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Investigação suspeita que compra de votos também atingiu América do Sul e Ásia

Inquérito ainda vai tentar determinar papel de uma conta na Suíça, em nome de Nuzman

Por Jamil Chade
Atualização:

GENEBRA – Investigadores apuram suspeitas de que a candidatura do Rio de Janeiro para sediar os Jogos Olímpicos de 2016 não se limitou aos votos africanos e que uma operação de maior dimensão foi realizada para garantir o apoio principalmente da América do Sul e da Ásia. A apuração, a partir de agora, também vai questionar o motivo pelo qual dados de uma conta na Suíça foram encontrados na casa de Carlos Arthur Nuzman, no momento em que a polícia realizou uma operação.

Nesta semana, as procuradorias do Brasil e da França agiram de forma coordenada para realizar uma operação de busca e apreensão, envolvendo a cúpula da Rio-2016. Na denúncia inicial, uma reunião em Abuja, em julho de 2009, foi apontada como um dos locais onde haveria ocorrido o pagamento de propinas.

Carlos Arthur Nuzman comanda o COB desde 1995 Foto: AFP

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Mas os votos africanos representavam cerca de 10% do total do colégio eleitoral do COI e, de acordo com informações coletadas nos últimos dias, as suspeitas apontam que a estratégia não se limitou à África. 

Ao acumular 66 dos 98 votos para conseguir ser sede dos Jogos, o Rio de Janeiro apostou principalmente nos países em desenvolvimento e nas economias do Leste Europeu. 

No governo, uma estratégia de “sedução” também foi criada para convencer votos a migrar para a cidade brasileira. No Itamaraty, um departamento foi criado exclusivamente para oferecer cooperação no setor esportivo, com o aporte de financiamento para programas, envio de material e mesmo de treinadores. Na semana da votação, diplomatas que cuidavam dessa área em Brasília foram transferidos para Copenhague, local da escolha em 2009.

Agentes que participaram da operação admitem que coletaram “muita coisa” e que Nuzman não parecia estar esperando que fosse surpreendido por uma busca. Com o caso já em andamento na França, investigadores acreditavam que o dirigente poderia ter destruído ou escondido parte da informação. Mas não foi o que ocorreu. 

“Acreditamos que a compra de votos foi geral. Mas começaremos a ter mais certeza com a análise da documentação apreendida”, disse um dos investigadores.

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PERU

As novas pistas ampliam a tensão entre os membros do COI que, a partir da semana que vem, estarão em Lima para o Congresso Anual da entidade. Investigadores admitiram ao Estado que vão acompanhar de perto quais membros eventualmente não viajarão, temendo ser questionados ao desembarcar no Peru, um país que vem mantendo uma estreita cooperação judicial com o Brasil.

“O timing da realização da operação no Rio dias antes do evento em Lima não ocorreu por acaso”, admitiu um dos envolvidos no caso. Fontes entre os procuradores lembraram que a polícia da Suíça e o FBI usaram justamente o Congresso Anual da Fifa, em Zurique em 2015, para realizar prisões. 

SUIÇA

Outro trabalho dos investigadores será o de apurar uma conta na Suíça, em nome de Nuzman. Os detalhes da conta teriam sido encontrados pela polícia, enquanto vasculhavam sua casa. 

O Estado apurou que um fluxo ainda importante de dinheiro passou pelos EUA e pelo Caribe, o que exigiu a cooperação da Justiça americana e da Grã-Bretanha. 

Nuzman insiste que não tem um salário como presidente do COB. Mas, em sua casa, mais de R$ 400 mil em quatro moedas diferentes foram encontradas. “O trabalho a partir de agora é o de seguir o dinheiro”, contou ao Estado um dos agentes implicados na operação. 

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O empresário Arthur Soares, apontado como a pessoa que teria bancado inicialmente a compra de votos, pode não ser o único do setor privado a atuar. A investigação se debruça no papel das construtoras que, diante da promessa de ganhar contratos para as obras, podem ter também contribuído com os pagamentos de propinas. Assim, nem as contas da Rio-2016, do COB ou dos governos estariam manchadas. 

Em troca, porém, essas empresas teriam recebido garantias de que seriam recompensadas com importantes contratos para as obras do parque olímpicos, de infra-estrutura e da remodelação de parte da cidade. 

“Certos empresários tiveram muita influência, até mesmo nas decisões sobre a infraestrutura dos Jogos”, apontou uma fonte envolvida na investigação. Segundo ele, não teria sido por acaso que a operação desta semana foi um braço da Operação Lava Jato, que nos últimos anos focou no papel de construtoras e suas relações políticas.

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