mundo de 2026.
Voltar a organizar um Mundial, após sediar o torneio em 1994, tornou-se ponto de honra para os americanos. O futebol tem crescido muito no país, com ligas organizadas e que já se mostram lucrativas, bom público nos estádios – a média da Major League Soccer em 2015 foi de 21.638 pessoas por jogo. Enfim, tem se mostrado um bom negócio em potencial.
'Quartel-general' artístico para a seleção
Esse olhar comercial foi fator decisivo para os Estados Unidos insistirem em promover a Copa América Centenário mesmo depois de estourar o escândalo de corrupção envolvendo vários cartolas e empresários ligados à Fifa e à Conmebol. Os desmandos que levaram à prisão (hoje domiciliar) nos EUA de dirigentes como o ex-presidente da CBF José Maria Marin, entre outros, colocaram a realização da competição em risco. Mas os americanos resistiram e decidiram promovê-la.
A intenção é lembrar ao mundo o que todos já sabem. O país tem capacidade de organização, infraestrutura, estádios modernos, rede hoteleira supereficiente. E também garantias econômicas, item cada vez mais caro à Fifa, depois dos percalços nas organizações das Copas da África do Sul (2010) e Brasil (2014). "Podemos sediar uma Copa do Mundo com relativa facilidade", garante o presidente da Federação americana, a USSoccer, Sunil Gulati. "Nós podemos fazê-la à noite."
A parte final da declaração é uma calculada estocada na Fifa. Isso porque os EUA perderam a disputa pela Copa de 2022 para o Catar numa votação marcada por indícios de fraudes e que colocou vários cartolas na mira da Justiça na Suíça. E o país do Oriente Médio, como se sabe, sofre com as temperaturas, a ponto de ter de construir estádios climatizados para poder receber o Mundial.
INIMIGOS
Mas os Estados Unidos não são a barbada que parecem para 2026. Enfrentam dois inimigos, um externo e outro interno. Do lado de fora do país vem a concorrência, pois México, Canadá e Colômbia demonstram interesse em sediar o Mundial daqui a 10 anos. Internamente, o problema é o público. O futebol que o americano gosta é o seu, com touchdowns, fields goals e afins. O "soccer" dizem, é coisa de latinos.
De fato, em Los Angeles, apesar da presença da seleção brasileira e de estar perto de onde a seleção norte-americana vai estrear (sexta-feira, dia 3, contra a Colômbia, em Santa Clara), pouco se fala de Copa América. Há mais interesse nas 500 Milhas de Indianápolis, que ocorre neste domingo, nos jogos de beisebol e pela NBA. A competição é promovida basicamente por outdoors colocados em alguns pontos e pelos canais de TV de língua espanhola.
"Nenhum americano falou comigo até agora sobre Copa América", disse na quarta-feira ao Estado Eduardo Bacil, o Anjinho, ex-jogador e hoje professor de vôlei de praia, radicado há cerca de duas décadas em Los Angeles.
A ameaça externa talvez seja mais real. O México, por exemplo, quer sediar a Copa pela terceira vez. E já há ideias, como a de americanos e mexicanos promoverem o Mundial em conjunto. Um dos defensores dessa hipótese é o próprio presidente da Fifa, Gianni Infantino.
A possibilidade de compartilhamento já criou encrenca entre os cartolas dos Estados Unidos. Recentemente, John Motta, conselheiro da USSoccer, revelou-se simpático à tese. "Falamos com nossos colegas mexicanos e são muito abertos à ideia de uma candidatura conjunta. Pode ser um movimento positivo para ambos os países", disse. Logo depois a federação reagiu, dizendo que tal hipótese não está sendo discutida.
Sunil Gulati espera contar com o apoio e a visão de Infantino. "Ele conhece muito bem as nuances do mercado americano", disse. O cartola só teme que os países com dirigentes que estão sendo investigados e punidos por corrupção nos EUA se recusem a votar no país. Por medo ou vingança.
PARA LEMBRAR
Há 22 anos os Estados Unidos sediaram a Copa do Mundo. O Brasil foi campeão ao vencer a Itália nos pênaltis. O futebol do país ainda engatinhava e alguns jogadores da seleção exerciam outras atividades. A Copa foi sucesso de público. Média de 68.991 pessoas por partida, até hoje a maior da história dos Mundiais. Mas enfrentou polêmicas e reclamações. Um dos motivos de chiadeira foram os jogos marcados para o meio-dia em cidades em que, por ser verão, a temperatura superava 40ºC nesse horário. No jogo entre Alemanha e Coreia do Sul, em Dallas, os termômetros registraram 46ºC.
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