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Eles vieram se divertir

Ilha do Caribe é rica, não tem violência e vê no esporte um meio de entretenimento. No Rio, tem só 15 atletas

Por Eduardo Maluf
Atualização:

Estamos acostumados, no esporte, a ouvir histórias de garotos pobres que lutam contra a miséria e a falta de condições para vencer na vida. Vão treinar de ônibus, crescem, profissionalizam-se, começam a ganhar dinheiro e se tornam vencedores. Quem conversar por alguns minutos com gente da delegação de Aruba vai perceber que essa história não passa nem perto de seus atletas. Localizada no oriente das Antilhas Holandeses - no Caribe -, a ilha de 110 mil habitantes não tem mendigo, não tem pobreza, não tem violência. Os esportistas são jovens de família bem-sucedida economicamente que entram nas quadras, nas pistas ou na piscina apenas para se divertir. No Rio, os 15 representantes do País estão fazendo festa, nada preocupados em conquistar medalha. Sabem que não têm nenhuma possibilidade de subir ao pódio. Há alguns dias, Margie Kelders, 15 anos, Anna Posner, 18, e Charlene de Cuba, 23, passeavam pela Vila Pan-Americana, quando foram abordadas pelo repórter do Estado. Levaram um grande susto. ''''O que ele quer comigo?'''', devem ter pensado. Nem em Aruba as três (das nove) garotas do nado sincronizado são entrevistadas. Lá, a piscina é só um meio de entretenimento. As pessoas estudam ou trabalham. Margie é estudante e, tímida, preferiu se manter calada. Mas prestou atenção em toda a conversa. Anna, mais falante, usou o papiamento para contar histórias. Difícil de entender. O idioma oficial é o holandês - a ilha pertence à Holanda, embora tenha administração própria -, mas a língua falada pelo povo é o papiamento, que evoluiu de uma espécie de mistura do espanhol, do holandês, do português, do inglês e do francês. O problema da comunicação foi resolvido por Charlene. A mais experiente da turma morou há alguns anos no Brasil. Que alívio! Dividiu-se entre São Paulo, onde fez pós-graduação em contabilidade, e Rio. Fala um português de alto nível. Mas por que o Brasil? ''''Gosto da cultura brasileira, do samba, das pessoas, fui muito feliz vivendo no Brasil'''', diz, esbanjando elegância e simpatia. As três se apresentaram pela primeira vez ontem no Maria Lenk e exibiram o talento aos cariocas. Não brigarão pelos primeiros lugares, mas certamente estão garantindo momentos de beleza e charme ao público. ''''Nosso esporte está evoluindo, hoje já temos alguns treinadores internacionais em Aruba'''', ressalta Charlene, orgulhosa, com a cabeça empinada. Anna resolveu dar seu pitaco no bate-papo. E parece não ter concordado muito com Charlene. ''''Mas nosso esporte não dá retorno, estudamos ou trabalhamos. Esporte é só para diversão mesmo.'''' Não precisava ter falado. Aruba nunca conquistou uma medalha em Jogos Pan-Americanos. Jamais obteve um resultado expressivo internacionalmente. A ilha ainda festeja a prata conquistada por Stewart Smith, do tae kwon do, no Sul-Americano da Venezuela, em novembro. Maior feito da história de seu esporte. ''''Não existe ninguém que tenha o esporte como primeira atividade'''', lembra Charlene. ''''A situação econômica da população de Aruba é boa, não há necessidade de patrocínio para se praticar esporte.'''' Vários, dos 15 atletas no Pan, já haviam visitado o Rio. Não para competir, apenas a passeio. Agora curtem os Jogos e a beleza da capital carioca. ''''Estamos aqui desde o dia 11, a cidade é bonita e a Vila também é legal'''', comenta Charlene. ''''Mas não vamos à boate da Vila, somos tranqüilas'''', garante. Aruba, a 27 quilômetros da costa venezuelana e a menos de 50 quilômetros de Curaçao, é fortíssima no turismo, sua principal fonte de renda. Mais de 700 mil pessoas - cerca de 500 mil dos Estados Unidos - visitam esse extraordinário lugar todos os anos. A ilha produz muito pouco. A cerveja Balashi é uma de suas raras criações. Mas o comércio é bem-sucedido. Vende uma série de produtos importados a preços acessíveis. ESPORTE NÃO TEM INCENTIVO Parece incrível: além do Comitê Olímpico, Aruba ainda conta com 28 federações esportivas. As entidades, no entanto, funcionam apenas como meio para atrair os interessados na prática das modalidades. Não há incentivo econômico por parte do governo - nem realização de campeonatos. ''''Aporte financeiro praticamente não existe, o esporte é mais um passatempo'''', declara Mary Hsing, secretária-geral do Comitê Olímpico Arubano. A natação, o nado sincronizado e o tae kwon do são os três mais populares na ilha. Grande parte de seus praticantes é de adolescentes dos ensinos médio e fundamental. Após terminar os estudos, aos 17 ou 18 anos, os jovens vão embora para fazer universidade - não há faculdades por lá. O destino costuma ser Holanda, onde há locais específicos para a população do Caribe, ou Estados Unidos. ''''Só retornam anos mais tarde (ou não retornam)'''', observa Hsing. O esporte, assim, acaba ficando em segundo plano. Mas não deixa de ser uma grande diversão dos arubanos.

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