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Mais de duas dúzias são acusados por esquema de doping em corridas de cavalos

Grupo fabricava e distribuía drogas adulteradas e com rótulos trocados para tratamento dos animais

Por Benjamin Weiser e Joe Drape
Atualização:

Mais de duas dúzias de treinadores de cavalos de corrida, veterinários e distribuidores de substâncias foram acusados por um amplo esquema de dopar secretamente cavalos e enganar os apostadores, de acordo com as acusações federais feitas na segunda-feira em Nova York. Entre as 27 pessoas acusadas estava Jason Servis, treinador do Maximum Security, um dos melhores cavalos de corrida do mundo e um dos beneficiados do regime de doping, segundo as acusações.

Cavalos domesticados modernos são considerados mais dóceis Foto: Jae C. Hong/AP

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Servis secretamente administrou drogas que melhoram o desempenho “em praticamente todos os cavalos de corrida sob seu controle”, descreveu a acusação, acrescentando que, de 2018 a fevereiro de 2020, ele colocou cavalos em mais de mil corridas. Em maio, o Maximum Security cruzou a linha de chegada em primeiro lugar no Kentucky Derby, mas foi desclassificado por quase derrubar um cavalo rival e diminuir o ritmo de outros. O azarão Country House foi nomeado vencedor. O Maximum Security venceu quatro de suas cinco corridas seguintes - levando, no mês passado, o cheque de US$ 10 milhões (R$ 46,4 bilhões) pelo primeiro lugar na corrida mais valiosa do mundo: a Copa da Arábia Saudita, no hipódromo Rei Abdulaziz, em Riad.

O esquema, conforme descrito em quatro diferentes acusações contra um total de 27 pessoas, consistia em fabricar e distribuir drogas adulteradas e com rótulos trocados, para administrá-las secretamente em cavalos de corrida sob o controle dos acusados.

Os participantes procuravam melhorar o desempenho nas corridas para obter os prêmios em dinheiro de eventos em todo o país (Nova York, Nova Jersey, Flórida, Ohio e Kentucky) e também nos Emirados Árabes Unidos, disse uma acusação: “tudo em detrimento da saúde e do bem-estar dos cavalos”. Segundo a acusação, para evitar a detecção do esquema os acusados costumavam fraudar e enganar os órgãos reguladores federais e estaduais, bem como “o público apostador”.

Na entrevista coletiva em que anunciou as acusações, Geoffrey S. Berman, procurador em Manhattan, disse que o caso é a mais ampla acusação por doping de cavalos de corrida da história do Departamento de Justiça e que a investigação continua.

Os réus, ele disse, “não agiram por amor ao esporte, muito menos por cuidado com os cavalos, mas sim por dinheiro”. Os cavalos foram “alimentados à força e receberam injeções com todos os tipos de drogas ilegais e experimentais, substâncias que os faziam correr de maneira artificial e mascaravam a dor”, o que pode causar ferimentos e até mesmo morte, disse ele. William F. Sweeney Jr., chefe do escritório do FBI em Nova York, acrescentou: “O que realmente aconteceu com os cavalos configura nada menos que abuso”.

As corridas de cavalos têm um longo histórico de treinadores que reaproveitam substâncias para buscar vantagem no desempenho. Veneno de sapo e cobra, Viagra, cocaína, medicamentos para o coração e esteroides já foram detectados em testes de doping. Essa dependência de substâncias para melhorar o desempenho, combinada aos regulamentos permissivos, fez das pistas de corrida dos Estados Unidos as mais mortais do mundo.

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Em média, quase 10 cavalos por semana morreram nas pistas americanas em 2018, de acordo com a base de dados de lesões equinas do Jockey Club. Esse número chega a ser cinco vezes maior que a taxa de mortalidade na Europa e na Ásia, onde as regras contra substâncias que melhoram o desempenho são aplicadas com mais rigor.

Servis e Jorge Navarro, cujos cavalos faturaram mais de US$ 37 milhões (R$ 171,8 bilhões) desde 2008, foram os treinadores mais importantes citados na acusação. Ambos trabalham na Mid-Atlantic e, algumas vezes, conspiraram para impedir que suas trapaças fossem descobertas, de acordo com a acusação.

Em 18 de fevereiro de 2019, Servis escreveu uma mensagem de texto a Navarro, alertando que um fiscal de corrida estava na área do estábulo perto de onde eles guardavam as substâncias proibidas, as quais chamavam de “ácido vermelho” e “macaco”, disse a acusação. No mesmo dia, Navarro foi grampeado em uma ligação com outro réu, dizendo que quase fora pego “bombeando e fumegando” todos os cavalos que correram naquele dia.

Servis e o Maximum Security, que ganhou oito de seus dez páreos e levou quase US$ 12 milhões (R$ 55,7 bilhões) em prêmios, viraram os favoritos dos entusiastas de corridas de cavalos, em grande parte porque muitos consideraram injusta sua desclassificação na corrida mais famosa dos Estados Unidos. A acusação diz que o Maximum Security recebeu substâncias para melhorar o desempenho.

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Em 5 de junho de 2019, o Maximum Security passou por um teste de doping em seu estábulo em Monmouth Park, na costa de Jersey, enquanto Servis o preparava para correr na Pegasus Stakes. Em um telefonema interceptado pelas autoridades com Kristian Rhein, um de seus veterinários, Servis indicou que o Maximum Security recebera uma injeção de SGF-1000, composto que visa melhorar o desempenho, disse a acusação. De acordo com a acusação, Rhein disse para ele não se preocupar: “Eles não têm teste para isso. Não tem como detectar essa substância nos Estados Unidos”.

Ele também sugeriu que, no máximo, o teste daria positivo para um medicamento permitido. No mesmo dia, Servis mandou outro veterinário falsificar os registros do Maximum Security, para dizer que o potro havia recebido o medicamento permitido, disse a acusação. A investigação também acusou Navarro e supostos co-conspiradores de tentar ocultar a existência do esquema de doping usando nomes falsos para enviar e receber as substâncias.

As autoridades disseram que Navarro e outro réu trabalharam juntos para descartar clandestinamente os corpos dos cavalos que morreram, em vez de reportar essas mortes às autoridades competentes. A acusação, referindo-se a um telefonema interceptado no ano passado, citou Nicholas Surick, outro treinador acusado, que chegou a conversar com uma terceira pessoa sobre os cavalos que Navarro “matou e fatiou” para fazer “desaparecer”. “Você sabe o tamanho da enrascada em que ele está se metendo?”, disse Surick, de acordo com a acusação.

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Os advogados de Navarro e Servis disseram que seus clientes se declaram inocentes. Os advogados dos outros réus mencionados neste artigo não quiseram comentar o caso. Entre os acusados no caso estavam sete veterinários, disse Berman na entrevista coletiva. Um deles, Louis Grasso, licenciado em Nova York e Nova Jersey, criou e vendeu substâncias sob medida para melhorar o desempenho e deu conselhos sobre como administrá-las, de acordo com a acusação.

Em um telefonema interceptado em outubro, o treinador Thomas Guido III contou a Grasso sobre a morte de um cavalo que havia sido dopado com uma droga usada para reduzir o sangramento dos pulmões durante períodos de grande esforço físico. “Acontece”, respondeu Grasso, acrescentando que Guido “provavelmente exagerou na dose”. “Já vi isso acontecer dezenas de vezes”, Grasso disse. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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