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Polêmicas e escândalos marcam os quatro meses da morte de Maradona

Disputa envolve familiares, herança, acusação de uso de drogas, consumo de bebidas e investigação por suposto descaso médico de seus médicos

Por Toni Assis
Atualização:

Durante o tempo em que esteve na ativa dentro de campo, Diego Maradona encantou o mundo com seus dribles, arrancadas e gols geniais tanto pela seleção argentina quanto pelos clubes que defendeu. Sempre rodeado de 'amigos'. No entanto, passados quatro meses exatos da sua morte, o que norteia o noticiário sobre o craque argentino são polêmicas e intrigas dignas de um enigmático filme de suspense com direito a briga familiar, disputa por herança, acusação de uso de drogas, de consumo de bebidas e descaso médico. Tudo isso foi detonado a partir de vazamentos de áudios dos últimos dias de vida do camisa 10.

A descoberta expôs várias suspeitas que acabaram por iniciar uma investigação em torno da morte do jogador aos 60 anos. Maradona ainda não está em paz. Entre essas suspeitas, há a de negligência médica. Ele teria sido "abandonado" em seus cuidados antes da morte. Assim, a equipe de profissionais liderada pelo médico Leopoldo Luque, que operou Maradona semanas antes de sua morte, entrou na mira da Justiça.

Diego Armando Maradona morreu em novembro de 2020 Foto: Alejandro Pagni/AFP

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Luque é investigado por homicídio culposo. Mensagens vazadas entre ele e a psiquiatra Agustina Cosachov revelaram neste período zombarias do médico em torno do estado de saúde do camisa 10. "Sim, o boludo (gordo) parece que teve uma parada cardiorespiratória e vai morrer cagando. Não tenho ideia do que ele fez. Estou indo para lá", afirmou o neurocirurgião, em um dos trechos do áudio, de acordo com o site Infobae, da Argentina, e que está nas mãos da Justiça.

No dia 3 de novembro, Maradona havia sido internado para ser submetido a uma intervenção cirúrgica por causa de um coágulo no cérebro. Desde então, ele ficou sob os cuidados da equipe médica de Leopoldo Luque. Diante das circunstâncias, a Justiça argentina passou a investigar o caso com o objetivo de determinar se o astro recebeu os cuidados necessários e quais foram as circunstâncias de suas últimas horas até a morte. Tudo ainda é envolto a um grande mistério. Alejandro Cipolla, advogado do médico, disse em entrevista ao jornal Clarín que seu cliente estava sendo vítima de um julgamento social. "O que importa é o que acontece na Justiça e não no que a imprensa diz. Parece que a morte de Maradona precisa ter um culpado e que o Luque já recebeu a sentença", disparou. Entre os indiciados no caso da morte de El Diez, além de Leopoldo Luque, estão a psiquiatra Agustina Cosachov, a médica que coordenava o internamento domiciliário Nancy Forlini, o psicólogo Carlos Díaz e os enfermeiros Ricardo Almirón e Dahiana G. Madrid. Todos estiveram com Maradona nos seus últimos dias de vida. Ele morreu no dia 25 de novembro de 2020.

ÁLCOOL, MACONHA E CHARUTOS

Além da suspeita de negligência médica, outros componentes ajudam a apimentar o período pós-morte do argentino. Em outras conversas vazadas de Luque, apareceu o comentário de um outro médico sobre o consumo de álcool e maconha de Maradona após a cirurgia no cérebro, semanas antes de morrer em casa. "Tenho Monona (cozinheira de Maradona), que me conta as coisas. Exceto Monona e um segurança, estavam todos fumando. Hoje ele (Maradona) se levantou todo dolorido, com toda ressaca em cima. Ontem à noite, fumou e bebeu vinho com os comprimidos", disse um médico ainda não identificado no áudio durante conversa com Luque, de acordo com o mesmo Infobae

O álcool e os charutos foram dois vícios que acompanharam Maradona nos últimos anos de sua vida, quando se entregava ao trabalho de treinador de futebol e lutava para não se entregar à depressão. O astro também não era de seguir regras ou recomendações.  

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Maradona se levantou todo dolorido, com toda ressaca em cima. Ontem à noite fumou e bebeu vinho com os comprimidos

Leopoldo Luque, médico que operou Maradona semanas antes de sua morte

DOPING E SEXO

Quando todos pensavam que os escândalos envolvendo a vida de Maradona tinham atingido o seu ápice, novas revelações apontaram para mais episódios dessa natureza. O portal portenho Infobae e a TV América trouxeram à tona mais dados impressionantes sobre sua vida. Em áudios que integram, inclusive, a investigação judicial, o médico Luque contou que Charly, primo da última namorada de Maradona (Rócio Oliva) "apagava" o craque para levar mulheres para sua casa. Além de cerveja e maconha, ele dava ainda vinho com sonífero para o meia. Assim, o primo podia ter livre ação para levar mulheres e desfrutar com elas do conforto da mansão sem ser incomodado.

HERANÇA

Dalma, filha mais velha de Maradona, desabafou nas redes sociais Foto: Reprodução/Instagram

A disputa pela herança é outro ponto de discórdia. Embora não haja dados oficiais sobre o patrimônio de Maradona, o portal especializado Celebrity Net Worth informa que o craque ganhou ao longo da carreira R$ 2,6 bilhões em salários, prêmios e patrocínios. E continua a ganhar dinheiro como treinador. Em crise familiar e diante da fragilidade de sua saúde por causa dos excessos acumulados pelo uso de álcool e drogas ao longo da vida, o jogador passou a ver mais de perto o risco da morte. Tal impressão o fez gravar  um vídeo explosivo no Instagram, sobre oque pensava fazer com sua herança.

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"E digo uma coisa, eu não vou deixar nada para vocês, eu vou doar. Tudo que conquistei na minha vida eu vou doar", disse Maradona num recado direto às filhas Dalma e Giannina frutos do seu relacionamento com Claudia Vinafañe. Nas infância das filhas, Maradona as levava para as partidas de futebol e exibia suas meninas no colo. Fez isso algumas vezes com a camisa do Boca Juniors.

De acordo com o jornal Clarín, assim que o pai morrreu, as duas filhas deram entrada no processo para dividir os bens. O patrimônio de El Pibe está constituído por casas, carros luxuosos e ainda itens curiosos como um anel estimado em 300 mil euros (R$ 1,9 milhão). Os veículos arrebatados pelo craque chamam atenção. Desde o famoso caminhão com que chegava aos treinos do Boca Juniors, a um Rolls Royce de 300 mil euros (R$ 1,9 milhão). Tem ainda uma BMW de 145 mil euros (R$ 900 mil), fruto de um presente por sua passagem como técnico do Fujairah FC, clube dos Emirados Árabes. Os bens estão espalhados entre Buenos Aires e Dubai. Contratos de investimentos nos países onde ele viveu e trabalhou também fazem parte da fortuna do atleta.

De acordo com a legislação argentina, dois terços de tudo que foi amealhado deveriam ficar nas mãos dos herdeiros diretos do ex-jogador. Maradona tem cinco filhos reconhecidos: Dalma, Gianinna, Diego Júnior, Jana e Diego Fernando. Entretanto, tramitam na Justiça seis processos de paternidade: os cubanos Javielito, Lu, Johanna e Harold e os argentinos Santiago Lara e Magalí Gil.

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O eterno camisa 10 estava em um processo judicial contra sua ex-mulher Claudia Vinafañe. Os dois se divorciaram em 2003 e ela obteve o capital de gestão do patrimônio da lenda do futebol com a finalidade de preservar algo que pertencia também às duas filhas do casal. Na briga que os dois travavam na Justiça estava a apropriação de 458 objetos que faziam parte dos pertences do seu passado como atleta. Além dessa disputa judicial, Cláudia é acusada pelo advogado do marido de evasão fiscal.

QUARTO IMPROVISADO     

Diego Maradona e seu médico pessoal, Leopoldo Luque Foto: Reprodução
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Acostumado a morar em mansões durante sua carreira de jogador e treinador, Maradona passou seus últimos dias em uma casa fora dos padrões de cuidado dos quais necessitava. O imóvel tinha quatro quartos e banheiros privativos, mas Maradona, em função do seu estado de saúde frágil, tinha dificuldade de subir as escadas. A alternativa foi deixar o ex-jogador no piso inferior onde um cômodo foi adaptado como quarto, um com banheiro químico dentro. Seu corpo foi velado na Casa Rosada, a sede do governo da Argentina em Bueno Aires. Milhares de pessoas enfrentaram a pandemia naquele novembro para chorar a perda do ídolo. Muitos objetos com referência ao craque, como camisas da seleção e bandeiras, foram deixados ao lado do caixão.

ARGENTINO, MAS COM INSPIRAÇÃO BRASILEIRA

Maradona e Pelé durante evento em Paris, em 2016 Foto: Charles Platiau/Reuters

À medida com que foi se destacando nos gramados, a comparação com Pelé passou a ser coisa corriqueira nos noticiários esportivos. Mas foi um outro brasileiro, também canhoto e camisa 10 que inspirou El Pibe no futebol: Roberto Rivellino. "Uma pessoa muito especial na minha vida. Muito querida. O maior jogador da história da Argentina. Quando o Maradona me via, só queria falar comigo", manifestou-se o ex-corintiano em diversas oportunidades.

Apesar de ser argentino, ele sempre manteve laços estreitos com jogadores brasileiros. Esteve presente na partida que marcou a volta de Zico ao Flamengo em 1985. Anos mais tarde, voltou como convidado especial do Jogo das Estrelas, quando o evento ainda era realizado no Centro de Treinamento Zico (CFZ), no Rio.

Na Itália, o Napoli contou com uma dobradinha Brasil/Argentina para formar uma das maiores duplas de ataque do mundo. Ao lado do atacante Careca, Maradona conquistou uma Copa da Uefa, um Campeonato Italiano e também uma Supercopa da Itália. Com Pelé, trocou farpas ao longo de boa parte da carreira. Nos últimos anos, no entanto, os dois selaram a paz e trocaram elogios.

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COPAS: REBELDIA, APOGEU, GENIALIDADE E FIM MELANCÓLICO

Com quatro Copas do Mundo no currículo e duas finais disputadas, Diego viveu seu ápice em 86, no México. Naquele ano, levou a Argentina ao título e foi o grande nome da conquista com gols antológicos, como os dois marcados na vitória sobre a Inglaterra. Mas foi quatro anos antes, em 1982, que o caminho da seleção brasileira cruzou com Maradona dentro de campo pela primeira vez em Mundiais. Com 21 anos, ele acabou sucumbindo ao sair derrotado por 3 a 1 para o time de Telê Santana. Irritado, foi expulso por entrada violenta no volante Batista já no fim da partida. "Depois do jogo, ele me disse que queria pegar o Falcão, que estava mandando o time tocar a bola. Só que o Falcão é loiro e mais alto do que eu", afirmou Batista tempos mais tarde.

Em terras italianas, oito anos depis, a equipe de Sebastião Lazaroni pagaria o pato. Em jogo das oitavas de final, El Diez passou por Alemão e Dunga, envolveu mais dois defensores com uma jogada de corpo e rolou para Caniggia, livre, decretar a volta antecipada do Brasil com a vitória argentina por 1 a 0. Sua última aparição em Copas terminou de forma melancólica. Após cumprir 15 meses de suspensão entre 91 e 92 por uso de cocaína, o Mundial de 1994 seria seu retorno por cima.

Na estreia, contra Grécia, aos 33 anos, deixou sua marca em triunfo argentino por 4 a 0. Quatro dias depois, voltou a atuar nos 2 a 1 sobre a Nigéria, quando foi sorteado para o antidoping. A saída de mãos dadas com a enfermeira ainda no gramado acabou sendo o último ato do jogador em Mundiais, já que o resultado deu positivo para efedrina (substância usada em remédios para moderar o apetite).

PELA ESQUERDA, TAMBÉM NA POLÍTICA

Polêmico em campo, um dos canhotos mais habilidosos da história do futebol também demonstrou interesse no cenário político. Sua simpatia pelas ideologias de esquerda e a sua amizade com o presidente cubano Fidel Castro logo ganharam os holofotes. A identificação era tão grande que Maradona chegou a descrever o líder político como seu segundo pai e ainda tatuou a sua imagem na perna esquerda. Por ironia, o jogador acabou morrendo na mesma data que Fidel: 25 de novembro.

O venezuelano Hugo Chávez e o seu sucessor Nicolás Maduro também gozavam da amizade e simpatia de Dieguito. Com o ex-presidente boliviano Evo Morales, chegou a jogar um amistoso para apoiar o direito da Bolívia de mandar seus jogos na altitude de 3.600 metros de La Paz. O posicionamento político se estendeu ao Brasil. Em 2019, Maradona mandou uma mensagem de solidariedade ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por ter sido libertado após 19 meses de prisão.

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Maradona faleceu em novembro de 2020 Foto: Reuters

Números da carreira de Diego

680 jogos/ 345 golsSeleção argentina: 91 jogos / 34 gols

Títulos

Seleção argentina: Copa do Mundo de 1986Boca Juniors: Campeonato Argentino de 1981Barcelona: Copa do Rei - 1983 / Liga Espanhola - 1983 / Supercopa da Espanha – 1983Napoli: Campeonato Italiano: 1987 e 1990 / Copa da Uefa: 1990 /Supercopa da Itália: 1990

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