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O vilão escapou

Por Reginaldo Leme
Atualização:

A família Piquet ganhar na Justiça a ação de difamação de que havia sido vítima pode ser o último capítulo de um escândalo ocorrido em 2008, mas que virou a Fórmula 1 de pernas para o ar em 2009. Mas não deveria ser. Este desfecho já era esperado, a própria Renault já havia se desculpado por ter acreditado na palavra de Flávio Briatore, o homem que respondia pela direção da equipe, e nem o valor da indenização a ser paga está em discussão. O que falta para fechar a história é buscar o homem que, à custa do poder que detinha, fez tudo isso sem o menor sentimento de culpa, deturpou uma competição esportiva que atrai a paixão de torcedores no mundo todo, manipulou o resultado de uma corrida, arriscou a vida do seu e de outros pilotos e provocou uma mancha a ser apagada na história de uma equipe que leva o nome de uma das maiores fabricantes de automóveis do mundo. O que vai sobrar para este sujeito de antecedentes nada recomendáveis, que surgiu no mundo dos negócios tirando empresas do buraco à custa de mutretas fiscais, foi parar na F-1 como solução encontrada pelos irmãos Benetton para se verem livres dele nas empresas e hoje, impedido de exercer qualquer função em competições organizadas pela FIA, aparece de vez em quando como frequentador dos padocks que dão mais visibilidade. A ideia é dar a impressão de que o "Cingapuragate" está esquecido e que ele pode voltar a qualquer momento. Não pode. O homem que chegou a ser citado como provável sucessor de Bernie Ecclestone, hoje consegue no máximo manter-se como empresário de alguns pilotos, porque nenhum deles foi a fundo na Justiça para desfazer o vínculo e porque o trabalho do empresário não é executado, obrigatoriamente, nas dependências de um autódromo. Briatore, como todo malandro, é convincente. Duas semanas depois do estouro do caso no ano passado o quadro que os jornalistas encontraram em Monza no fim de semana do GP da Itália era assustador. A única pessoa que parecia não levar a sério a crise que pairava sobre a F-1 era justamente ele, o principal personagem. Ele havia contado uma história para os jornalistas, dando a impressão de que tinha recebido total apoio da Renault, a ponto de a montadora iniciar um processo contra Nelson Piquet por calúnia, difamação e extorsão. Briatore, claro, estava blefando. Mas tinha convencido a maioria dos jornalistas. Eu ouvi de alguns deles a sensação de que Piquet havia mentido inclusive para mim ao revelar detalhes do caso. Por mais que eu dissesse o contrário mostrando argumentos irrefutáveis, o clima era pesado e, naquele momento, tudo parecia a favor de Briatore. Liguei para Piquet passando esta visão de Monza. Sem mostrar a menor preocupação, ele apenas me disse para aguardar os novos fatos. Dito e feito. Passados três dias, estourou a notícia: a Renault demitia Briatore e Pat Symonds, diretor técnico da equipe. Aquela encenação toda de Monza tinha sido apenas o último suspiro do playboy que nunca aprendeu a levar a vida a sério.A Renault fez o seu papel. Pediu desculpas aos Piquet junto ao Conselho Mundial da FIA, perante a Justiça fez o pedido de desculpas juramentado, e assume o pagamento de indenização. Uma coisa é a montadora, outra é a equipe de F-1, que já nem pertence a ela. No ano que vem disputa o Mundial com o nome de Lotus-Renault GP tendo como proprietários o grupo Genii e a Lotus Cars. O erro, na época, foi acreditar no homem que a representava nas pistas. Mas como aceitar que um alto funcionário da organização seria capaz de bolar um plano tão inescrupuloso de um acidente premeditado e obrigar seu piloto a cumprir? Parecia uma grande fantasia. Mas era a realidade de uma mente conturbada e capaz de qualquer coisa. Enquanto a Renault é condenada, o mentor de toda a maracutaia anda por aí, sem culpa, sem lenço e sem documento. Mas o mundo, agora, sabe bem quem ele é.

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