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Os 50 anos do feito de Adhemar

Por Agencia Estado
Atualização:

Há 50 anos o Brasil descobriu que podia vencer o mundo. No dia 23 de julho de 1952, na Olimpíada de Helsinque, Finlândia, um negro brasileiro, filho de ferroviários, que conheceu o atletismo por acaso, conquistou a medalha de ouro no salto triplo, deixando para trás belgas, suecos, japoneses e americanos. E não foi só isso. Talvez por querer deixar bem claro quem era o melhor atleta do planeta, ou simplesmente por não saber que não convinha humilhar os adversários numa competição tão importante, bateu quatro vezes o recorde mundial em um só dia. Adhemar Ferreira da Silva, falecido no dia 12 de janeiro de 2001, é o maior exemplo da tradição nacional de um rapaz pobre, sem incentivo e sem qualquer condição financeira, que acreditou em seu potencial, venceu e entrou para a história do esporte. Campeão olímpico em 1952, bi em 1956 (em Melbourne, Austrália). Ganhou ainda três pan-americanos, cinco sul-americanos, seis brasileiros e mais de 40 títulos internacionais. Nem o próprio Adhemar, provavelmente, acreditava que poderia chegar tão longe quando, em 1946, por admirar o porte elegante e pomposo dos atletas, começou a treinar no Estádio Canindé (antigo campo do São Paulo). Trajetória - De acordo com o livro ?Herói por Nós?, de Tânia Mara Siviero, arriscou o primeiro salto, por curiosidade, em 1947, após ver um colega treinando a estranha modalidade. Três meses depois, era campeão paulista de salto triplo. No ano seguinte, já representava o Brasil nos Jogos Olímpicos de Londres (ING). Não chegou às finais porque, segundo consta, ficou impressionado com a enorme quantidade de torcedores, mais de 100 mil pessoas, no Estádio de Wembley. Quatro anos mais tarde, já era considerado o melhor saltador do mundo e dono do recorde da categoria, com 16,01 metros, Adhemar deu show em Helsinque. Em seis tentativas, o brasileiro registrou 16,05, 16,09, 16,12 e 16,22, quatro recordes mundiais consecutivos. A medalha de ouro foi a segunda da história do Brasil em jogos olímpicos. A primeira, no tiro, ganhou Guilherme Paraense, em 1920. Em 1956, Da Silva, como era conhecido no exterior, conquistou seu segundo ouro, saltando 16,35 m. Em Roma, disputou sua última olimpíada. Porém, como não estava bem de saúde (tuberculose), não se saiu bem. Sua despedida, no entanto, foi emocionante. O livro ?Os Arquivos das Olimpíadas?, de Maurício Cardoso, relembra que após seu último salto na Itália, o locutor do estádio anunciou que o brasileiro estava se retirando definitivamente das pistas. ?Enquanto o campeão cabisbaixo caminhava lentamente em direção à saída, um homem se levantou na arquibancada e começou a bater palmas. Era o cantor americano Bing Crosby. Aos poucos, as pessoas foram se juntando a ele até que a platéia inteira, 80 mil pessoas, proporcionou uma ovação consagradora ao mais ilustre campeão brasileiro.? Inúmeros eram seus fãs pelo mundo. A filha de Adhemar, Adyel Santos Ferreira da Silva, conta que fica sempre impressionada com a popularidade do pai quando viaja ao exterior, representando-o nas inúmeras homenagens que o ex-saltador costuma receber lá fora. ?Ele era muito diplomático e atraía a simpatia das pessoas por onde passava?, tenta explicar. Seriedade - Para Adyel, a parceria com o técnico alemão Dietrich Gerner foi essencial para a carreira de seu pai. Segundo ela, o temperamento aparentemente frio, mas na verdade sério, disciplinado e determinado do bicampeão olímpico, formou uma perfeita combinação com o estilo do alemão. ?Meu pai era um germânico?, brinca. Alemão no temperamento, mas um pobre brasileiro em questões financeiras. Adhemar Ferreira da Silva era amador e, portanto, não recebia dinheiro para competir. A legislação dos anos 50 era tão rígida que ele teve de recusar uma casa doada pelo jornal ?Gazeta Esportiva?, logo após a conquista da primeira medalha de ouro. O jornal descobriu que a família do atleta estava prestes a perder o imóvel comprado no bairro do Peruche, zona norte de São Paulo, por não estar conseguindo quitar as prestações. Os leitores, comovidos com a história de Adhemar, contribuíram e compraram uma nova casa. Mesmo emocionado com o carinho, o campeão recusou o presente, alegando que se o aceitasse poderia ser considerado profissional, não teria mais o direito de competir e ainda perderia a medalha de ouro. A família, a duros custos, conseguiu manter a casa no Peruche, onde viveu até o final da vida o bicampeão olímpico e onde moram até a hoje a filha Adyel e o neto Diego. ?Meu pai engoliu muito ?sapo?, sofreu muito, mas sua perseverança e paciência superaram tudo isso?, comenta a filha. Na Finlândia, para onde voltou duas vezes após a conquista da primeira medalha de ouro, era idolatrado. No Japão, idem, principalmente após bater o recorde mundial do japonês Naoto Tajima, em 1951 (16,00 metros). Visitou vários países, mas não foi somente por isso que se tornou um homem culto. Desde muito cedo, o pai, Antônio, e a mãe, Augusta, exigiram que o filho estudasse para vencer na vida. Adhemar se formou em Belas Artes, Educação Física, Direito e Relações Públicas e ainda se tornou jornalista em 1957. Falava inglês, espanhol, italiano, francês, alemão, japonês e finlandês.

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