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'Senti medo de morrer. Passava um filme da morte do Serginho'

Atacante ex-São Caetano teve arritmia detectada logo após colega falecer e precisou ficar dois anos sem jogar

Por Ciro Campos e Diego Salgado
Atualização:

O atacante Fabrício Carvalho estava em campo pelo São Caetano na partida contra o São Paulo, em 2004, e viu o colega de time, o zagueiro Serginho, morrer depois de uma parada cardiorrespiratória. O jogador só não imaginava que três meses depois seria ele o foco das preocupações médicas do clube, ao apresentar uma arritmia em exames da pré-temporada de 2005, problema que lhe afastou dos gramados por dois anos. Ao retornar, precisou superar o trauma de ter perdido o colega, além do medo sobre suas condições físicas.

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Como foi enfrentar o período na carreira em que ficou afastado por problemas cardíacos?

Foi um período turbulento da minha carreira. Vivia um problema excelente antes e depois fiquei impedido de jogar por dois anos por conta de uma alteração exibida em um exame. Acredito que por ter sido depois do caso Serginho, tenha existido alguma influência, porque todo mundo fiquei meio ressabiado e receoso. Os times passaram a fazer exames mais rigorosos nos atletas. Por tudo o que ocorreu, time muitas dúvidas, sobre o caso do Serginho também, se ele sabia ou não desse problema. Infelizmente logo após essa fatalidade fiquei impedido de atuar, o que me deixou bastante preocupado. Isso me deixou em baixa, me prejudicou muito e fiquei triste demais, até pelo falecimento do Serginho. Lembro com alegria dos momentos que passamos juntos.

Você sentiu algo anormal no Serginho nos meses que antecederam a morte ou mesmo durante o jogo?

Pelo contrário. Ele tinha uma vitalidade acima do normal, jogava pelo grupo, honrava a camisa do São Caetano e a gente até se assustou muito da forma como ele veio a falecer, até pelo que ela era. Na parte física, nunca reclamou de nada, nem de nenhum treinamento, era muito dedicado. O que eu sei da questão clínica dele, é que fez um exame uma semana antes desse jogo e que nos foi passado por ele é que não houve nada de anormal. Depois surgiram algumas versões que alguns jogadores sabiam do problema dele, mas não participei de nenhuma reunião em que foi mencionado o problema dele.

Quando foi detectado o seu problema cardíaco?

Foi na pré-temporada, em janeiro de 2005. Fiz o exame e o médico me falou que houve um problema e precisaria repetir o exame, que foi feito no HCor. Daí repeti, foi constatada a arritmia. Foi melancólico para mim e durou dois anos a minha pausa. 

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Fabrício Carvalho durante jogo contra o Paysandu, em 2004 Foto: José Patrício/Estadão

Durante esses dois anos, como foi a sua rotina?

Eu me condicionei fisicamente, como os médicos sempre disseram. Fiquei inativo mesmo, comendo e dormindo, e repetia os exames a cada três meses. Foi assim durante mais de um ano. Sem nenhuma atividade física, desiludido totalmente. Depois comecei a achar estranho o meu caso, porque nenhum médico me disse com exatidão o que era e o que causava essa arritmia. Depois, procurei o Constantino Constantini, o mesmo médico do atacante Washington. Ele me indicou um médico em São Paulo, o Beny Schmidt. Não tenho nada a reclamar do São Caetano, que sempre pagou o meu salário. Fiquei chateado quando tomei a decisão de não fazer os exames e eles quiseram me encostar e me aposentar. Os médicos que estavam conduzindo a minha situação não me passavam tranquilidade. Depois da consultado com o Beny Schmidt comecei a me exercitar aqui na minha cidade, Andradina, ia para a academia. Depois o pessoal do Goiás entrou em contato comigo e fui para Goiânia. Passei três meses fazendo exames, mas de forma diferente. Treinava, sendo monitorado e depois o médico me liberou. Até a família dele achou que ele estava louco na época por causa disso.

Quando o São Caetano ameaçou te encostar?

Foi quase em 2006. Foi quando eu disse que não queria mais fazer exames com eles e queria procurar outros especialistas. Fiquei em casa mesmo, saí do São Caetano. 

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Você conseguiu se sentir seguro quando voltou a jogar?

No início fiquei com medo. Mesmo com diagnóstico, fiquei inseguro. Nos treinamentos mesmos tinha medo. Com dois anos parado, senti muita diferença na coordenação motora e tempo de bola. Foi muito difícil o retorno, traumático. Tive medo de passar mal. Eu vi o Serginho em campo, passava um filme na cabeça. Meu caso foi complicado porque o médico não assinaria minha liberação de forma alguma. Saí de São Paulo para poder alguma pessoa diferente, com outro olhar, para me ver não como jogador, mas como paciente, alguém normal. Graças a Deus o médico teve a ousadia e me liberou.

E fisicamente, como você estava quando voltou?

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Engordei 11 kg no tempo parado. Foi algo bem complicado. Fiquei acima do peso por um bom tempo. Tive muita dificuldade, de ficar até 4 kg acima do peso, tive que me superar. Falo do tema sem problema algum. Enquanto eu tiver força, saúde e as pessoas continuarem me ligando, vou continuar jogando. Tenho uma história forte, que vale a pena ser contado, eu me superei. O caso me atrapalhou profissionalmente, mas Deus me ajudou.

Depois de voltar a jogar, você sentiu algo de anormal?

Eu nunca senti nada, nem no São Caetano. É um caso tão estranho e tão raro que é difícil até de falar. Nunca tive desmaio e nem passei mal. Só senti algo quando estava 10 kg acima, mas aí é normal.

Você acredita que houve erro médico?

É difícil falar com exatidão Era complicado. Eu olhava para um exame e o médico falava que tinha alteração. E como se vai contra um diagnóstico? É difícil. Eu preferi lutar e procurar outro especialista. Estava na mão do São Caetano, que estava bancando os exames no HCor, com contrato em vigor. Tive que acatar as ordens, mas chegou ao meu limite, não aguentava mais ficar parado e viver uma vida de rato de laboratório, eram exames atrás de exames, repetia sempre. Os médicos estava atordoados. Entendo a situação deles, mas sou ser humano e precisava mudar. Fiquei chateado com o HCor pela forma como eles conduziram, porque expuseram a minha imagem ao colocar a minha ficha de internação nos jornais. Não tinha nada de novo. Utilizaram de forma sensacionalista. 

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