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Feminino luta contra improviso do esporte

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Por Amanda Romanelli
Atualização:

O início nos campos de futebol - na maioria das vezes, de terra, em um bairro de periferia - foi entre meninos. A família nem sempre concordou com a idéia de uma garota correr atrás da bola. Já adulta, a chance de uma carreira profissional virou realidade, mas a dificuldade em manter o sonho de ser jogadora é uma briga diária. O roteiro, genérico, ganha rosto e nome quando a seleção brasileira feminina de futebol entra em campo. Da veterana zagueira Tânia Maranhão, que há quase duas décadas veste a camisa verde-amarela, à estreante goleira Bárbara, que em Pequim fez suas primeiras partidas como titular, as trajetórias se confundem com a batalha que a modalidade enfrenta. Duas vezes considerada a melhor jogadora do mundo, a meia-atacante Marta é prova de que só a persistência ligada a talento pode render frutos para as meninas brasileiras. Na pequena Dois Riachos, nasceu uma craque na base do improviso: enfrentando os meninos, chutando bola de papel enrolada em fita adesiva. A chance de virar profissional veio no Vasco, quando viajou ao Rio - dois dias de ônibus. A ida para o Umea, na Suécia, só veio depois de se destacar na seleção. Com Tânia Maranhão, Formiga e Pretinha, todas com mais de 30 anos e próximas da aposentadoria na seleção, a história se repete. Apenas as cidades - São Luís (MA) e Salvador (BA) - mudam. Os campos de terra foram os mesmos e as escassas oportunidades para chegar à profissionalização, também. A dificuldade, para a maioria, é encontrar um time e ganhar o suficiente para se manter. A atacante Cristiane, terceira melhor do mundo pela Fifa, precisou passar o último semestre de 2007 jogando pelo time da Prefeitura de São José dos Campos, já bicampeã pan-americana. Mesmo reconhecida, dividia um alojamento com outras atletas. Depois de atuar por anos na Alemanha (foi a primeira brasileira a se transferir para a Europa), Cristiane conseguiu voltar, em janeiro, para o Velho Continente. Joga no Linkopings, da Suécia, que contratou a meia Daniela Alves, que estava no Saad. Há quatro anos, com a primeira medalha olímpica de prata, vieram as promessas de maior atenção à modalidade. De concreto, só a realização do Campeonato Paulista, reiniciado em 2004. Das 18 convocadas para a seleção olímpica, seis atuam em São Paulo: Andréia Rosa (Ferroviária), Érika, Francielle, Éster e Maurine (Santos), Formiga (Botucatu) e Fabiana (Corinthians). Mas o pedido - quase súplica - ainda é por um torneio nacional. Ontem, após a decisão contra os EUA, a meia Daniela Alves voltou a lembrar que as jogadoras precisam de torneios que as mantenham em atividade. "Não custa nada criar uma liga feminina", pediu. "Precisamos descobrir outras meninas." O primeiro e único campeonato organizado pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) ocorreu no fim do ano, após a conquista do bicampeonato pan-americano e do vice mundial. Até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pressionou. A Copa do Brasil durou apenas dois meses, teve pouca divulgação e ainda causou prejuízos aos 32 times - o repasse clubes atrasou. Uma segunda edição não foi confirmada, já que a CBF não inclui os torneios femininos no calendário em seu site. A maioria das atletas que defende a seleção recebe como complemento salarial o Bolsa-Atleta, do governo federal. Os prêmios da CBF quando estão na equipe nacional aumentam a renda. Mas os valores ficam muito distantes do que o dos profissionais do masculino. Pelo bicampeonato do Pan e o vice na Copa da China, apenas R$ 17 mil. Os titulares da campanha do penta, em 2002, ganharam R$ 300 mil. Não à toa, as atletas voltaram do último Mundial com um pacote de reivindicações. Com poucos campeonatos, parte das jogadoras fora de São Paulo não tem atividade para os 12 meses do ano. A goleira Bárbara, descoberta em um torneio de jovens carentes no Recife, está desempregada. Titular da sub-20, espera contatos dos espanhóis.

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