Ladetec: falta de apoio, erro e polêmica

Único laboratório do País credenciado pela Wada, somente agora receberá investimentos, por causa da Copa e da Olimpíada

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Por Tiago Rogero e RIO
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Pela primeira vez desde que foi fundado, em 1984, o laboratório que vai realizar todos os exames de controle de doping da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio, em 2016, virou prioridade no Ministério do Esporte. Apesar de vinculado a uma instituição da União, o Laboratório de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico (Ladetec), da Universidade Federal do Rio (UFRJ), sobreviveu praticamente sem recursos públicos. Em seus 28 anos, o Ladetec recebeu um total de R$ 12,9 milhões do Ministério do Esporte - cerca de R$ 460 mil/ano. Pouco para quem precisa anualmente de R$ 3 milhões para funcionar. O mais recente aporte, no entanto, foi o maior feito de uma só vez. Em dezembro de 2011, o ministério repassou ao laboratório R$ 5,34 milhões. Não por acaso. No Dossiê de Candidatura do Rio aos Jogos, o Governo Federal se comprometeu a financiar melhorias e novos equipamentos para o Ladetec. O laboratório é um dos 33 no mundo - o único no Brasil - acreditados pela Agência Mundial Antidoping (Wada). "A grande conquista do laboratório até hoje? Não ter quebrado e continuar acreditado", disse o coordenador do Ladetec, professor Francisco Radler Neto, de 63 anos. O repasse de 2011 ocorreu logo após a maior polêmica da história do laboratório. Em maio, exame em amostra do jogador de vôlei de praia Pedro Solberg, de 25 anos, apontou presença de esteroide. Na contraprova, também no Ladetec, o resultado se repetiu. O atleta, que negava ter ingerido qualquer substância ilegal, foi suspenso. Solberg recorreu à Federação Internacional de Vôlei e pediu novo exame, desta vez na Alemanha. O resultado não apontou doping e ele foi liberado para voltar a jogar. Para o atleta, ficou o prejuízo, financeiro e emocional. Para o laboratório, a imagem arranhada e uma suspensão da Wada. Devido ao erro, o Ladetec não pode realizar, até o meio do ano, análises de espectrometria isotópica, conhecidas como IRMS, mas continua autorizado a fazer outros sete exames de controle de doping. No vermelho. O problema da falta de recursos vem desde a criação. O Ladetec surgiu graças a um programa do Banco Mundial para financiamento de pesquisa no Brasil. Para receber o recurso, os laboratórios tinham de se comprometer a, assim que acabasse a verba inicial, buscar o próprio sustento. O primeiro cliente foi a Petrobrás, com a prospecção geoquímica de petróleo, que ajuda a apontar o melhor lugar para perfurações. O laboratório de controle de dopagem só surgiu em 1989, quando o Brasil sediou a Copa América. A Confederação Brasileira de Futebol ajudou o Ladetec a capacitar pessoal para os exames. No mesmo ano, o Ministério da Agricultura procurou o laboratório para que fosse feito controle da carne brasileira, cuja exportação para a Europa havia sido bloqueada. Até hoje, CBF, Ministério da Agricultura e Petrobrás são os clientes que sustentam o Ladetec. As confederações de vôlei e atletismo também pedem exames, mas nada que se compare ao futebol. Dos 5 mil exames de doping realizados por ano no Ladetec, 3,8 mil vêm da CBF. O credenciamento pelo Comitê Olímpico Internacional ocorreu em 2002. Dois anos depois, foi criada a Wada, o que provocou uma "crise financeira sem proporções no laboratório", segundo Radler. As exigências eram muito maiores. Veio, então, o Pan do Rio. Para fazer os exames da competição, era preciso investir. O Ministério do Esporte tinha cerca de R$ 5 milhões "sobrando" no orçamento de 2005, que seriam deduzidos em 2006, e repassou ao Ladetec. Mas a verba só poderia ser usada em equipamentos. "Não dava para usar os recursos nem para pagar as despesas de exportação. Só de armazenagem da Infraero, gastamos R$ 485 mil do próprio bolso", lembra Radler. O Ladetec, mais uma vez, se endividou. A Fundação Universitária José Bonifácio, da UFRJ, emprestou dinheiro. Às vésperas do Pan, em 2007, "o ministério se assustou e chamou um consultor. Ele disse: 'Desse jeito não tem Pan. Ou vocês dão dinheiro, ou podem esquecer'". A pasta repassou cerca de R$ 2 milhões, mas exigiu que os mais de 1,5 mil exames da competição fossem feitos de graça. "Saímos do Pan devendo à nossa Fundação R$ 820 mil. Este foi o nosso legado", disse o professor. O contato com o ministério foi encerrado após a competição, mas retomado em 2009, quando Marco Aurélio Klein assumiu a diretoria de Alto Rendimento. Para o diretor, o Ladetec vai ser "um dos maiores legados dos Jogos de 2016". O ministério vai financiar parte da construção do novo laboratório. "A universidade se sacrificou por 20 anos pelo controle de doping no País e ninguém nunca valorizou. O Comitê Olímpico Brasileiro nunca nos deu um tostão", comentou Radler. "Pelo menos agora, o ministério do Esporte está comprometido com as necessidades do laboratório."

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