12 de abril de 2020 | 04h30
Felipão está no Rio Grande do Sul, num condomínio na praia de Capão da Canoa. Ele e a mulher, dona Olga. Os filhos se dividem no Brasil e em Portugal, onde vai chegar mais uma netinha. Sem trabalhar desde que deixou o Palmeiras, em setembro de 2019, o treinador participa de reuniões com sua equipe, Paulo Turra e Pracidelli, para aprimorar as coisas do futebol, desenvolver ideias táticas e técnicas para quando voltar para a beira do gramado. “Provavelmente fora do Brasil”, disse ao Estado sem entrar em detalhes. Aos 71 anos, não pensa em parar.
Ele diz já ter visto a final de 2002 algumas vezes, mas vai estar na audiência hoje. Se conseguir, vai ligar para jogadores.
Sua preocupação, no entanto, está na pandemia do novo coronavírus. Ele está quietinho em casa e fazendo caminhadas no condomínio, sem abusar. "Temos de ficar em casa. Não esmoreçam contra essa doença. Isso é o mais importante de tudo nesse momento. Todos nós devemos nos cuidar e seguir as orientações dos profissionais da saúde", comentou o treinador.
Fará um comentário hoje para a Globo, em que comenta aquela decisão com a Alemanha. Em 2014, ele voltou a enfrentar o time europeu numa Copa e perdeu. Ao Guardian, disse que "foi o maior desastre da seleção. Perdemos para nossos erros".
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Robson Fernadjes|AE
Em entrevista ao 'Estado', técnico do penta conta detalhes daquela conquista e do profissionalismo do Fenômeno
Atualizado
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A Copa do Mundo de 2002, cuja final entre Brasil e Alemanha será transmitida na Globo neste domingo de Páscoa depois de 18 anos, resgatou a confiança e a carreira de um dos melhores jogadores do planeta, o atacante Ronaldo. Ainda na Inter de Milão, seu joelho direito estava em frangalhos quando se apresentou. Héctor Cúper, técnico do time italiano à época, concordou em liberá-lo mais cedo para a seleção a fim de ele cumprir o plano de voo para sua recuperação. "Ronaldo acreditou na gente, fez tudo o que se pediu a ele e foi um dos melhores da Copa", disse ao Estado o técnico Luiz Felipe Scolari, que dirigiu o time na Coreia do Sul e Japão.
"Ronaldo também sabia que aquela era sua chance de se recuperar fisicamente, de o mundo voltar a acreditar no seu talento com a camisa 9", disse. E assim foi. Ronaldo (desculpe o spoiler) marcou dois gols na decisão do Mundial de 2002 contra a Alemanha, foi eleito naquele mesmo ano, pela terceira vez, o melhor jogador do mundo e se transferiu para o Real Madrid, onde ficou até 2007, fez 177 jogos e marcou 104 gols. O jogo hoje será mostrado às 16h.
Ao Estado, Felipão contou que teve de tomar medidas importantes na formação do grupo, uma delas foi não levar Romário, aclamado por boa parte dos brasileiros. Ele chegou a essa conclusão após a derrota do Brasil por 1 a 0 para o Uruguai, em Montevidéu, em sua estreia ainda nas Eliminatórias. "Romário não foi bem em campo e ainda tivemos problemas de relacionamento com atletas." Apesar do grande pedido popular, o Baixinho não foi convocado.
O treinador disse que sua maior preocupação era "fazer a seleção brasileira jogar bem, reconquistar o carinho da torcida e fazê-la acreditar de novo no time e ainda recuperar o respeito dos rivais". Parece inevitável a comparação desse cenário do Brasil em 2002 com o que vimos 18 anos depois com o técnico Tite, agora ele comandante da seleção.
Há uma geração de brasileiros que não viu aquele time jogar. "Rivaldo era um dos nossos craques. Ele jogou demais. Fez coisas que não faria em situação normal. Contra a Inglaterra, quando Ronaldinho Gaúcho foi expulso, Rivaldo recuou para o meio e fez duas ou três funções", ressalta Felipão. "E olha que o Barcelona queria operar o joelho dele antes da Copa. Foi o Runco (José Luiz, médico do Brasil) que não deixou."
Contra os ingleses, o mesmo Ronaldinho, hoje em prisão domiciliar no Paraguai por uso de passaporte falso, fez um gol sem querer que ele sempre disse ter sido proposital. Ele cobrou falta e a bola morreu nas costas do goleiro Seaman. "Ele conta que foi por querer, mas a mim ele não engana", brinca Felipão que garante ainda ter contato com todos os jogadores e lamentou a fase do amigo.
Naquela Copa, a seleção jogou com três zagueiros, incomum ao futebol brasileiro. "O Geninho, técnico do Atlhetico-PR na ocasião, me convenceu de que era seguro e melhor. Então, tínhamos o Roque Júnior, que fazia cobertura como poucos. O Edmilson, que atuou de volante no São Paulo, e o Lúcio, que ia bem quando conseguia dominar a bola", lembra Felipão. Até com o imprevisível, o treinador do penta diz ter contado. Comentou isso ao se recordar da contusão do volante e capitão Emerson às vésperas da estreia com a Turquia. Ele se machucou brincando de goleiro num aquecimento. "Optei pelo Gilberto Silva e ele fez uma ótima Copa."
O Brasil passou por Turquia, Costa Rica e China na primeira fase. Nas oitavas, bateu a Bélgica por 2 a 0 – os belgas eliminaram a seleção de Tite no Mundial da Rússia em 2018. Para Felipão, aquele foi o jogo mais duro em 2002. "A Bélgica não tinha nada a perder. Era considerado um time frouxo, tranquilo e que ninguém acreditava. Mas jogou muito bem contra a gente."
O Brasil passou a ser chamado de 'família Scolari'. Não foi Felipão que inventou isso. Ele diz que saiu da imprensa, com quem revela ter tido boas resenhas durante a competição. Ele tentou fazer o mesmo em 2014, na Granja Comary, no Rio, antes da derrota para a Alemanha, mas não conseguiu. "Em 2002, o ambiente era mais divertido, até unido. Parecia que todos estavam no mesmo barco", comentou.
Nas imagens da Globo hoje, o torcedor vai se deparar com um Felipão mais jovem e magro, mas com o mesmo espírito competitivo que o caracteriza. Ele tinha carinho especial por Marcos. O goleiro trabalhou com ele no Palmeiras e ambos se conheciam bem. Marcão ganhou a preferência entre Dida e Rogério Ceni. "Eram três excelentes goleiros. O Marcos tinha receio de errar. E foram os colegas mais agitados, como Luizão, Vampeta e Edilson, que trataram de deixar o Marcos mais seguro. Com as brincadeiras, tiraram o receio dele." Marcos só não foi eleito um dos melhores do torneio na posição porque no time alemão havia Oliver Kahn, um arqueiro de gelo e com cara de metido. "Era gente boa demais. Depois nos aproximamos em outros eventos e ele era um cara doce, tranquilo", comentou Felipão.
Ronaldo jogou com um corte de cabelo imitando o Cascão, personagem da Turma da Mônica, de Maurício de Souza. Fez isso para tirar a atenção de sua condição física, que foi crescendo ao longo da competição. O treinador ressalta que o Brasil chegou confiante para a decisão. Havia vencido todas as seis partidas antes. "A Alemanha teve duas boas chances antes da gente. Era um bom time." Ronaldo deixou para o último ato sua grande ópera, aquela que o recolocaria entre os melhores de novo. Fez dois gols com a ajuda de Rivaldo. Felipão, após a conquista, curtiu a vida por seis meses e aceitou convite para comandar Portugal.
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