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A derrota do passe e a santa paciência

Por PAULO CALÇADE
Atualização:

Desde a 28.ª rodada do Campeonato Brasileiro, em outubro do ano passado, notícia boa não dura mais do que uma semana no Palmeiras. O sofrido empate (2 a 2) diante do Avaí, em casa, deu início a uma instabilidade que tirou o emprego de Muricy Ramalho e o clube da Libertadores. A derrota para a Ponte Preta desperdiçou todo o lucro do triunfo sobre o time da moda, na semana passada. Para que servem duas importantes vitórias, nos clássicos contra Santos e São Paulo, se o Palestra Itália, que deveria ser aliado estratégico na busca da vaga para as semifinais, acabou se transformando num drama para o Palmeiras? São Caetano (1 a 4), Santos André (1 a 3) e agora a Ponte (0 a 2) construíram placares incontestáveis, com e sem Antônio Carlos no comando. No Paulista, em oito partidas em casa, apenas 11 dos 24 pontos disputados acabaram na conta do time. Números de uma intrigante inconsistência.O problema vem de longe. Líder do Brasileiro em 2009 após 27 jogos, com cinco pontos de vantagem sobre o São Paulo, o Palmeiras conseguiu nas 11 rodadas seguintes abrir uma disputa que parecia administrável. Naquele momento, o Flamengo, que viria a ser o campeão, tinha 43 pontos, dez a menos do que o time de Muricy.É claro que as contusões de jogadores importantes como Maurício Ramos, Pierre e Cleiton Xavier foram decisivas, mas desde então o time não conseguiu se recuperar. Nas 29 partidas subsequentes, do empate com o Avaí à derrota de sábado para a Ponte Preta, o aproveitamento dos pontos disputados é de apenas 46%.Pior: o Palmeiras não consegue transformar seus bons momentos numa recuperação verdadeira. A crise está na essência, nos pilares do jogo, destruídos pela falta generalizada de confiança que paira sobre o Palestra Itália. Quando o passe não funciona o problema é técnico, e passa também a ser tático porque o time não consegue trabalhar no espaço reduzido pela marcação. A Ponte se movimentou com cinco jogadores no meio-campo no primeiro tempo. A história de que o goleiro Eduardo Martini foi um gigante da partida não é a mais recomendável para a situação, serve apenas para criar uma sensação falsa de domínio sobre o adversário.O treinador Sérgio Guedes trancou os lados do campo e obrigou o Palmeiras a centralizar o jogo, a cair na tentação de esticar bolas. Nesses momentos, é preciso fazer o jogo circular, saber procurar e criar espaços, tocando a bola. Impaciente, o time perde o controle psicológico ao ser espremido em casa. E assim o passe vai para o espaço. O que os treinadores andam fazendo com os meninos nas divisões de base? Não se pode errar tanto no futebol brasileiro. O maior defeito é a falta de um passe mais qualificado, quando exigido sob pressão, no espaço reduzido pela marcação e pelo preparo físico. É o futebol que se joga atualmente.Johan Cruyff, craque holandês da Copa de 1974 e ex-treinador do Barcelona, fala dessa condição básica para o desenvolvimento do jogo, da simplicidade de conexões complexas, algo que o Palmeiras e tantos outros não têm. "O futebol consiste basicamente em duas coisas. Primeira: quando se possui a bola, é preciso ser capaz de passá-la corretamente. Segunda: quando a passam para você, deve-se ter a capacidade de controlá-la. Quem não a controla, tampouco pode passá-la. Em campo, estes dois aspectos são os mais importantes do jogo, já que nunca devemos esquecer que o futebol é um esporte que implica muitas falhas e onde os acertos podem ter tanta importância quanto os erros.""Simples, básico, mas pouca gente possui essa lucidez. Telê Santana não era um gênio tático, mas com ele o passe estava em primeiro lugar. Por isso faz tanta falta.

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