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O peso de um mito

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Por Antero Greco e antero.greco@grupoestado.com.br
Atualização:

Ronaldo já era. Quantas vezes você ouviu essa sentença nos últimos anos? Baseada nas graves contusões que sofreu, ela se mostrava peremptória, definitiva, incontornável, e dava como certo o fim de carreira do Fenômeno. E não é que, depois de meses de fisioterapia, exercícios físicos e briga contra a balança, o danadinho desmentia meio mundo e voltava aos gramados todo serelepe? Está bem, cada vez menos serelepe, mas retornava. Pois o vaticínio pessimista corre o risco de mais uma vez ir para o espaço. Ronaldo andava meio sumido e, de um momento para outro, atrai atenção, ao ser anunciado como o mais novo astro do Corinthians. O acerto revelado na terça-feira deixou até em segundo plano a conquista do hexacampeonato do São Paulo e empurrou para baixo do tapete o grotesco episódio da arbitragem da final do Brasileiro. Também não se falou mais da proeza de Muricy e seu time. Só dá Ronaldo: como está, quando começará a treinar, contra quem será a estréia, quanto ganhará, onde vai morar, ao lado de quais jogadores atuará, que impacto provocará em um time de massa e que passou um ano no purgatório da Série B. Piadas, então, não faltam e já caíram na boca do povo. O que significa isso? Que Ronaldo é prato cheio, para mídia e torcedores, mesmo sem jogar há quase um ano. É a força do mito que transforma essa sua nova mudança de vida em tema de conversas de boteco, de debates esportivos, que divide opiniões. Há quem diga que vai arrebentar com a camisa alvinegra. Há também quem tema que venha a arrebentar-se... As dúvidas que tenho são as mesmas que você e o próprio Ronaldo têm. Não sei se ele agüentará o tranco por muito tempo, depois de tantas cirurgias e longos períodos de angústia. Que não terá o arranque de outras épocas é mais do que lógico; as contusões contam. Mesmo não fossem elas, a idade fala alto. O cronômetro de nossas vidas é carrasco implacável e não poupa nem os mitos. Para jogador de futebol chega uma hora em que o cérebro comanda, mas as pernas desobedecem. Mesmo assim, e apesar do gosto de lugar-comum, Ronaldo deverá brilhar no Corinthians. Basta mostrar uma parcela de sua categoria para se destacar. Engraçado foi ouvir, dia desses, alguém especular: será que ele dividirá o elenco? Sua chegada não pode atrapalhar tecnicamente uma equipe em reconstrução? Se tiver privilégios, não causará ciúmes? Vamos com calma. Nos últimos anos, nos acostumamos a incensar e fazer festa para uma infinidade de cabeças-de-bagre como se isso fosse a coisa mais normal do mundo. Na hora em que aparece por aqui um Ronaldo colocamos pêlo em ovo. Aí é má vontade - ou dor-de-cotovelo. Se ele não suportar o ritmo, pára, se despede e ponto final. Ronaldo de volta se mostra bela jogada de marketing. É bom para o Corinthians, é interessante para o torcedor, é certeza de audiência para quem tem os direitos de transmissão. Movimenta o mercado publicitário, talvez adie recessão no futebol. O desembarque de Ronaldo no Parque São Jorge também mostra que interesses profissionais se sobrepõem a preferências pessoais. O astro declara amor eterno ao Flamengo, usou a estrutura da Gávea por um tempo para recuperar-se, flertou com o clube e... assinou com o Corinthians. Vira-casaca? Não. Mas podia ter sido gentil com a cartolagem rubro-negra e avisá-la de que havia negociação em curso. Derrapada.

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