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Caminhão de bolas sem direção

Boleiros

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Por Paulo Calçade
Atualização:

Pelo o que a seleção brasileira jogou, o empate em Quito com o Equador foi um grande resultado, pois em nenhum momento houve em campo algo que pudesse ser definido como futebol. Foi uma partida de algum esporte parecido, onde o objetivo deve ser observar o adversário chutar no gol de Julio Cesar, um goleiro em fase espetacular, o melhor do mundo no momento. Foi uma daqueles confrontos em que a história não bate com o que aconteceu dentro de campo. O Equador teve a posse de bola durante quase todo o tempo, jogou no campo brasileiro, mas finalizou muito mal. Despejou no gol de Julio Cesar um caminhão de bolas sem direção. Foram 39 finalizações, com apenas 12 delas atingindo o alvo, uma quantidade que nenhum time brasileiro que se preze pode receber, um vexame. A altitude de 2.850 metros não pode ser desprezada na soma dos fatores que levaram o Brasil ao empate nesse campeonato mundial de chutes defeituosos, mas ela não joga sozinha. A seleção equatoriana também sentiu os efeitos da arma que considera ser letal para seus oponentes. No time que o treinador Sixto Vizuete escalou ontem, apenas o goleiro Cevallos e o lateral Reasco jogam em Quito. Os demais atuam em cidades onde a altitude não entra em campo. Isso significa que gente como Guerrón, que atua no Getafe, da Espanha, chega também temendo o jogo nas alturas. Até o início desta rodada das Eliminatórias, os equatorianos, que ocupavam a sexta posição na classificação geral, tinham a terceira melhor campanha entre os mandantes, atrás de Paraguai e Argentina. O time melhorou com a chegada de Vizuete, que conhece muito bem o peso de se jogar em casa. Na trajetória para a Copa da Alemanha, 23 dos 28 pontos obtidos brotaram das alturas. O fator campo pesa bastante nessas circunstâncias, onde a pressão e a densidade do ar são menores. Por isso ouvimos frequentemente os jogadores dizerem que a bola está mais leve. Não é bem por aí, ela continua dentro das regras do jogo, variando entre 410 e 450 gramas, torna-se apenas mais veloz. O pior da altitude está na diminuição da resistência das vias respiratórias, na aceleração do processo de fadiga e no retardo da velocidade de reação, terrível para goleiros. É fácil entender: bola rápida mais goleiro lento pode ser igual a frango. Não foi o caso desta vez. É preciso entender essa relação do rendimento de uma equipe diante de um fator externo, determinante no resultado, pois há outro muito importante, geralmente presente como defeito na equipe brasileira. Da mesma forma que a altitude pode influenciar no desempenho do Equador, o Brasil oscila na onda da motivação. Geralmente precisa de um empurrãozinho para pegar no tranco, pois o que se viu ontem não pode ser o futebol de uma seleção brasileira nem a 4.000 metros de altitude. Um exemplo? Por mais que Ronaldinho Gaúcho tenha sofrido, espera-se, pelo menos, uma demonstração de vontade, de determinação. Lento, ele fez o Brasil jogar com um buraco no meio-de-campo. Com os volantes brasileiros enfiados entre os zagueiros, cabia a ele preencher os espaços para dificultar os chutes de fora da área. Com o time todo na defesa, a bola brasileira jamais chegou ao ataque, até a entrada de Júlio Batista, aos 25 minutos do segundo tempo. O que vimos, mais uma vez, foi um time que acorda contra os grandes e dorme diante dos pequenos.

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