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Pernambucanos sim, mas argentinos de coração

Na Buenos Aires brasileira, população 'vira casaca' e torce pela seleção de Messi

Por Angela Lacerda
Atualização:

Eles são minoria e enfrentam reação da população, mas fazem barulho e são responsáveis por tirar do anonimato o pequeno e pobre município de Buenos Aires, de 13 mil habitantes, na zona da mata pernambucana, a 80 quilômetros do Recife. Ali, um grupo de torcedores da Argentina se reunirá novamente hoje para assistir ao jogo contra a Bélgica, às 13h, pelas quartas de final da Copa do Mundo. Antes, às 11h, haverá um "esquenta", com um amistoso entre o Boca Juniors e o River Plate, no estádio municipal. Inspirados nos dois maiores times argentinos, os clubes locais foram fundados respectivamente por José Paulo Araújo da Silva, 33 anos, e Jadiel Felipe, 40. Adversários nos campeonatos locais, eles se unem quando se trata da seleção. O objetivo é o tricampeonato mundial. "Paixão não se explica", diz José Paulo, dono da locadora e loja "Boca Junior" e da rádio comunitária de mesmo nome. "Sou brasileiro, mas tenho coração argentino", resume. 

Luzivaldo Melo passou a torcer pela Argentina a partir de 1998 Foto: Roberto Pereira/Estadão

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José Paulo fundou o Boca Juniors da zona da mata pernambucana em 2001. Já havia uma pequena torcida argentina na cidade, mas silenciosa, oculta. Um dos pioneiros, Jadiel Felipe criou o River Plate depois, em 2007. A "explosão" ocorreu em 2010. "Foi na última Copa que essa paixão foi assumida e começou a chamar a atenção", afirma José Paulo, satisfeito por ter vendido rapidamente as 55 camisas da seleção argentina que dispôs na sua loja. "Não deu para quem quis, se eu soubesse tinha comprado mais."

Emancipado em 1963, Buenos Aires teve a origem do seu nome em 1887, quando um proprietário de engenho construiu uma capela em homenagem a São Benedito e batizou as terras com o nome do santo. Neste mesmo ano, o padre Manoel Gonçalves da Silva foi ao engenho e ficou encantado com o clima, que lhe fez bem à saúde. Ele havia visitado a Argentina e sugeriu o nome Buenos Aires - "bons ares". O dono acatou a sugestão e esta passou a ser a identidade do engenho, depois da vila e por fim, do município. Além de carregar o mesmo nome da capital argentina, cada um dos torcedores da cidade tem sua motivação pessoal. Jadiel passou a ter Diego Maradona como ídolo em 1986, quando o craque fez um gol com a mão e ajudou a Argentina a ganhar a Copa no México. Outros, como Irian de Oliveira, de 46 anos, reconhecem a influência da movimentação que passou a despertar a curiosidade nacional em relação à cidade. "Acho isto positivo e os jogadores argentinos têm muita raça". Pai de Lionel, um bebê de dez meses que ganhou o nome em homenagem ao craque argentino Lionel Messi, Luzivaldo Melo, de 32 anos, "virou a casaca" e passou a torcer pela Argentina depois da derrota brasileira na Copa de 1998, na final contra a França. Passou a torcer pela “garra” argentina. Está feliz com a escolha. A partida contra a Bélgica vai reunir a torcida na casa de Jadiel Felipe, onde o grupo se juntou para vibrar com a vitória da Argentina sobre a Suíça. Nova “vaquinha” vai garantir a carne de bode assado e a cerveja. 

"Eles estão secando o Brasil", relata o pai de Jadiel, o secretário municipal de Agricultura, Armando Felipe da Silva, 70 anos. "Assistem a todos os jogos da nossa seleção torcendo contra." Ele diz não entender o sentimento do grupo, mas respeita. "Cada um tem o direito de escolher o que quer." A decoração da cidade contemplou um lado da avenida principal, a Duque de Caxias, com bandeirinhas azuis e brancas, referência à Argentina. As verdes e amarelas, do lado oposto. A vice-prefeita de Buenos Aires, Ana Carolina Maranhão de Araújo (PSDB), que faz questão de se afirmar "torcedora da seleção brasileira", diz que a prefeitura respeita esse "diferencial". Buenos Aires vive do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), sofre com o desemprego e tem como principal atrativo o maracatu de baque virado. Na busca por atrair turistas, a prefeitura tenta incluir eventos como shows de tango ou algo ligado à gastronomia argentina. Os torcedores da seleção brasileira reclamam. "É muito negativo", diz Maria Lúcia dos Santos, 56, auxiliar administrativa. "É uma forma de ridicularizar a nossa cidade." O mototaxista Reginaldo Ferreira da Silva, vai além: "Se eu pudesse, mandava lá para a Argentina todos esses que torcem contra", brinca. 

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