O atleta Michael tem ocupado espaço enorme na imprensa. Michael é jogador de vôlei, do clube Vôlei Futuro, e, numa partida contra o Cruzeiro, foi ostensivamente ofendido por torcedores que se referiam de modo agressivo às suas preferências sexuais. Vôlei não é futebol. Os torcedores estão muito perto da quadra, um ginásio, por sua vez, faz o som reverberar e, concordo, a experiência para o jogador deve ter sido das mais traumáticas. O jogador, porém, na única e repetida entrevista que vi pela televisão, se mostrou surpreendentemente sereno, declarando que está acostumado a manifestações grosseiras, mas que essa, pelo número de torcedores que gritavam ofensas, o assustou. Não falou, que eu tenha ouvido, nada mais contra o Cruzeiro nem contra seus dirigentes. Ele, o único, a meu ver, que tinha inteiro direito não disse, no momento da entrevista pelo menos, que pretendia entrar com qualquer ação contra o adversário. Seu time, no entanto não pensou assim e imediatamente entrou com pedido de punição ao Cruzeiro. O caso foi gradualmente se deslocando do jogador Michael para passar para a esfera dos clubes. Os dois clubes começaram uma batalha que, em resumo, era o Vôlei Futuro atacando e o Cruzeiro se defendendo como podia. Houve um segundo jogo no ginásio do Vôlei Futuro e Michael foi alvo de todas as manifestações de carinho por parte de sua torcida. Nada mais justo. Logo depois o Cruzeiro foi o punido com uma multa de R$ 50 mil, sendo, portanto, considerado responsável pela atitude de seus torcedores. Bem, tudo parecia mais ou menos resolvido, não fosse a inconformidade do Vôlei Futuro com a decisão. E aí o caso dá mais uma volta, ganhando ainda outro aspecto. Em nota oficial, o Vôlei Futuro reclamou do fato que o Cruzeiro não perdeu o mando de quadra. Queria mudar o lugar da partida final para uma quadra neutra e não jogar "naquele lugar, com aquelas mesmas pessoas, com a organização exercida pelo mesmo clube". Essa declaração me parece embute a ideia de que não só o mando de jogo deveria ser tirado do Cruzeiro, mas que uma intervenção, talvez da Federação, deveria ocorrer, afastando da partida não só a diretoria do Cruzeiro como também sua torcida. A lógica indica, porém, que, ao contrário, o Vôlei Futuro, vai ter as melhores condições exatamente na quadra o Cruzeiro. Quem seria o cruzeirense alucinado a ponto de repetir atitudes que já prejudicaram o clube e poderiam dessa vez prejudicá-lo de maneira definitiva? Será que a diretoria do Cruzeiro não se acautelou para evitar qualquer atitude intempestiva da torcida? Não sei se erro, mas tendo a achar que os fatos vão obrigar a torcida do Cruzeiro a se comportar de forma exemplar e, portanto, o seu ginásio será o lugar mais confortável para o Vôlei Futuro se exibir. Se isso é verdade não é impossível chegar à conclusão de que o que esteve sempre em causa não eram exatamente valores e princípios, mas algo muito mais nosso conhecido, ou seja: a tentativa de desestabilizar o adversário para ganhar a partida. Toda essa exigência de punição rigorosa, toda essa demonstração de indignação pela liberdade sexual injuriada, é possível que não passasse de simples tática, às vésperas de uma partida decisiva. Se for assim, isso também não deixa de ser mais uma forma de desrespeito ao Michael.