Futebol ou escritório? Mano fez boa aposta

Técnico corintiano teve de fazer a escolha em 1992: opção correta

PUBLICIDADE

Por Fábio Hecico e PORTO ALEGRE
Atualização:

Mano Menezes não admite, em hipótese alguma, que falem mal do Guarani de Venâncio Aires. Foi no pequeno clube da Capital Nacional do Chimarrão, no interior gaúcho (128 quilômetros da capital Porto Alegre), que o zagueiro Mano, um magrelo de pouca técnica dava início, aos 20 anos, numa bonita carreira no futebol. O ano era 1982. "Mas não posso deixar de falar do Esporte Clube Rosário, de Passo do Sobrado, onde nasci. Meu pai era o presidente e eu acompanhava, ajudava nos jogos da várzea", conta o treinador, em entrevista ao Estado. A paixão pelos campos o fez se aventurar na vizinha Venâncio Aires. Não tinha muitas opções de clubes na região e ir para a capital era sonho distante. "As locomoções eram complicadas na época. Antigamente um local a 150 quilômetros ficava muito longe", lembra. No Guarani, um clube que ainda disputava a terceira divisão - Amador, como define até hoje a Federação - era a chance de jogar para valer. "Era uma espécie de várzea mais organizada. Nada, porém, de pensar em largar o emprego. Desde os 14 anos, Mano Menezes trabalhava de Auxiliar de Escritório numa empresa de fumo. "A realidade no futebol era bem diferente da que é hoje. Eu pensava era no meu emprego, não dava para pensar em ganhar dinheiro jogando bola", afirma. "Se ganhava mal naquela época, era um risco apostar no futebol." Seus amigos, todos, tinham uma profissão. E Mano não queria ficar para trás. Afinal, estava prestes a se casar com Maria Inês e sonhava em cursar Educação Física. Sonho que concretizou anos mais tarde. Com bastante esforço e dedicação, este gaúcho de 46 anos conseguia conciliar todas as suas paixões. Veio o casamento, a filha Camila e a faixa de capitão do Guarani, clube que se profissionalizaria em 1985, 58 anos após sua fundação. Três anos mais tarde, em 88, o Rubro-Negro, ou Time de Índio, como é conhecido o clube, chegou à decisão do Amador. Empate e disputa nos pênaltis. O gol decisivo não poderia sair do pé de outro jogador não fosse o capitão Mano. "Encontraram até uma narração, emocionante. Título conquistado, acesso não. As regras eram diferentes o que o fez não desistir da carreira que jurava não decolar. "E a cidade ficou eufórica, todos queriam subir. Uma enorme empolgação...", lembra. "Subimos em 90, ficamos 19 jogos invictos em 91. Com o acesso, Mano pôs fim ao sonho de jogar bola. Sabia de suas limitações. "Eu era um zagueiro consciente", se define. Como assim? "O jogador tem de atuar de acordo com sua capacidade, saber o que pode fazer em campo." Para quem gosta de comparações atuais, ele diz se teria cacife para jogar no Corinthians atual. "Hoje não, pois são muito melhores", não segura o riso. Mas comemora a grande fase dos zagueiros William e Chicão. Contudo, não abandonou o Guarani. Com agasalho e alguns fios de cabelo a menos, resolveu dirigir os juniores. Em cinco temporadas, mostrou ter afinidade com a profissão. De 92 a 96 o pequeno rubro-negro escreveu seu nome entre os quatro melhores da competição. "Um sucesso, pois o Caxias, de Washington (hoje no São Paulo) e o Juventude (com a Parmalat) eram muito fortes. Sem contar Internacional e Grêmio." Mano enfrentará um pupilo seu na decisão da Copa do Brasil: o lateral-direito Bolívar, hoje no Internacional. Por ironia, um jogador recusado por Tite na época em que dirigia o Grêmio e hoje o dirige. Por falar do comandante colorado, Mano faz questão de dizer que nunca o viu jogar e, consequentemente, não o enfrentou como jogador. No fim de 96, o trabalho no escritório já fazia parte do passado. A fábrica de fumo também. Por um futuro melhor para dona Maria Inês e a filha Camila, Mano se tornou Técnico em Lazer no Sesi. E o curso de Educação Física estava quase no fim. Começo de 97 e teve de fazer uma escolha. Ou melhor, responder a um convite. "Era pai de família, não podia fazer voos arriscados. Tive de fazer uma opção se me tornaria técnico profissional ou seguiria trabalhando. "Era fazer um bom trabalho e se aproximar do sucesso ou se distanciar." Veio acesso à elite gaúcha, o título de 2002 num campeonato sem os grandes e propostas, muitas propostas. As dificuldades da infância em Passo do Sobrado começavam a ser superadas. Veio o XV de Campo Bom e, dali em diante, todos sabem o que aconteceu com Mano Menezes. Para gremistas e corintianos, com muita alegria.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.