Publicidade

Mudanças?

PUBLICIDADE

Por UGO GIORGETTI
Atualização:

Carlos Alberto Parreira tem o aspecto, o tom de voz, e as maneiras suaves de um coroinha, "altar boy", como dizem os ingleses. Como tenho minhas dúvidas sobre o número de pessoas que ainda vão às missas aos domingos, é bom explicar que coroinhas eram meninos que ajudavam o padre no ofício da cerimônia. Não é uma crítica a Parreira, talvez seja até um elogio. Suas boas maneiras são conhecidas, sua calma também. Por tudo isso é estranho vê-lo se transformar num incendiário agitador político, daqueles que levam as massas a marchar sobre o palácio. O cruzado Parreira está clamando pela presença da torcida "porque não passa pela nossa cabeça que, em casa, o Brasil não vá ser campeão do mundo". Pode ser que não passe pela cabeça dele, pela minha passa. Mas deixemos o pessimismo de lado para examinar uma outra frase do Parreira, esta bastante curiosa. "Hoje não somos os favoritos, mas daqui a um ano e meio seremos, com o trabalho que será desenvolvido". É uma frase bem enigmática, a menos que ele esclareça qual o "trabalho que será desenvolvido". E por quem. Se for pela comissão técnica, o que ele e Felipão mudariam da seleção de Mano? Será através de palestras motivacionais? Será pelo ressurgimento da "Família Scolari", que lembra o velho Bexiga e suas cantinas? Ou será porque os dois têm algum nome de jogador na manga, que não conhecemos, e que se juntará aos que Mano já tinha? Ou vão mudar o esquema de jogo? Nenhum tocou no assunto mudanças. Felipão preferiu até mudar de assunto e discorrer sobre temas gerais, como preguiça e bancários. Como sempre, se deu mal. Resta então a questão de quem vai fazer o "trabalho que será desenvolvido". Sim, porque a frase ambígua do Parreira pode fornecer outra explicação. Vamos ser favoritos daqui a um ano porque os patrocinadores, os anunciantes, a indústria do futebol, os profissionais a serviço da Fifa, como Ronaldo Fenômeno, vão a acabar nos convencendo disso. Vamos nos tornar favoritos porque seremos bombardeados com essa afirmação a cada momento de nossas vidas. E vamos acabar acreditando. Bem, não sei se será assim, mas pode acontecer.De outra forma não entendo o tal "trabalho que será desenvolvido" no próximo um ano e meio. Parreira termina suas afirmações, aliás, com outro exemplo dúbio. Na sua nova tarefa de agitador conclama a massa a encher Maracanãs, como num jogo contra o Uruguai, em 1993. Ele mesmo esclarece: "O torcedor parava o ônibus na rua. Vamos ganhar! O Uruguai nem sequer passou do meio do campo. Foi um verdadeiro massacre. Cento e vinte mil pessoas no Maracanã, num só coração. É isso que queremos." Curiosa essa lembrança, cuja descrição infelizmente lembra outra partida, contra o mesmo Uruguai, no mesmo Maracanã lotado, com uma torcida ainda maior e uma fé ainda maior. E o que se viu não foi exatamente um massacre. Parreira deve lembrar.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.