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É diferente. E incomoda

A forma com que Sampaoli faz o Santos jogar escancara a pobreza dos nossos técnicos

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Por Mauro Cezar Pereira
Atualização:

O Santos foi eliminado precocemente da Sul-americana pelo modesto River Plate. O elenco do clube uruguaio está avaliado em aproximadamente 5% do valor de mercado do grupo de jogadores santistas. O resultado teve repercussão, claro, não era para menos, mas ao contrário do que se vê em situações assim, nada raras nos últimos anos, o enfoque foi mais profundo. Fracassos da equipe são vistos por muitos como sinal de ineficiência do estilo que Sampaoli colocou em prática poucas semanas depois de chegar. Ao contrário do jogo reativo, que impera no futebol jogado no Brasil, seu time atua com posse, ataca, busca o gol e luta pela recuperação da pelota imediatamente após perdê-la.

Uma proposta diferente da que vemos mais frequentemente. A das equipes que se fecham, deixam a bola para o adversário, como se ela fosse um problema, e reagem rapidamente em forma de contra-ataques, com várias esticadas para os atacantes e chutões.

Mauro Cezar Pereira é colunista doEstado. Foto: Hélvio Romero/Estadão

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Num ambiente no qual quase todos se apresentam assim, independentemente de orçamento e nível técnico do elenco, o surgimento de novidades incomoda.

Sim, causa desconforto a quem não é capaz de mudar tal cenário e depende de um estilo monotemático, pobre de ideias, sem ações ofensivas elaboradas, incapaz de ter a bola por muito tempo. Daí a eliminação do Santos ser bem recebida em determinados setores. Para quem não consegue fazer diferente, quanto menos inovações por aqui, melhor. Vivem e sobrevivem da mediocridade futebolística nacional.

Fora o tropeço monstruoso ante o River do Uruguai, o time comandado por Sampaoli tem a melhor campanha no Campeonato Paulista. Fez 22 pontos em 27 possíveis, tem o melhor ataque, com 19 gols, e o saldo mais amplo: 11. A defesa ficou comprometida pela desastrosa atuação contra o Ituano, quando levou cinco dos oito tentos sofridos em nove partidas. Outra derrota que deixou eufóricos os adeptos da mesmice.

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O Santos finalizou 147 vezes em nove jogos, média superior a 16, enquanto o Corinthians, com menos da metade dos gols do time de Sampaoli (8), arrematou em 88 oportunidades – não chega a 10 por aparição. Se o campeão do Brasil em 2017, Fábio Carille, recomeça quase do zero, o argentino chegou ao País poucos dias antes de sua primeira partida oficial. Para quem é mais difícil?

A forma como o estrangeiro conseguiu, instantaneamente, fazer do Santos um time competitivo, com jogadas coletivas, e muitos gols, escancara a pobreza dos trabalhos desenvolvidos pela maioria dos treinadores brasileiros em atividade. É como se Sampaoli mandasse às favas desculpas tão comuns dos nossos “professores”, como falta de tempo para treinar e calendário pesado. Ele mostra que é possível fazer mais.

Os resultados não são os melhores possíveis, como o tropeço diante do River Plate uruguaio mostrou, mas o que se vê em campo na maioria das partidas é uma equipe promissora. Sem o melhor elenco e sofrendo baixas após a chegada do técnico, como a venda de Bruno Henrique ao Flamengo. Ainda assim acerta 427 passes por jogo, média bem superior à do mais rico elenco, o Palmeiras de Luiz Felipe Scolari, atual campeão brasileiro, com 355.

O “gringo” consegue fazer, no mesmo campeonato, com que sua equipe finalize mais e melhor do que o time dirigido pelo colega campeão nacional em 2017. Também faz com que ela fique mais tempo com a pelota e acerte mais passes do que o rico conjunto do que ergueu o troféu da Série A no ano passado. Se os técnicos brasileiros pedem tempo, vamos dar alguns meses a Sampaoli. Será interessante ver o que ele poderá fazer.

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