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Riscos do monopólio

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Por Antero Greco
Atualização:

Monopólio não é bom em questões de mercado, exclusividade só serve no amor. (E olhe lá.) No esporte, esses dois conceitos têm aparecido com frequência estonteante - sejam em contratos de publicidade, em direitos sobre eventos ou mesmo em conquistas de títulos. Melhores acordos, atletas de ponta, recordes se concentram cada vez mais em poucas instituições ou agremiações. O resto vira resto mesmo.O Campeonato Espanhol é um exemplo. A Liga de las Estrellas chama a atenção e dá a volta ao mundo por apresentar dois clubes extraordinários - Barcelona e Real Madrid. Quem não os admira e inveja que atire a primeira pedra. São poderosos, ricos, charmosos, investem pesado em profissionais em geral bem acima da média. Não é à toa que reúnem seleções, com tantos astros locais e internacionais. Faturam alto.Repare, porém, que entra ano, sai ano, só ambos brigam pela taça, quando não beliscam também a Copa do Rei. Consequência do poder, do fascínio que exercem, da estrutura de que dispõem, do planejamento. Parabéns! Isso leva a vantagens adicionais e vira uma bola de neve a seu favor. Ficam mais influentes na mesma proporção em que também concentram verbas astronômicas. Para os demais sobram migalhas.O resultado disso é monopólio (ou duopólio, se preferir). Basta uma olhada nos torneios de 1985 para cá e constatar: o Barça foi campeão 12 vezes, contra 11 do Real Madrid. As exceções ficaram para Atlético de Madrid (1996), La Coruña (2000) e Valencia (vencedor em 2002 e 2004). Virou um campeonato de dois. Legal para as respectivas torcidas, mas monótono, pois muito previsível.Ainda os números, para quem os aprecia. O Barcelona chegou anteontem, no empate com o Levante que lhe garantiu o título (1 a 1), a 92 pontos em 36 rodadas, marcou 92 gols e sofreu 20. O Real tem 86 pontos, 91 pró e 31 contra. O Valencia, terceiro colocado, marcou 62 gols, levou 43 e acumulou 69 pontos, ou 23 a menos do que o Barça! O Villarreal, na quarta colocação, tem 62 pontos, 53 gols contra 40. Discrepância. Os dois primeiros são extraterrestres. Os outros dois são normais.Não é muito diferente de Inglaterra, Itália, Portugal e, na história recente, França (com o octo do Lyon). Esses países apresentam duas, três equipes que dividem a hegemonia e a grana. Alguns já se dão conta de que o poderio ilimitado, nesse mundo dos negócios da bola, é bom até certo ponto. Chegará um momento em que haverá esvaziamento de estádios- na Itália já acontece.Longe de mim defender nivelação por baixo. Quem é competente merece sucesso. A questão é a ganância que cega, que trata de eliminar a concorrência. Uma equação, no fundo, burra, pois sem competidores (no caso de um campeonato) o produto perde valor. O ideal é ter mais participantes fortes, para que desafios sejam superados, para estabelecer novos parâmetros para os times, tanto técnicos quanto comerciais. No Brasil, por ocorrer fenômeno diverso desse espanhol (desde 1985, a Série A teve 14 campeões diferentes), a expectativa é mais bem distribuída entre clubes e seus torcedores. Com reflexos na audiência, no pay per view, no interesse mesmo pelo torneio. Também por isso tem aumentado seu valor de mercado. Falta melhorar a técnica.Agora por aqui também há risco de abrir-se abismo entre o poder dos clubes. A negociação individual para garantir exclusividade nos direitos de transmissão de jogos poderá criar castas privilegiados, de 2, 3, times, que receberão muito acima dos demais. Com o tempo, isso tende a resultar no tal monopólio que, passada a euforia, levará a sinuca de bico. Valerá a pena? No impulso da paixão, o torcedor tem o direito de dizer que pouco se lixa para os concorrentes. No que está certo, pois não precisa pensar com a razão. Mas o futebol é um negócio em que briga restrita a dois ou três leva a desinteresse. Um corintiano pode desejar o desaparecimento do Palmeiras ou do São Paulo. O gremista quer que o Inter se dane, assim como o vascaíno sonha com a implosão do Flamengo. Ok, e se isso acontecer vão gozar da cara de quem?Monopólio não funciona nesse esporte popular, em que a diversidade - e por extensão a rivalidade - é o que o mantém vivo. Exclusividade em informação é nociva, pois leva ao pensamento único, pasteurizado, que é o sonho de consumo do autoritarismo.

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