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PSG vê frustração sem título europeu após R$ 7 bilhões em reforços e atrito com torcida

Desde que foi comprado pelo fundo de investimentos do emir do Catar, clube francês assumiu protagonismo nacional, mas segue sem conquistar o desejado título da Liga dos Campeões

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Foto do author Pedro Ramos
Por Pedro Ramos
Atualização:

O desespero no setor visitante da arquibancada era palpável faltando nove minutos para acabar a partida. Mas no minuto seguinte, o cenário se transformou. Atuando fora de casa, o Paris Saint-Germain conseguiu um gol "chorado" em um chute fraco do atacante Amara Diané para garantir a suada vitória por 2 a 1 sobre o Sochaux. Os três pontos garantiram que a equipe não fosse rebaixada no Campeonato Francês de 2008.

"Nós jogamos a partida das nossas vidas naquele dia. A pressão era intensa, mas curiosamente eu não senti ansiedade antes do jogo. Eu lembro até hoje do apito final. Parecia que a gente tinha sido campeão. As pessoas estavam chorando", relembra o zagueiro Mamadou Sakho à revista Four Four Two.

O presidente Nasser Al-Khelaifi ao lado de Lionel Messi durante apresentação do astro como novo jogador do PSG. Foto: Stephane de Sakutin AFP

A história do PSG não pode ser resumida como um time de constantes lutas contra o rebaixamento nem uma equipe acostumada a conquistar muitos troféus. Fundado apenas em 1970, o clube preencheu um vácuo no futebol parisiense deixado por times tradicionais como o Racing Paris e o Red Star, que tiveram destaque no passado, mas caíram no ostracismo. Equipes mais vencedoras como Saint-Etienne, Olympique de Marselha, único do país a ser campeão europeu, e Monaco deixaram sua marca na história com títulos e equipes marcantes. 

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O cenário se transformou em 2011 quando o Paris Saint-Germain foi comprado pela Qatar Sports Investments (QSI), fundo de investimentos do emir do Catar, Tamim bin Hamad Al Thani. A aquisição foi definida por especialistas como um exemplo de sportswashing, ou seja, o uso estratégico e político do esporte para melhorar sua reputação no mundo, escondendo ações negativas de governos.

Nos últimos 11 anos, a equipe parisiense pulou de dois para nove títulos do Campeonato Francês, além de garantir seis conquistas da Copa da França. Aos poucos, o PSG ficava mais forte, com cada vez mais estrelas, mas o título da Liga dos Campeões, considerado o grande objetivo do clube, escapava pelas mãos temporada após temporada.

Investimento pesado em contratações

Com um orçamento turbinado por um Estado, o PSG virou da noite para o dia uma máquina, pelo menos, de movimentar dinheiro no mercado do futebol. Hoje, o clube está avaliado em US$ 2,5 bilhões segundo a revista Forbes, ocupando a nona posição no ranking. Com uma injeção de 1,3 bilhão de euros (ou R$ 7,3 bilhões, valores não corrigidos) em reforços desde 2011, o PSG assumiu o protagonismo no futebol francês enquanto busca entrar de vez no grupo dos principais times da Europa. O investimento robusto, bem acima da grande maioria dos times, vem sendo motivo de críticas de todos os lados. A Uefa é acusada de aplicar uma fiscalização ineficiente e, por vezes, permissiva com a falta de transparência de vários clubes, incluindo o time francês. O Fair Play financeiro é um mecanismo criado pela entidade para evitar que os clubes gastem valores superiores aos que forem arrecadados em suas gestões e, consequentemente, consigam pagar suas contas em dia. Em 2014, o PSG foi punido por descumprir as regras e recebeu multa de 60 milhões de euros, além de restrição de inscrição de jogadores por uma temporada na Liga dos Campeões. O clube também foi acusado de driblar o regulamento em outros anos.

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Javier Tebas, presidente da LaLiga, que organiza o futebol espanhol, é uma das vozes que condenam o modelo do clube francês. "Critico o PSG porque ele não gera dinheiro para ter o elenco que têm. Isso distorce a concorrência na economia do futebol europeu. Não corresponde ao patrocínio real. Como o PSG nos explica que tem um elenco de quase 600 milhões de euros? Se vencer a Ligue 1 (Campeonato Francês), não ganhará mais de 45 milhões de euros. É impossível", afirmou ao jornal L'Équipe.

Na entrevista coletiva de apresentação de Lionel Messi, o presidente do PSG, Nasser Al-Khelaifi, defendeu o clube das aquisições de burlar as regras do Fair Play financeiro. "Quanto ao aspecto financeiro, vou deixar claro: conhecemos as regras do Fair Play financeiro e vamos sempre seguir os regulamentos. Antes de qualquer coisa, consultamos nosso pessoal comercial, financeiro e jurídico. Temos capacidade para contratá-lo. Se assinamos com Leo, é porque podemos, caso contrário não o teríamos feito."

Eliminações na Liga dos Campeões

Fim de ciclo? PSG estuda vender Neymar ao fim da temporada Foto: REUTERS/Benoit Tessier

O investimento pesado em estrelas virou prática comum no clube. A contratação bombástica de Neymar em 2017 foi um aviso ao mundo de que o PSG estava disposto a brigar com as principais equipes da Europa. Também pudera, o clube francês desembolsou 222 milhões de euros (aproximadamente R$ 822 milhões à época) para contar com o brasileiro, que buscava o papel de protagonista e mirava a conquista da Bola de Ouro. A transferência é, até hoje, a mais cara da história do futebol mundial. Neymar estava no Barcelona.

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O clube acertou também a contratação da então jovem sensação Kylian Mbappé, de apenas 18 anos, que se tornaria em pouco tempo um dos melhores jogadores do futebol mundial. Com a dupla, o PSG manteve a hegemonia nacional, com vários títulos, mas na Liga dos Campeões seguia com problemas. 

As cobranças internas e externas se acumularam temporada após temporada. Em 2019, o presidente do clube mandou um recado ao elenco dizendo que não aceitaria mais o comportamento de popstars e cobrou mais comprometimento da equipe. "Os jogadores terão de assumir suas responsabilidades ainda mais do que antes. Deve ser completamente diferente", afirmou o dirigente em entrevista à revista France Football

Na edição 2019/2020 da Liga dos Campeões, o PSG teve seu melhor resultado ao chegar à decisão contra o Bayern de Munique, mas acabou superado pelos alemães. O time ainda não conseguiu dar o salto que tanto sonhou – e investiu. A falta do título da Liga dos Campeões fez com que o troca-troca na vaga de técnico fosse uma prática regular. Foram seis treinadores de 2011 para cá.

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O presidente do PSG, Nasser Al-Khelaifi, vem sofrendo com protestos da torcida. Foto: FRANCK FIFE / AFP

Cada eliminação na competição é tratada como um fracasso e um aumento da pressão, especialmente, das arquibancadas. O comportamento muitas vezes agressivo da torcida não é recente. Por muito tempo, antes da chegada dos atuais donos, os torcedores do time parisiense ganharam as manchetes por cantos ofensivos, faixas provocativas e brigas entre seus próprios torcedores ou contra times rivais. Foram vários os episódios que mostraram como o clima pode ficar tenso.

Em 2020, 148 pessoas foram presas em Paris, segundo as autoridades, por brigas nas ruas, saques em lojas e cenas de vandalismo, após a derrota da equipe na final europeia para o Bayern. "A selvageria de certos delinquentes da noite passada: 16 membros das forças policiais, feridos, 12 lojas atacadas, cerca de 15 carros vandalizados", informou o ministro do Interior francês, Gerald Darmanin.

A impactante chegada de Lionel Messi para a atual temporada rotulou o PSG, novamente, como um dos grandes favoritos a todos os títulos. Mas o sentimento da arquibancada não era só de empolgação, apesar da contratação histórica do argentino. Em fevereiro, uma faixa de torcedores exposta em uma partida exigia a saída de dirigentes, incluindo o diretor esportivo Leonardo, com citação a Robespierre, personagem marcante da história do país por liderar um período de terror com muitas execuções. "Leonardo, Ribes, Pien, Rame, Allegre. Muitas cabeças inúteis! Robespierre, onde está você?!”.

Muro do CT do PSG amanheceu pichado com protestos contra a diretoria do clube Foto: Reprodução

Com o trio Neymar, Mbappe e Messi em campo, o PSG foi eliminado pelo Real Madrid nas oitavas de final da atual edição da Liga dos Campeões de forma dramática. A derrota gerou um novo protesto dos torcedores. Os muros do Estádio Parque dos Príncipes e do centro de treinamento do clube amanheceram com pichações ofensivas e cobrando novamente a imediata saída de Leonardo e Nasser Al-Khelaifi. 

"Dez anos de mediocridade", escreveram, revoltados. "Fiquem longe de nós, Paris nunca será o Catar", "sejam dignos" e "vocês nos deixariam orgulhosos (saindo)", deram tom aos protestos, sempre seguidos com muitos palavrões à dupla. Enquanto se recupera da eliminação, o PSG lidera o Campeonato Francês com 12 pontos de diferença para o vice Olympique de Marselha e volta suas atenções no planejamento para a próxima temporada, com o objetivo de, enfim, vencer a tão sonhada Liga dos Campeões. Mas muita coisa deve acontecer após a temporada.

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