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Leão foi demitido no aeroporto

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Por Agencia Estado
Atualização:

Última chamada para o vôo 8837. A imagem desoladora de Emerson Leão numa das poltronas da área de embarque do Aeroporto Internacional de Narita parecia definitiva: ele está cabisbaixo, com uma das mãos sob o queixo. Instantes antes, acabara se ser comunicado de sua demissão pelo coordenador-técnico da seleção, Antônio Lopes. A reação de Leão foi de revolta contida. Desabafou, com palavrões, em tom pausado, e ouviu um conselho de Lopes. "Segura a onda para não fechar as portas." Leão não queria acreditar na possibilidade de ser afastado, apesar de todos os indícios da péssima campanha na Copa das Confederações e de alguns incidentes no Japão, um deles, o mais grave, quando calçou tênis de uma fornecedora de material esportivo concorrente da Nike, patrocinadora da seleção brasileira. O vôo 8837 da Varig (de Tóquio para o Rio, com escalas em Los Angeles e São Paulo) sairia de Narita às 19 horas locais (7 horas de Brasília). Vários jogadores e parte da comissão técnica chegaram cedo ao local, após viagem da cidade de Ulsan, na Coréia do Sul, onde o Brasil perdeu no sábado para a Austrália por 1 a 0. Leão desligou-se do grupo no domingo, seguindo para Tóquio com o preparador físico Bebeto de Oliveira. O técnico, porém, chegou sozinho ao aeroporto, 40 minutos antes da viagem. Trazia uma bolsa tiracolo e duas sacolas com compras no free shop. Não quis conversar sobre sua situação. Encontrou-se com Lopes à entrada do portão 12, onde embarcavam os passageiros do 8837. O coordenador levantou-se para cumprimentá-lo e o chamou para uma conversa no saguão do aeroporto no momento em que era feita a primeira chamada para o vôo. Às 18h25 (6h25 da manhã de Brasília), Leão era informado sobre a demissão. Inconformado, mas discreto, o treinador aceitou o convite de Lopes para tomar um café no bar Avion, bem em frente ao portão 12. Sentaram-se à mesa Leão, Lopes , o supervisor Mauro Félix e o assessor de imprensa da CBF, Carlos Lemos. Conversaram por mais 5 minutos. Do lado de fora, o treinador de goleiros, Pedro Santilli, Bebeto de Oliveira, o massagista Jorginho e o chefe da segurança, coronel Castelo Branco, aguardavam ansiosos o desfecho da reunião improvisada. Quando deixou o bar, Leão sentou-se primeiro ao lado de Santilli e de Bebeto. Enquanto isso, Lopes pedia a Lemos que reunisse os jornalistas brasileiros para "dar uma informação". Havia oito jornalistas no vôo, alguns já dentro da aeronave. Como não havia como juntar todos, Lopes disse que falaria somente no avião, mas deixou escapar a sentença. "Eu não podia comunicar a vocês antes de conversar com ele. Vocês me desculpem." Leão agora estava só, e a poucos metros daquele que o chamara para ser técnico da seleção havia oito meses e acabava de anunciar sua demissão. Embarcou calado, sentou-se na poltrona 6L da classe executiva num lugar próximo à janela, ao lado de Lopes. O avião decolou às 19h24 e o comandante do vôo, Gilberto Paes, pediu aos passageiros minutos depois que permanecessem sentados porque se aproximavam de uma área de turbulência. Um dos comissários de bordo revelou que Paes sabia da presença da seleção, mas que não quis lhe dar as boas-vindas por causa do vexame na Copa das Confederações. Os jogadores ainda não sabiam da demissão, mas a notícia vazou. Houve um misto de apreensão e de indignação. Vampeta comentou: "Se um dia eu for técnico da seleção, jamais vou abrir mãos dos melhores." Outro jogador da seleção disse: "Poxa, foi ele quem me chamou, e quem vem por aí me odeia." O zagueiro César foi manifestar solidariedade a Leão. Surpreso, também parecia não acreditar. "É verdade? Assim, no avião?" Leão viajou o trecho de Tóquio a Los Angeles circunspecto. Comeu apenas uma salada e assistiu a uma entrevista do cineasta Aníbal Massaini e a trechos do filme "Pelé, o atleta do século". Leu rapidamente o noticiário dos jornais brasileiros em sua edição de sábado. Mais cedo, durante seu dia em Tóquio, visitou o templo budista de Narita, a poucos quilômetros do aeroporto internacional. Comprou souvenirs e tirou fotos da construção milenar, onde rituais de oferta acontecem todos os dias e os símbolos de prosperidade estão espalhados por todos os cantos. Ao desembarcar em Los Angeles, permaneceu em silêncio.

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