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'O judô tem que se popularizar, temos de massificar o esporte'

Treinadora afirma que modalidade precisa de mais espaço na mídia para que uma cultura seja criada para 2016

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Por Bruna Toni e DEMÉTRIO VECCHIOLLI
Atualização:

Três emplastros nas costas, seis medalhas, lágrimas e um longo caminho até 2016. Este foi o saldo dos sete dias do Mundial de Judô no Rio de Janeiro para Rosicleia Campos, a mulher que está à frente da vitoriosa seleção brasileira feminina há oito anos e que não conseguiu respeitar a licença maternidade que cumpria por conta do nascimento, há três meses, dos pequenos Ana Clara e Matheus. Mesmo sem estar na área técnica do Maracanãzinho, a treinadora acompanhou suas pupilas de perto.

Com uma disposição de dar inveja, a mães/esposa/treinadora faz questão de assumir também a função de garota-propaganda do judô. "Todo mundo que chega perto de mim começa a gostar, porque eu respiro isso. Meus filhos já estão de quimono. É visceral pra mim."

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Mais do que acumular resultados - desde 2008, a seleção feminina ganhou três medalhas olímpicas e 10 em Mundiais -, Rosicleia quer agregar fãs. Não para si, apesar de ser vaidosa e cobrar das judocas que sejam também. Mas para o esporte. "O judô tem que se popularizar", defende. Para ela, este é o caminho para que o esporte corresponda às expectativas de ser o carro-chefe da delegação brasileira em 2016, diante de um público que seja apaixonado pelos tatames tanto quanto pelos gramados.

A equipe feminina já está pronta para os Jogos de 2016?

Pronta não, mas está se aprontando. É muito difícil mudar algum componente. Eu creio que isso talvez vá acontecer apenas no meio-médio (até 63kg), que é uma categoria que ainda está indefinida. As atletas (Mariana Silva e Katherine Campos) ainda não deram retorno. No restante é pouco provável que haja mudança.

Como fazer para que o time de hoje, que chegará ao Rio/2016 com média de apenas 26 anos, não se perpetue na seleção?

A gente trabalha para que não haja esse "gap" (buraco) como aconteceu com o Aurélio Miguel, quando os atletas sequer faziam seletiva com medo de pegá-lo. No Mundial, as sparings eram todas do júnior. Além disso, levamos atletas mais novas para competições teoricamente mais fáceis. Quanto mais atletas ranqueados, melhor.

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O que faz o feminino estar um passo à frente do masculino?

Não acho que estejamos um passo à frente. Essa jovem equipe feminina ficou 'cascuda' de tanto competir. E isso vai acontecer com o masculino também. O Tiago Camilo, o Leandro Guilheiro, eles ainda estão aqui, mas a equipe está sendo renovada. Tem muita água para passar por debaixo da ponte ainda.

Como foi ver a vitória da Rafaela?

Eu estou travada até agora. Sofri junto com a Rafaela. O que ela passou naquela Olimpíada, vocês leram, ouviram, mas não sentiram. Além de o sonho dela desmoronar, foi chamada de macaca, disseram que ela tinha que ter vergonha de ser brasileira. Não é porque você vem de uma comunidade que você fica com esse estigma de que você não é capaz. Ela é capaz, é campeã mundial, é universitária.

Muito da pressão sobre a Rafaela foi porque ela chegou a Londres como favorita. Como diminuir essa pressão por resultado?

Dando espaço para o judô na mídia. É triste chegar a um Mundial no Rio e brigar por espaço. Eu sei que o judô é um esporte de regras complexas, mas todos precisam entender que é uma competição: você ganha, você perde... Quando a gente chega em Paris (para o Grand Slam) tem 10 mil pagantes para assistir judô. Isso é questão de cultura. O que aconteceu aqui outro dia, de vaiarem, não pode acontecer em 2016.

E qual a solução para que o público entenda de judô e goste do esporte, não só de vitórias?

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Vamos massificar. Manda a Sarah em uma escola municipal, o Leandro na outra. Temos de criar a cultura, para uma pessoa querer pagar pelo ingresso e não só porque tem entrada sobrando. Você acha que eu gosto de ter 5 mil amigos no Facebook? Não, mas eu sou uma ferramenta de divulgar o judô. É nossa obrigação multiplicar. Outro dia estava no supermercado, um senhor colocou a mão no meu ombro e falou 'eu nunca tinha visto judô, passei a ver por sua causa, pela sua garra'. Ganhei o dia, conquistei mais um fã de judô. Todo mundo que chega perto de mim começa a gostar, porque eu respiro isso.

O que mais pode ser uma ferramenta no judô para atrair o público?

A CBJ nunca deixou as meninas tirarem foto de biquíni. Sabe o que fiz? Armei uma matéria e só contei na véspera. Porque ainda é aquela coisa tradicional, engessada. Só que tem que mudar. Isso (foto de biquíni) é legal porque aparece de outra forma que não descabelada, suada. É outro tipo de apelo. Não estou falando que tem que pousar todo mundo para a Playboy. Mas os meninos têm corpos lindos. Quando uma patricinha olha um garoto bonito do judô, a gente tem de saber pescar.

Como que o Flávio Canto pode ajudar nisso?

Ele já é essa ferramenta: é galã, é bonito, está em um canal de TV, ele atingiu tudo isso e ainda faz um trabalho social com o Instituto Reação. Já atingiu uma fatia enorme da população. Difícil ter vários iguais a ele, mas se tivermos um para cada coisa que ele faz, já está bom.

Você pede para as suas atletas se maquiarem, se arrumarem?

Peço e ainda dou brilho se não tiver. Falei hoje para a Mayra: 'Cadê a produção?' Eu não tenho uma foto de atleta com o cabelo sem estar arrepiado. É horrível, isso fica para sempre, principalmente quando sobe no pódio. Tem que se achar bonita, poderosa. Tem que cuidar do cabelo, da maquiagem. Acabou a competição, colocar uma roupa bonitinha. Passa todo mundo para eu dar uma 'blitz', ver se está tudo bem. Não é porque é judoca que vai ser maloqueira.

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