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Centroavantes

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Por Redação
Atualização:

O Campeonato Paulista já avança pela terceira rodada e o assunto é um só: a força dos centroavantes. Na jornada do fim de semana, os artilheiros confirmaram sua vocação para o estrelato empurrando aos pares a bola para dentro da rede. Não há nada que deixe uma torcida mais tranquila do que reconhecer que o instinto letal de seu matador está apurado, em sintonia com a lei imperiosa da selva. Todo time começa por um grande goleiro, mas até um time ruim pode aspirar alguma coisa se tiver um centroavante capaz de transformar aquela mísera chance de gol que surge na partida em tento real. Acho que a maioria das crianças quando começa a se interessar por futebol, uma hora ou outra, fatalmente escolhe o centroavante como alvo de sua predileção. Isso é natural, os centroavantes têm a mística dos salvadores, dos justiceiros, dos vingadores. Eles resolvem, são indivíduos dotados dessa qualidade que todos desejam, mas nem todos têm: carisma. Magnetismo é a chave para fazer funcionar essa relação misteriosa e invisível que liga o camisa 9 à bola. Paixão irresistível? Medo de sua própria submissão? Relação de complementaridade indissolúvel? Há muitas formas de tentar descrever essa sina da bola de sempre querer se colar ao pé do artilheiro, para que ele a conduza ao lugar certeiro das redes, o trono que coroa a majestade do rei e dá sentido à existência da própria bola. Não foi diferente comigo, o primeiro grande centroavante que me fascinou, e que talvez tenha sido o maior entre todos os meus ídolos, foi Serginho. Assisti na minha infância ao seu surgimento, me lembro inclusive de sua estreia. Se não me engano, entrou no segundo tempo e fez dois gols. E, a partir daí, nunca mais parou de fazê-los. Serginho, além do talento nato para a artilharia, tinha personalidade incomum, forte, temperamental. Não foram poucos os problemas que seu gênio indomável causou à sua carreira. Ficou de fora da Copa de 78 graças a um bico desferido na canela de um bandeirinha que anulou um gol seu. Foi titular na Copa de 82, ajudado pela contusão e o corte de Careca. Para muitos, ele destoava do futebol técnico do resto do elenco estelar. Para mim, isso pouco importava. Com toda a paixão que corria pelo meu sangue aos 19 anos, enfeitei as paredes do lado da nossa preciosa e única TV a cores com fotos e mais fotos do meu grande ídolo. Serginho jogou também no Santos e no Corinthians. Mas foi no São Paulo que ele se imortalizou - é o maior goleador da história do clube. Outros grandes centroavantes passaram pelo Tricolor. De Mirandinha a França, de Careca a Luís Fabiano, sem contar aqueles que de pouco sei, pois nunca vi e só ouvi suas histórias lendárias contadas por meu avô e meu pai. Cada um com sua característica própria, com seu estilo, sua cartilha de artimanhas, seu repertório infinito de truques capazes de ludibriar os zagueiros, de colocar a bola onde o goleiro jamais alcança. Na vida de cada um de nós existe esse sonho de ser o grande centroavante. A cada momento de dificuldade, esperamos de nós mesmos o gol salvador, o lance genial, instantâneo e inesperado que desvendará o enigma insolúvel. E não há prazer e felicidade que se compare a esse momento, quando resolvemos a parada, ganhando o nosso próprio jogo. Os centroavantes são parte de uma categoria abençoada, mas também pagam um alto preço por isso. Podem ser erguidos nos ombros após o triunfo e a glória, como podem ser perseguidos ou desprezados se não cumprirem seu portentoso destino. Não se salvam de nossa ira quando não nos salvam de nosso medo.

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