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El ''petizo'' Conca

Por MARCOS CAETANO
Atualização:

Durante três anos eu morei em Buenos Aires, Argentina. Essa experiência num país tão próximo e ao mesmo tempo tão distante, além de me oferecer uma nova perspectiva sobre o Brasil, coisa que a gente só consegue no exílio, permitiu que eu pudesse enterrar um monte de preconceitos. A verdade é que fora a rivalidade futebolística, de fato folclórica e visceral, os argentinos gostam um bocado do Brasil. A Música Popular Brasileira é consumida por lá em grande escala, eles adoram passar férias no nosso litoral e, para nossos vizinhos, o Brasil é um país gigante, empreendedor, cercado de imagens coloridas e alegres recordações. Sempre fui muito bem tratado por lá, bastando dizer que era brasileiro para receber logo um sorriso em retribuição. Costumamos confundir o humor um tanto impiedoso dos portenhos - na maioria das vezes, impiedoso com eles mesmos - com arrogância. Não é bem assim, mas isso já seria assunto para outra coluna. Só que hoje, não. Hoje eu quero falar de Darío Conca, o craque do Brasileirão.Quando cheguei a Buenos Aires, em 1995, o time sensação do Campeonato Clausura era o San Lorenzo de Almagro, clube de bairro que, apesar da grande tradição, jamais foi um colecionador de títulos. No entanto, graças ao talento de um jogador brasileiro - habilidoso, baixinho e longe de ser um grande ídolo em seu país -, o time azul e vermelho conseguiu acabar com uma espera de 20 anos sem títulos. Aclamado herói da façanha, o grande cérebro do time que contava ainda com o talento do goleiro Passet e do zagueiro Ruggeri foi eleito o melhor jogador do ano no país. Seu nome? Silas. Ao ver um brasileiro apontado como o maior craque em atividade na Argentina, eu comecei a perceber que, mesmo quando o assunto é futebol, preconceitos podem ser superados. Dez anos depois, o argentino Tévez repetiu a façanha do outro lado da fronteira, sendo aclamado o craque do Brasileirão 2005. Na atual temporada, Conca tem tudo para se tornar o segundo argentino craque do Brasileirão. Só que, enquanto Tévez joga pela seleção argentina, Conca, meus amigos, pode perfeitamente jogar pela nossa.Baixinho, habilidoso, reservado e, como Silas, não muito valorizado em seu país, Conca já mostrou que tem todos os atributos esperados de um meio-campista. Além do talento, o craque do Fluminense é dotado de enorme disciplina.Mesmo caçado em campo, jamais cava faltas ou reclama da arbitragem. Joga com a bola grudada aos pés, chuta bem, lança como poucos e raramente perde um jogo. Chinelinho, definitivamente, não é com ele. Para completar o pacote, o caráter. Que lindo exemplo deu o pequeno gigante tricolor ao marcar seu segundo gol na vitória sobre o Grêmio, na última quinta-feira. Em vez de bater no peito e dizer "Eu sou fogo!", como muitos jogadores marrentos adoram fazer, Conca avisou que o gol não era dele, mas de Washington, o centroavante que não marca há dez jogos. Quanto vale uma atitude assim? Quanto, meu querido Mano Menezes? Não por acaso, os argentinos adoram citar um provérbio: "Ninguém é profeta em sua terra." Nossos vizinhos ainda não permitiram que Conca fosse profeta na seleção argentina. Que tal, então, deixarmos que ele seja na nossa? O que aqui chamamos de baixinho, apelido do eterno Romário, los hermanos chamam de "petizo". Pois eu digo que El Petizo pode perfeitamente ser mais um maestro do meio-campo da nossa seleção.Os puristas torcerão o nariz para um estrangeiro no nosso time, mas eu acho que talento não tem fronteiras e, como Conca construiu aqui a parte mais vitoriosa de sua carreira, se já disse que gostaria de vestir a amarelinha, por que não darmos a ele essa chance? Se o amigo leitor é daqueles que tem birra com os argentinos, veja a coisa por este lado: seria ou não seria uma boa tirada de sarro com a cara deles? No mínimo, desfalcaríamos o adversário de um craque. Mano, vai por mim: convoque El Petizo - antes que um técnico argentino o faça.

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