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Boxe: Federação x Confederação

Por Agencia Estado
Atualização:

No córner azul, um senhor de 78 anos, Newton Campos, representante da mais tradicional estirpe de lutadores; no córner vermelho, a nova cara do boxe nacional, Luiz Cláudio Braga Boselli, um quarentão bem articulado e amparado pelos principais nomes do esporte brasileiro. Apesar de os dois estarem intimidados ligados ao pugilismo, Newton preside a Federação Paulista de Boxe (FPB) e Boselli esta a frente da Confederação Brasileira de Boxe (CBBoxe), a luta entre ambos não se dá sobre os ringues, não chegou, ainda, às agressões físicas. O combate se dá por meio de acusações, palavras duras; uma briga de egos, não por títulos, mas por espaço, por poder. Newton Campos procurou a Agência Estado para, segundo ele, revelar o porquê do desentendimento entre as entidades, que prejudicou ainda mais o maltrapilho boxe nacional e culminou no processo de desfiliação da FPB. "Esse Boselli é um mentiroso de marca maior, precisamos desmascarar esse sujeito, um profissional da mentira", começou assim o dirigente paulista. Entre exemplos de supostas provas de má gestão estão a de que o presidente da confederação vem usando sua sede ? na Abílio Soares, 1300, na capital ?, como loja para vender materiais esportivos da marca América, de propriedade de Boselli. Antônio Bernardo, de 64 anos, árbitro de boxe ligado à FPB, mostrou uma gravação telefônica em que uma funcionária da CBBoxe de nome Patrícia, atende o telefone da sede da entidade e passa o orçamento de luvas, capacetes e protetores para lutadoras, todos da América. "Qual o problema nisso. Se ligarem para a Federação Paulista eu tenho certeza que eles também vão passar informações sobre as melhores marcas do mercado", justificou Boselli. O dirigente primeiro se esquivou, em seguida contra-atacou. "Engraçado são eles (Newton e Bernardo) falarem que eu me aproveito da Confederação. Eles enriqueceram com a Federação, se cansaram de desviar dinheiro. A diferença entre eles e eu é que eles vivem do boxe, comem boxe, eu apenas trabalho para o boxe" disse Boselli. Newton Campos garante nunca ter lucrado com o boxe, a não ser no tempo em que trabalhava como jornalista da Gazeta Esportiva, onde assinou por mais de 30 anos a coluna Na Onda Quente do Boxe. Se sustenta hoje com suas aposentadorias. "Isso aqui (FPB) não dá dinheiro. Não temos fonte de renda alguma", lamentou. "A Confederação é que recebe uma fortuna do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e não ajuda nenhuma federação." O COB destinou a CBBoxe em 2003 mais de R$ 700 mil. "Ele precisa arranjar um jeito de ganhar dinheiro e não só ficar lamentando", provocou Boselli. "A verba que nós recebemos do COB, por lei, não pode ser repassada. As federações têm de criar suas receitas." A FPB se mantém utilizando os rendimentos dos cerca de R$ 70 mil reais, aplicados no Banco Bradesco, acumulados da época em que a entidade recebia R$ 15 mil por mês de dois bingos da cidade. Gasta por volta de R$ 12 mil mensais. A CBBoxe investe o dinheiro recebido do COB na manutenção da seleção olímpica permanente, com 24 atletas hospedados em Santo André. Os dois lados não se entendem em um único ponto. "Essa seleção permanente é um absurdo. Onde foi que já se viu tirar o atleta da academia para ficar gastando dinheiro num alojamento" criticou Antônio Bernardo, que já anunciou sua candidatura à sucessão de Boselli, em 2005. Boselli é a favor da contagem eletrônica dos pontos e sempre repreendeu a FPB por não adotar tal sistema, utilizado no Pan e nos Jogos Olímpicos. Pela contagem eletrônica, o jurado aciona um botão a cada golpe visto e se três dos cinco jurados perceberem o mesmo soco, o boxeador que o desferiu ganha um ponto. Este e outros desentendimentos resultaram na assembléia da Confederação que, no ano passado, decidiu desfiliar a FPB e as federações paranaense e carioca, aliadas de Newton. O processo ainda não foi concluído, mas, antecipando-se à decisão, a Federação Paulista protocolou um ofício exigindo seu desligamento da entidade. Hoje, a CBBoxe se remete em São Paulo apenas à Federação de Boxe do Estado de São Paulo, criada recentemente com o apoio de Boselli. Pan ? A má campanha do Brasil no Pan-Americano de São Domingos este ano foi a gota d´água para Newton. "O sr. Boselli levou lutador nas 11 categorias apenas para enganar o COB, para levar mais verba. Fomos com 11 e ganhamos só duas medalhas de bronze. Ficamos em último lugar!" Ele não aceita sequer voltar a conversar com Boselli. Não admite o fato de a CBBoxe ter virado às costas para seu trabalho. "Ele sabe que nós é que sabemos fazer luta, ele não sabe nada", argumenta o dirigente. "Mas o Boselli não quer o bem do pugilismo, ele quer é ganhar dinheiro e vender seus materiais." Para Boselli, Newton Campos é um personagem ultrapassado. E chega a menosprezar as competições organizadas pela FPB. "Ele fica fazendo aquelas lutas todas as terças-feiras para quê? Elas servem para quê? Não levam a nada." Primeiros atritos ? Boselli, até 1998, quando assumiu a presidência da CBBoxe, era árbitro de lutas promovidas pela FPB. "E era bastante fraco, diga-se de passagem", alfineta Newton Campos. Em 2000, no Campeonato Brasileiro de Mauá, o primeiro atrito. "Ele ficou chateado porque o tratamos como qualquer outro presidente de federação. Mas ele não aceita isso, acha que é o maior de todos", disse Boselli. "São Paulo estava ganhando as lutas e mesmo assim ele brigava, esperneava, era grosso com todo mundo." Segundo o presidente da Confederação, as outras federações se sentiram ofendidas e pediram para tirar Newton da área técnica. "Não foi nada disso. Ele (Boselli) saía dizendo aos quatro cantos que era hora de acabar com a hegemonia de São Paulo no boxe. Ele saía com os árbitros tentando convencê-los disso. Aí eu fiquei uma fera, claro. Quando mexem com meu Estado eu sou malcriado mesmo", defendeu-se Newton. Outro entrevero. Uma delegação francesa veio a São Paulo em 2000 disputar cinco lutas contra os paulistas. Os visitantes perderam por 4 a 1 e pleitearam com a Federação Paulista a realização de um novo evento, para o ano seguinte, desta vez em Paris. "Pedimos aos franceses um prazo maior para mandarmos nossos atletas, afinal estávamos em pleno Torneio dos Campeões" explicou Newton. Por achar que o combate Brasil x França saía da alçada da FPB, mandou a correspondência a CBBoxe. "Na hora que o Boselli soube que tinha dinheiro na história, não pensou duas vezes. Mandou todo mundo às pressas, sem preparação alguma", irrita-se o ex-jornalista. "E você sabe o que aconteceu?! Perdemos por 8 a 0, isso mesmo, 8 a 0, por pura ganância!" Alguns anos antes, em agosto de 1999, Newton Campos lembra-se que foi ele quem deu a notícia a Boselli do recém conquistado título mundial de Acelino Popó, na França, contra Anatole Alexandrov, pelos superpenas. "Fazia 24 anos que o Brasil não tinha um campeão mundial. Era um momento histórico para o boxe nacional. Liguei para o Boselli (que estava no Pan-Americano de Winnipeg) e contei, empolgado, o que acabara de assistir. E sabe o que ele respondeu? Ah é, ganhou, que bom... Ah, fiquei bobo com o descaso dele. Naquele momento eu vi que ele não tinha jeito para dirigente, não era do boxe."

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